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ARTIGO
Ainda não é hora de países apertarem política fiscal
Aumento no rendimento dos títulos dos Estados Unidos deve ser encarado de
forma positiva, como uma reacomodação do mercado após período de pânico
MARTIN WOLF
DO "FINANCIAL TIMES"
SERÁ QUE os EUA (e outros países de alta renda)
estão a caminho do apocalipse fiscal? Os recentes saltos nos rendimentos dos títulos
dos governos servem como
prova de que os investidores estão preocupados com as perspectivas fiscais? Minhas respostas a essas perguntas são
não e não. O que não quer dizer
que não existam motivos para
preocupação, e sim que há poderosos argumentos contrários
a uma reacomodação fiscal
imediata e fortes motivos para
receber de forma positiva os recentes movimentos nos mercados de títulos.
Na semana passada, o "Financial Times" publicou dois
artigos que argumentavam que
o percurso fiscal atual dos EUA
era insustentável, o primeiro
de John Taylor, economista da
Universidade Stanford, e o segundo do historiador Niall Ferguson (Harvard). Este último,
por sua vez, era um comentário
sobre um debate em abril que
envolveu, entre outros, Paul
Krugman, Nobel de Economia.
Quanto a um ponto os analistas sérios concordam: a dívida
pública não pode subir sem limites com relação ao PIB. Para
que seja possível adotar medidas de estímulo no curto prazo,
é necessário que haja credibilidade em longo prazo.
Assim, qual é o desacordo?
Ferguson oferece três proposições: a primeira é que a recente
alta nos rendimentos dos títulos do Tesouro norte-americano demonstra que o mercado
está "vacilando" diante das
imensas emissões do governo; a
segunda, que grandes déficits
fiscais são tanto desnecessários
quanto contraproducentes. E,
por fim, a de que existe motivo
para temer um desfecho inflacionário. São opiniões bastante
difundidas. Mas procedem?
O primeiro ponto é incorreto, a julgar das provas. A alta
nos rendimentos dos títulos representa uma normalização
desejável depois de um pânico.
Os investidores correram para
o dólar e os títulos do governo.
Agora estão correndo na direção oposta. Bem-vindo ao estonteante mundo dos mercados financeiros.
Agora tratemos da política
fiscal. O argumento apresentado pelos oponentes é o de que o
uso de política fiscal é sempre
desnecessário e inefetivo ou,
como sugere Ferguson, o de
que ele é redundante, porque
não estamos vivendo uma
"Grande Depressão". Os monetaristas argumentam que a política fiscal é sempre desnecessária, porque a expansão monetária cuida do problema. Os
economistas que acreditam na
"equivalência ricardiana" -em
menção a David Ricardo, economista do início do século
19- argumentam que a política
fiscal é inefetiva porque os domicílios compensarão os gastos
adicionais do governo por meio
de uma elevação em seu índice
de poupança.
Os economistas discordam
ferozmente com relação a essas
questões. Minha abordagem é
"keynesiana": em momentos
extremos, o excesso de poupança desejada com relação ao
investimento dispara. Uma vez
mais, a política monetária, embora importante, torna-se menos efetiva quando os juros estão em zero. Portanto, é sábio
usar tanto um cinto monetário
como suspensórios fiscais.
Uma profunda recessão prova que existe uma grande alta
em termos de poupança desejada excessiva, em situação de pleno emprego, como argumenta Krugman. No momento,
portanto, os déficits fiscais não
estão excluindo o setor privado
do mercado. Estão trazendo-o
ao mercado, em lugar disso, ao
estimular a demanda, que sustenta o nível de emprego e promove o lucro.
Ferguson argumenta que a
expansão fiscal é desnecessária, pois a recessão é amena.
Mas a questão é por que a recessão parece amena quando
há precursores de uma depressão claramente presentes.
A resposta está, em parte, nas
agressivas respostas monetárias dos BCs e nos resgates ao
sistema financeiro. Mas isso é
tudo? O que teria acontecido se
os governos tivessem decidido
reduzir seus gastos e elevar impostos? Pode-se discordar
quanto ao nível de relaxamento
monetário requerido. Mas um
dos motivos mais importantes
para que não tenhamos uma
nova Grande Depressão é que
aprendemos uma lição com as
experiências da primeira e com
o acontecido no Japão nos anos
90: não se deve apertar cedo demais a política fiscal. Além disso, as economias bem administradas se provaram capazes,
historicamente, de sustentar
de modo confortável um nível
mais elevado de dívida pública.
Inflação
O que nos conduz à última
preocupação: o medo da inflação. A questão gira sobre como
abandonar as políticas extremas ora em uso. As pessoas
precisam acreditar que as políticas fiscais e monetárias agressivas em uso atualmente serão
revertidas. Caso não o façam,
pode haver uma alta considerável nas expectativas inflacionárias muito antes que a economia mundial se recupere. Caso
isso aconteça, as autoridades
estariam sob dolorosa pressão
e o mundo poderia mesmo recuar a uma estagflação ao modo
dos anos 70.
As políticas excepcionais utilizadas para enfrentar circunstâncias extremas estão funcionando. Agora, como resultado,
as autoridades estão caminhando sobre uma corda bamba: de um lado, a retirada prematura e a volta a uma profunda recessão; do outro, a disparada das expectativas inflacionárias e a estagflação. É irresponsável insistir tanto em um
aperto imediato quanto em políticas permanentemente frouxas. Os EUA e o Reino Unido
correm agora o risco desse segundo desfecho. Mas seus críticos correm o risco de cometer
um erro igual e oposto. A resposta é clara e complicada: será
necessário adotar um aperto
severo, mas não ainda.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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