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Cresce tensão entre banqueiros e governo
Executivos dizem que BC quer um vilão para possíveis problemas da economia; para órgão, travamento é ruim para todos
BC já mostrou que não está confortável com o conservadorismo do sistema e avisou aos bancos que essa atitude vai custar caro
SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A tentativa do BC de forçar os
grandes bancos privados a
comprarem carteiras de instituições menores, assumindo
uma atitude mais ativa no combate à falta de dinheiro em circulação por causa da crise externa, fez subir a temperatura
entre banqueiros e equipe econômica. Executivos de bancos
ouvidos pela Folha identificam
um viés político por trás da medida e avaliam que o governo
procura um vilão para os problemas que a economia deverá
enfrentar no ano que vem.
No BC, essa tese é rebatida e
a redução da remuneração paga pelo governo sobre a parcela
dos recursos captados nos depósitos a prazo -como lançamento de papéis pelos bancos
(CDBs)- é defendida como
uma forma de acelerar as negociações em andamento e fazer
as instituições financeiras buscarem novas opções de compra, liberando dinheiro que será repassado às empresas.
Tudo porque, segundo a Folha apurou, se avalia que, diante da dimensão da crise, destravar o mercado de crédito é o
teste de fogo para o BC e uma
ameaça para toda a economia.
No entanto, os efeitos da medida são incertos e podem ficar
longe do esperado.
Além de aumentar o custo
dos empréstimos que fazem
com a parte dos recursos a prazo que fica liberada para aplicarem livremente (compensando
a perda de remuneração imposta pelo BC), as grandes instituições poderão reduzir o
preço que se dispõem a pagar
pelas carteiras dos bancos menores que estão no sufoco.
O BC mostrou claramente
que não está confortável com o
conservadorismo do sistema
diante do cenário de escassez
de liquidez e avisou os bancos
que essa atitude irá custar caro.
Para os executivos, punir as
instituições nesse caso é querer
que elas sejam menos rígidas
nas compras de carteiras. Isso
se traduzirá no preço que elas
oferecerão pelos ativos.
A avaliação é que o Banco
Central sabe muito bem que
não é possível tratar de forma
igual todo o segmento de bancos pequenos e médios e que as
grandes instituições não comprarão o que não querem nem
que sejam obrigadas a depositar dinheiro sem remuneração
nos cofres do BC.
Ao mesmo tempo, os bancos
não querem partir para o confronto direto com o governo e
dar munição política para serem colocados de vilões perante a sociedade. É tradição a Febraban (Federação Brasileira
de Bancos) se manter calada ou
até apoiar publicamente, mas,
nos bastidores, o desconforto
com a decisão do BC foi grande.
Até porque, reclamam, o BC
sabe que negociações estão em
andamento e que é preciso
tempo para analisar uma carteira em que as operações de
crédito foram concedidas por
terceiros, com gestão de risco
distinta. Para um executivo,
mesmo que já estivesse em andamento, a negociação que sair
agora parecerá que foi por causa da decisão do BC.
No centro do embate está
exatamente a dificuldade de
"precificar" risco na crise. A volatilidade é tal que o medo de
fazer uma operação ruim que
leve a perdas só contribui para
que todos fiquem onde estão.
Do lado do governo, sem a
contribuição dos bancos neste
momento, muito provavelmente boa parte dessas empresas se tornará inadimplente,
com sérias implicações para o
nível de atividade justamente
nos dois últimos anos de mandato do presidente Lula.
O BC está certo ainda que há
muitas carteiras de crédito que
podem ser negociadas. Para o
mercado, há muito risco envolvido nelas. O governo, no entanto, vê como risco maior travar toda a economia porque todo mundo perderá junto.
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