São Paulo, domingo, 03 de janeiro de 2010

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Crise financeira deu fôlego ao setor para digerir consolidação

Instituições aproveitam clima de mudança para mexer, sem grandes sobressaltos, em áreas cujas estruturas estavam defasadas em relação à concorrência

TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL

A crise financeira ajudou alguns dos principais bancos brasileiros -Santander, Real, Itaú, Unibanco, Banco do Brasil e Nossa Caixa- a passar sem grandes sobressaltos por processos de reestruturação e de fusão de equipes que poderiam se tornar inviáveis se a expansão dos negócios seguisse o ritmo alucinante de 2008.
No processo, essas instituições tiveram de lidar com a sobreposição de equipes inteiras, incompatibilidade tecnológica, limitações de espaço físico para aglutinar equipes, choques de cultura, dificuldades para convergir marcas e tentativas nem sempre bem-sucedidas de transferência de profissionais.
Nas negociações com os trabalhadores, ficou acertado que todas as equipes fundidas teriam profissionais vindos dos dois bancos -nenhuma equipe prevaleceria integralmente.
Tanto na integração de Itaú e Unibanco quanto na de Santander e Real, áreas sensíveis como a jurídica chegaram a conviver com duplo comando.
A rede de caixas eletrônicos da Nossa Caixa não era compatível com a do BB -os clientes do banco federal não puderam utilizar os terminais da instituição paulista. O vermelho do logotipo do Santander nunca combinou com o verde sóbrio do antigo ABN Amro Real.
Com a fusão, os bancos aproveitaram as mudanças para mexer em áreas cujas estruturas estavam defasadas em relação à concorrência.
No Itaú, havia três tesourarias diferentes, que foram agrupadas. Foi centralizada sob uma mesma chefia toda a área de investimentos, que promove a captação de recursos para fundos, previdência, poupança e CDBs, como já acontecia no Bradesco. Essas áreas costumam "concorrer" pelo dinheiro do cliente, dificultando satisfazer o interesse do investidor.
Segundo Ricardo Marino, diretor-executivo de Pessoas do Itaú Unibanco, a crise trouxe um ambiente de incerteza e tornou mais "desafiador" fazer a fusão. "Por outro lado, foi bem-vinda porque pudemos focar mais nossas discussões e nos preparar para sermos mais competitivos depois."
"Conseguimos fazer essa fusão sem acidentes de percurso e sem que a nossa relação com os clientes sofresse interrupções ou percalços. O trabalho a que nos dedicamos agora é fazer a fusão cultural. É a cultura que move uma empresa na direção certa ou não", disse Cândido Bracher, presidente do Itaú BBA, que reúne o atacado.
Para os executivos vindos do Real, a maior dificuldade foi lidar com a gestão centralizadora dos espanhóis do Santander. Já os funcionários do Santander relatam contratempos com chefes vindos do Real, que costumam ter uma atitude despojada, mas são rigorosos com equipe e clientes nas exigências e na gestão de risco.
Fabio Barbosa, presidente do Santander Brasil, reconhece que as culturas dos bancos são diferentes, mas afirma que isso fez aumentar a massa crítica no banco. "O fato de as culturas dos dois bancos serem distintas nunca foi um problema, mas uma oportunidade de tornar a instituição mais rica. O atributo mais valorizado no Santander, a inovação, e as principais características do Real, a sustentabilidade e o relacionamento, são complementares. Hoje, já é possível ver os funcionários do Santander familiarizados com os conceitos de sustentabilidade e os do Banco Real trabalhando pautados pelo espírito de inovação", disse.
Apesar da promessa de evitar ao máximo as demissões, muitos funcionários foram desligados. As áreas que mais tiveram cortes, segundo os sindicalistas, foram as mesas de operação do mercado de capitais, profissionais da área de investimento e promotores de crédito.
Para evitar cortes na administração, o Sindicato dos Bancários de São Paulo (ligado à CUT) negociou a criação de programas para a transferência de profissionais para as agências, além da suspensão de demissões, contratações, programas de trainees e terceirização.
"Como nós já tínhamos passado por outras fusões, conseguimos criar um debate no movimento sindical para ter uma proposta única de proteção do emprego para os bancos", disse Luiz Cláudio Marcolino, presidente do sindicato.
Nenhum banco diminuiu o número de agências. Entre os bancos que passaram por fusão, só o Santander/ Real tem hoje menos funcionários do que antes da fusão -passou de 55,1 mil em junho de 2008 para 50,8 mil em setembro de 2009, dado mais recente do Banco Central. O banco abriu um programa de incentivo a aposentadorias que teve adesão de 1.120 pessoas.
Tanto Itaú Unibanco quanto BB/Nossa Caixa aumentaram o quadro de pessoal. O Itaú Unibanco tinha em setembro 111,1 mil funcionários -um ano antes, eram 97,9 mil. No BB/Nossa Caixa, o número passou de 117,7 mil para 121,7 mil.
No Itaú, cerca de 1.500 pessoas anteciparam suas aposentadorias e outras 2.500 foram remanejadas de área.


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