São Paulo, domingo, 03 de setembro de 2006

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Volks enfrenta sua maior crise no país

Custo trabalhista, câmbio e aposta em modelos errados são apontados por analistas como os principais problemas da montadora

Segundo especialistas, empresa também demorou a reestruturar sua rede de concessionárias; Volks diz que produtividade cresceu

MAELI PRADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Altos custos trabalhistas, impacto de um câmbio desfavorável para exportações em uma empresa que vende 42% da produção para fora, matéria-prima cara, apostas que não se confirmaram em alguns modelos e demora em reestruturar sua rede de concessionárias.
Esses são alguns dos principais fatores, de acordo com consultores especializados ouvidos pela Folha, que levaram a Volkswagen à atual situação no país. A montadora, que anunciou que pode demitir entre 4.000 e 6.000 trabalhadores até 2008, é citada como uma das empresas do setor em pior situação financeira.
A própria diretora para Assuntos Governamentais da Volks, Elizabeth de Carvalhaes, chegou a afirmar, em julho, durante audiência na Comissão de Desenvolvimento, Indústria e Comércio da Câmara dos Deputados, que a situação financeira da montadora é "absolutamente constrangedora".
Para especialistas, a empresa pegou mais tarde o bonde das exportações e, quando o fez, entrou com volumes muito maiores e foi pega logo depois na contramão do câmbio. "Nesse momento, quem depende mais de exportação vai estar em uma situação complicada sempre", afirmou José Caporal Filho, diretor da consultoria Megadealer.
De acordo com a empresa, as suas exportações atualmente possuem rentabilidade próxima de zero. Ao impacto do câmbio desfavorável deve ser somada a forte alta no preço de matérias-primas nos últimos anos, como o aço.
O contrato assinado pela montadora com o sindicato em 2001, que deu estabilidade aos seus trabalhadores da unidade Anchieta, em São Bernardo, até novembro deste ano, também é apontado como um dos motivadores da crise. A diferença entre o que ganha o trabalhador dessa unidade e o operário de fora do ABC é de 128%.
A produção da unidade, que possui um custo elevado e cujo processo de fabricação é considerado obsoleto e ineficiente, é significativo na empresa: ela produziu, no ano passado, 192.693 veículos na unidade. Na fábrica do Taubaté, por exemplo, foram 205.100.
"O problema da Volkswagen se chama unidade São Bernardo", disse o consultor André Beer. "Os custos lá são mais elevados, e a montadora fez uma ação estrategicamente errada que foi assinar o contrato de manutenção de emprego por cinco anos", completou.

Concessionárias
Mas alguns especialistas afirmam que os problemas da Volks vão além da sua dependência das exportações em um momento de câmbio desfavorável e da falta de competitividade da unidade Anchieta. A demora da montadora em reestruturar sua rede de concessionárias -a concentração de revendas nas mãos de grupos de empresários melhora a profissionalização do negócio e permite maior controle sobre a marca- também é apontada como um dos fatores da crise.
Todas as montadoras realizaram esse processo de reestruturação, mas a avaliação é que a Volkswagen demorou mais em fazê-lo e o realizou com menos intensidade. A montadora afirma, entretanto, citando dados da Assobrav (associação das revendas da Volkswagen), que a sua rede foi reestruturada e que, de 1,4 ponto-de-venda por grupo, a média passou a ser de 1,7 ponto-de-venda.
Outra crítica feita à empresa é que, diferentemente de outras grandes montadoras do país, como a GM e a Ford, ela não reestruturou suas operações e investiu em modelos cujas vendas ficaram aquém do esperado, como o Polo e o Golf.
Para consultores, a montadora tem um custo maior, uma estrutura mais complexa para gerenciar (são cinco unidades no país) e uma gama menor de modelos de veículos na comparação com outras empresas.
A montadora se defende afirmando que fez a lição de casa: seus custos fixos caíram 30%, em 2003, para 17%, e sua produtividade melhorou 52%. A Volkswagen diz ainda que, de 13 veículos em seu portfólio em 2003, passou para 16 hoje.

Cenário incerto
Apesar do sofrimento com o câmbio e das demissões, a avaliação entre os consultores é que este será um bom ano para as montadoras no país, com o mercado interno impulsionado pelo crédito. Segundo Beer, a perspectiva é uma alta da produção de 8% a 9%.
"O setor está bem, os juros em queda ajudam as vendas, a gasolina mais barata também", afirma Richard Dubois, diretor-associado da consultoria AT Kearney. Para o ano que vem, entretanto, o cenário começa a se tornar um pouco mais incerto. "Se a economia esfriar em 2007, a indústria pode perder o seu bom momento e não terá o mercado externo para se sustentar", alerta.


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