São Paulo, terça, 2 de dezembro de 1997.




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LUÍS NASSIF
O Brasil e a conferência de Kyoto

A Amazônia é o pulmão do mundo, logo deve ser considerada patrimônio da humanidade. A Amazônia é pulmão do mundo, logo o Brasil deve receber royalties sobre o oxigênio produzido.
Nos últimos anos, a discussão ambiental se revestiu de inúmeros mitos, com pouco significado prático. Nos países desenvolvidos o chamado "efeito estufa" (efeitos da poluição sobre a camada de ozônio da Terra) frequenta todas as projeções sobre o futuro da economia mundial.
Muitos cientistas definem seus cenários em "com ampliação do efeito estufa", "com redução do efeito estufa". Os efeitos serão não apenas sobre o desempenho da economia como um todo, como sobre as relações entre países industrializados e países emergentes.
Aberta esta semana, a reunião de Kyoto sobre meio ambiente (chamada de "Terceira Conferência das Partes da Organização das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas") é capítulo importante na definição da política ambiental mundial para os próximos anos.
Do lado dos países industrializados havia (e ainda há) a tendência de tentar impor regras de conservação dos recursos naturais do Sul, ou de encontrar tecnologias menos poluentes, que acabam por destronar as velhas indústrias dos países pobres.
A mudança de postura internacional teve início a partir da consciência de que apenas as chamadas forças de mercado não seriam suficientes para impedir a tragédia ambiental.
As primeiras negociações internacionais visavam fazer com que até o ano 2000 os países desenvolvidos limitassem suas emissões de gases de "efeito estufa" aos níveis de 1990. Praticamente todos os países da OCDE (o grupo dos mais ricos) desrespeitaram o acordo.
Nos anos seguintes, os trabalhos científicos do IPCC -Painel Intergovernamental sobre a Mudança do Clima- ajudaram na formação de um consenso mais forte sobre a matéria. A partir da compilação dos últimos estudos internacionais, constatou-se que o "efeito estufa" é decorrente de abusos que começaram a ser cometidos 150 anos atrás, nos primórdios da Revolução Industrial. Os abusos atuais só se farão sentir nos próximos 150 anos.
A partir dessa reviravolta no estudo ambiental, houve mudança progressiva nos fóruns internacionais. Seguiram-se série de convenções internacionais, que acabaram fortalecendo dois conceitos-chave: os princípios do "poluidor-pagador" e das "responsabilidades comuns, mas diferenciadas", que surgem a partir da Declaração do Rio, de 1992 e na Convenção Quadro do Clima.
A posição brasileira
Na Conferência do Rio, em 1992, havia razoável consenso internacional, que permitiu a assinatura da "Agenda 21" -conjunto de medidas visando a preservação do meio ambiente.
Na Primeira Conferência das Partes (1995, em Berlim), reconheceu-se a necessidade de limitações futuras mais drásticas, à luz das novas evidências científicas.
Na Segunda Conferência das Partes (1996, Genebra), as Organizações Não-Governamentais e a pressão européia ajudaram a convencer o governo americano da necessidade de metas mandatórias de redução de emissões, a serem negociadas na rodada de Kyoto.
Na Terceira Conferência irão ser definidas metas unicamente para os países desenvolvidos, evitando-se novos compromissos para países em desenvolvimento.
A proposta brasileira parte do princípio de que, se os problemas enfrentados hoje decorrem de abusos cometidos há 150 anos, quem deve pagar a conta são os industrializados.
Essa é a síntese da proposta brasileira, a ser levada à reunião -conforme o embaixador Antônio A. Dayreel de Lima, diretor-geral para Temas Especiais do Ministério das Relações Exteriores (MRE).
Com base nessas constatações, a proposta estabelece "tetos de emissão" para a redução da influência das emissões dos países industrializados nas mudanças climáticas globais. Os países poderão intercambiar frações de seus respectivos tetos, conforme o desempenho dos seus programas de reduções de emissões. Caso não consigam cumprir suas metas, esses países seriam obrigados a contribuir financeiramente para um fundo voltado para o financiamento de projetos ("climate change projects") para o crescimento limpo nos países em desenvolvimento.
A escolha dos projetos para financiamento seria proporcional ao nível das emissões dos países não-desenvolvidos.

E-mail: lnassif@uol.com.br



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