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Vale criou monopólio privado no setor
Companhia controla produção e logística de exportação de minério de ferro e é maior beneficiada pela alta mundial da demanda
Empresa rejeita condição de monopolista e afirma que cresceu desde a privatização ao adquirir operações de multinacionais no país
HUMBERTO MEDINA
JULIANNA SOFIA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Dez anos depois da privatização, a Vale do Rio Doce é hoje
dona de um monopólio privado
na produção e na exportação de
minério de ferro no Brasil. Com
um lucro mais de 17 vezes superior ao registrado no ano da
venda, a companhia domina a
produção e a logística de exportação do minério, surfando sozinha a onda do crescimento
mundial do setor puxado pelo
consumo da China.
A Vale rechaça a condição de
monopolista e afirma que ficou
do tamanho que é hoje comprando empresas que foram
postas à venda por controladores multinacionais. Em tese,
essas empresas -donas de minas, participações em ferrovias
e terminais portuários- poderiam ter sido compradas por
qualquer outra companhia.
Mas, quando a explosão de
preço do minério de ferro no
mercado internacional aconteceu, em 2003 e 2004, a Vale já
estava com toda a infra-estrutura comprada.
O governo tem ganho com o
crescimento da Vale. Conta
com os recursos da empresa
para obras importantes de infra-estrutura (como a ferrovia
Norte-Sul, investimentos em
gás e energia elétrica), recebe
mais impostos, ganha dividendos e fatura com o efeito positivo das exportações de minério
da balança comercial.
Mais que isso: por meio de
fundos de pensão, do BNDES e
de seis ações tipo "golden share" (ação especial que dá poderes de veto ao seu detentor),
continua participando da empresa. A Vale informou que entre 2001 e 2006 investiu US$
44,6 bilhões, contra US$ 24,2
bilhões dos 54 anos anteriores.
Desde 1997, a Vale comprou
seus principais concorrentes e
investiu pesadamente em infra-estrutura para ganhar escala e se consolidar como um
competidor global. O maior
grupo empresarial privado
controla mais de 70 empresas,
o que inclui ferrovias e terminais portuários para escoamento das 217 milhões de toneladas que exporta por ano (2006). O lucro líquido saltou
de R$ 756 milhões em 1997 para R$ 13,4 bilhões em 2006.
Levantamento realizado pela
Folha mostra que, desde a privatização, a companhia já mobilizou os órgãos de defesa da
concorrência brasileiros em,
pelo menos, 46 casos.
Em 40, as iniciativas da empresa alteraram as estruturas
do mercado em operações,
principalmente, nas áreas de
extração mineral, energia elétrica, metalurgia e siderurgia e
serviços de infra-estrutura. Recebeu o aval das autoridades
antitruste, sem nenhuma restrição, em 29 operações. Dessas, 23 aprovações ocorreram
durante o governo Lula.
Aquisições
As aquisições da Vale entre
2000 e 2001 podem ser consideradas as mais estratégicas
para a empresa rumo ao monopólio do mercado. Ao comprar
a mineradora MBR, a Vale ganhou participação na ferrovia
MRS (que liga a região de extração de minério de ferro em Minas Gerais aos portos de Sepetiba, Rio e Santos) e um terminal
portuário.
Ao comprar a Ferteco, aumentou sua participação na
MRS e somou mais um terminal portuário. Com a aquisição
da Samarco, ganhou outro terminal portuário. Ou seja, a Vale
comprou empresas já verticalizadas e aumentou sua concentração na área de logística para
exportação de minério.
Ferrovias e portos são considerados braços essenciais no
negócio de venda de minério.
Nesse caso, a Vale controla
completamente três ferrovias
(FCA, Vitória-Minas e Carajás)
e tem participação no controle
da MRS, ferrovia da qual participam também a CSN (Companhia Siderúrgica Nacional), a
Gerdau e a Usiminas.
Em relação aos terminais especializados em minério, a Vale
tem quase todos. Apenas a CSN
tem terminal próprio. A MMX
(do grupo do empresário Eike
Batista) tem planos para construir dois terminais, um em
Santana (AP) e outro em São
João da Barra (RJ). A Vale, sozinha, tem sete terminais especializados em minério.
As operações de 2000 e 2001
foram julgadas em 2005 pelo
Cade, que impôs restrições para a efetivação dos negócios.
Até hoje, no entanto, a decisão
não é cumprida porque a Vale
vem obtendo uma seqüência de
liminares na Justiça. A decisão
do Cade tenta garantir a existência de pelo menos um concorrente de peso.
A empresa já enviou ofício
para o conselho definindo sua
estratégia de atuação, caso não
tenha sucesso na Justiça. A empresa deverá abrir mão da preferência que tem na produção
do minério de ferro da mina
Casa de Pedra. No entanto, deverá entrar em uma disputa
com a dona da mina -a CSN-
para receber uma indenização
pelo fim dessa preferência.
Casa de Pedra
Ficar sem o minério da Casa
de Pedra foi uma das opções colocadas pelo Cade no julgamento de 2005. Outra saída seria a
venda da mineradora Ferteco
-solução descartada pela Vale
devido à sua importância.
A atuação administrativa do
governo para barrar o poder da
Vale quase não surte efeito, dado o tamanho da empresa. A
ANTT (Agência Nacional de
Transportes Terrestres) limitou as tarifas cobradas pela empresa em suas ferrovias e sua
participação no controle de
uma delas (MRS). A Antaq
(transportes aquaviários) obrigou a Vale a abrir uma "janela"
no terminal de exportação do
porto de Sepetiba (RJ) para outros mineradores.
Enquanto isso, a Vale aproveita o momento. Em 2006, das
242,5 milhões de toneladas exportadas pelo Brasil, 217,1 milhões, ou 89,5%, foram da Vale.
Em 1997, a produção média
anual da empresa era de 35 milhões de toneladas. Neste ano, a
previsão é que chegue a 300 milhões de toneladas.
O valor dos investimentos da
Vale aumentou principalmente
a partir de 2003, coincidindo
com a alta do minério de ferro
no mercado internacional. Em
2001, descontados os valores
gastos em operações de aquisição, a empresa investiu US$
625 milhões. Para este ano, a
projeção é de US$ 7,351 bilhões.
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