São Paulo, sexta-feira, 03 de outubro de 2008

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ENTREVISTA JAMES GALBRAITH

Esse plano não evita recessão nos EUA

Para economista, socorro só empurra problema para o próximo presidente

Para ele, "o que acontece aqui não é socialismo, mas um ato de tentar salvar um grupo de pessoas culpado de atos muito prejudiciais"


DE WASHINGTON

O pai escreveu sobre a era da incerteza, o filho a vive -e não gosta do que vê. O economista progressista James Galbraith, 56, acha que os EUA estão a meio caminho da recessão, que o Plano Paulson serve para salvar o que ele chama de "Estado predatório" (título de seu livro mais recente) e que empurra o problema com a barriga. Foi o que o professor da Universidade do Texas e diretor da associação Economistas para Paz e Segurança disse à Folha ontem, emendando uma frase atribuída a seu pai, o keynesianista John Kenneth Galbraith (1908-2006): "Nos EUA, a única forma aceitável de socialismo é o socialismo para os ricos"
(SÉRGIO DÁVILA)
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FOLHA - O sr. já disse que a possibilidade de uma nova Depressão nos EUA é muito mais onda da mídia do que risco real. E quanto a recessão?
JAMES GALBRAITH
- Recessão é certamente uma possibilidade clara. Na verdade acho que já estamos no meio do caminho.

FOLHA - É inevitável? O plano não ajuda a diminuir essa possibilidade?
GALBRAITH
- Infelizmente, esse plano não faz nada para evitar uma recessão. O que eles estão tentando fazer é ajudar algumas instituições financeiras que se meteram num problema enorme, e estão fazendo isso de uma maneira extremamente ineficiente. O que farão é empurrar o problema com a barriga até que haja um governo competente para lidar com ele, em janeiro.

FOLHA - Então, o sr. não acha que esse é o plano coreto?
GALBRAITH
- Se eu o tivesse feito, seria muito diferente. O pacote pode ser melhor do que não fazer nada, no sentido de que colocar dinheiro é melhor do que não colocar, mas só. A base do plano é comprar ativos do sistema financeiro, e isso é uma maneira ineficiente de lidar com o problema da falta de capital das instituições financeiras dos EUA.

FOLHA - Qual seria a maneira eficiente, na sua opinião?
GALBRAITH
- O Plano B ideal seria fazer o que a Escandinávia fez no final dos anos 1990, que é basicamente garantir todos os depósitos no sistema bancário e comprar ações preferenciais dos bancos, recapitalizando as instituições financeiras. Especificamente: Comprar títulos podres pelo valor de mercado, não acima, como o Fed quer fazer agora, e os colocar numa nova corporação, independente. E então criar uma outra corporação de financiamento imobiliário para lidar com o problema das hipotecas inadimplentes.

FOLHA - O que acha dos acréscimos do Senado?
GALBRAITH
- O corte de impostos é uma idéia péssima, o aumento dos depósitos garantidos é o.k., mas eles deveriam ter ido além e aumentado a independência do órgão garantidor (Fdic), dando completo domínio nas decisões sobre que limite colocarão nos depósitos garantidos. Não deveriam ter limitado a US$ 250 mil, porque pode não ser o suficiente.

FOLHA - O sr. mencionou que o problema ficará com o próximo governo. Quem espera que seja o presidente?
GALBRAITH
- O senador Obama, porque o senador McCain está intimamente associado a todos os arquitetos desse desastre. Um governo McCain insistiria nas políticas atuais e aprofundaria o problema. Henry Paulson é um homem de negócios competente, mas falta a ele a experiência com governo que é requerida para que seja feito um trabalho competente. Além disso, ele sofre constantemente de um conflito de interesses potencial, o que vem destruindo completamente a credibilidade do Tesouro no processo.

FOLHA - Sobre o secretário do Tesouro, ele tem sido chamado de "socialista" no Congresso, pelo tamanho inédito e histórico da intervenção federal que propõe. Não sei sua posição sobre comentar frases de seu pai, mas uma das atribuídas a ele diz: "Nos EUA, a única forma aceitável de socialismo é o socialismo para os ricos". É este o caso?
GALBRAITH
- Primeiro, eu não tenho certeza de que meu pai disse isso. Pode muito bem ter dito. Mas eu prefiro usar a frase que usei no título do meu livro mais recente: "Estado Predatório". O que acontece aqui não é socialismo, mas um ato de tentar salvar um grupo de pessoas culpado de atos extremamente prejudiciais. O Plano Paulson é claramente pensado para evitar que eles sejam chamados à responsabilidade. Também não corrige os problemas causados por aquele grupo de pessoas.


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