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LUÍS NASSIF
Macro e microeconomia
Que se percam as esperanças. Essa história de que
bastarão marcos regulatórios
adequados para o investimento externo afluir é auto-ilusão.
É a velhíssima história de "fazer a lição de casa", enquanto
se permitem políticas macroeconômicas que desarrumam
completamente o ambiente
econômico.
Como lembra em e-mail Fernando Pinto Ferreira, sócio-diretor da Global Invest, de
Curitiba -em reforço ao que
escrevi na coluna "O país dos
Mandrakes"-, "a China, é
um pais com praticamente zero de marco regulatório, uma
ditadura com todas as imprevisibilidades que lhe são naturais. E por que um país desses
se torna tão atraente, a despeito dos riscos que apresenta? A
resposta é simples (como para
outros asiáticos): carga tributaria baixa e câmbio desvalorizado, tornando o custo de
produção em dólar (principalmente salários) baixo o suficiente para tornar o investimento compensador".
Desenvolvimento depende
de investimento de risco. Investimento de risco depende
de taxa de retorno que seja superior às taxas de renda fixa. E
isso passa por juros baixos, tributação módica, redução da
burocracia, câmbio competitivo e expectativa de crescimento da renda e do consumo. O
resto é macumba planilheira.
Dias atrás, o "Valor" publicou artigo magistral de Dani
Rodrik -professor de economia política na John F. Kennedy School of Government,
da Universidade Harvard-,
em que analisou os desastres
acarretados pela apropriação
da política pelos economistas
cabeças de planilha. Demonstra a maneira como simplificam as análises, a dificuldade
que têm de estabelecer raciocínios complexos, de buscar soluções que fujam do manual.
A Coréia do Sul se desenvolveu, a do Norte, não. Na hora
de analisar o fenômeno, o estrategista levantaria todos os
fatores de diferença: câmbio
depreciado, investimento em
tecnologia, educação, abertura comercial gradativa e, depois do ambiente favorável,
abertura ao capital externo. E
trataria de atuar sobre esses
fatores. O cabeça de planilha
pegaria a abertura ao capital
externo e derivaria para trás.
A essa altura já deve ter caído a ficha do governo sobre essa manobra da criação sucessiva de expectativas por parte
do mercado. O ano terminou
com um superávit primário
recorde de 4,25%, apresentado
como condição necessária para o espetáculo do crescimento. O que se acena para 2004?
Com mais um superávit primário, um aumento descomunal da Cofins (Contribuição
para o Financiamento da Seguridade Social), a manutenção de formas diretas e indiretas de tributação (por meio
dos lucros das empresas públicas), a manutenção da extraordinária transferência de
renda para o setor financeiro.
Ou seja, promete-se o crescimento com tudo aquilo que
compromete o crescimento.
É importante que o governo
comece a fazer o Banco Central trabalhar. A alegação de
que o modelo é perfeito, o país
é que não ajuda, não cola
mais. Fazer política monetária com taxas reais de 10% é
moleza. O desafio é como sair
dessa armadilha da dívida pública e dos juros descomunais.
É esse o trabalho que se espera do Banco Central, se o governo Lula almeja terminar
seu período deixando algum
legado para a história.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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