São Paulo, domingo, 04 de janeiro de 2004

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ANÁLISE

Festa das Bolsas de Valores talvez não dure

FLOYD NORRIS
DO "NEW YORK TIMES"

Foi o ano em que quase todas as ações subiram e a instabilidade quase desapareceu. As ações de pequenas empresas tiveram o melhor desempenho em todos os tempos, e algumas estrelas da era da bolha se recuperaram de forma impressionante. Mas será que essa sorte continuará?
A ascensão dos mercados de ações começou bem antes que a maior parte dos analistas econômicos encontrasse sinais de um fim para os problemas de negócios que vinham deprimindo os espíritos e o crescimento econômico desde o estouro da bolha dos investimentos, no segundo trimestre de 2000.
Os ganhos mais acentuados do ano passado aconteceram no segundo e no quarto trimestres, começando alguns meses antes que a economia acelerasse subitamente, atingindo ritmo anualizado de crescimento de 8,2% e silenciando (ou pelo menos causando embaraço) àqueles que previam que um longo período de torpor econômico iria se seguir ao estouro da bolha nos mercados de ações norte-americanos, como aconteceu no Japão uma década antes. Os preços voltaram a se acelerar no final do ano.
O avanço do mercado foi tão poderoso que muitas ações, incluindo a maior parte daquelas que integram o índice Standard & Poor's 500 (S&P 500), o principal barômetro do desempenho das grandes empresas, e o Russell 2.000, um importante indicador do desempenho de empresas menores, estão agora acima das cotações registradas quando esses índices atingiram seus picos, no começo de 2000.
Para o ano como um todo, o índice industrial Dow Jones subiu 25% e o S&P 500 ganhou 26%, enquanto o índice composto Nasdaq subiu em 50% e o Russell 2.000 apresentou alta de 45% e registrou seu melhor desempenho em 25 anos de história.
Reativar a economia exigiu uma dose prolongada de política monetária relaxada, que reduziu as taxas de juros ao seu patamar mais baixo em mais de quatro décadas, combinada a uma grande dose de alívio tributário, sob a qual uma combinação de cortes de impostos e aumentos de gastos pôs fim aos superávits dos anos Clinton e produziu déficits que podem um dia desafiar os acumulados durante o governo Reagan.
A pressão final do acelerador foi o envio pelo governo de mais de 24 milhões de cheques de restituição de impostos, relacionados a despesas com filhos e montando a US$ 14 bilhões. Não deveria ser surpresa que a temporada de volta às aulas (em setembro, nos EUA) que se seguiu à chegada desses cheques tenha apresentado ótimos resultados de consumo. Mas houve quem não antecipasse essa tendência, e as vendas elevadas renovaram o otimismo do varejo com a aproximação da temporada de festas.
O otimismo talvez tenha sido exagerado. Os números preliminares do varejo no final do ano indicam que as lojas de luxo se saíram muito bem, obrigado, mas que as lojas que atendem às pessoas com posição inferior na pirâmide de renda não registraram tantas vendas. Desde o feriado de Ação de Graças, o S&P 500 subiu 5%. Mas a média das ações de cadeias de varejo que integram o índice recuou 6%.
Se a temporada tiver sido ainda pior do que Wall Street agora supõe, e o declínio nos preços das ações do varejo representa menos uma opinião de que o Natal foi ruim do que uma impressão de que talvez não tenha sido tão bom quanto se esperava, isso pode ser uma indicação de que o estímulo econômico proveniente dos cortes de impostos está começando a perder o ímpeto.
Na pior das hipóteses, poderia começar a parecer que o pé de chumbo no acelerador fez com que a economia pulasse para frente, mas não a colocou em velocidade que permita o avanço constante que os investidores agora esperam. Muitos economistas acreditam, no entanto, que os investimentos empresariais crescerão rápido o bastante para compensar qualquer desaceleração no consumo.

Avanço inegável
Não há como negar a força do avanço dos mercados de ações em 2003. Das 499 ações do S&P 500 que foram negociadas o ano todo, 92% delas subiram. Nos 24 anos em que essa estatística é acompanhada pela Standard & Poor's, esse é o melhor desempenho, superando o velho recorde de 86% estabelecido em 1995.
"Não tivemos nada disso da vez passada", afirma Howard Silverblatt, analista do mercado de capitais na Standard & Poor's, apontando que a amplitude de mercado, o nome técnico dessa estatística, não era nem de longe tão boa no período final da alta de mercado encerrada no segundo trimestre de 2000.
Em 1999, de fato, mais ações caíram que subiram, no S&P 500, a despeito de o índice ter crescido em mais de 20% naquele ano. "A questão é", diz ele, "será possível sustentar esse ritmo?"
Existem alguns sinais de que sim, ou pelo menos de que o mercado em geral não está prestes a desabar. Essa é a quinta vez, desde que a Standard & Poor's começou a acompanhar essa estatística, em 1980, que pelo menos 400 das ações do índice subiram. Os demais anos foram 1985, 1991, 1995 e 1997. Em cada um dos casos, o índice subiu no ano seguinte, ainda que menos que no anterior, e mais ações subiram que desceram, ainda que o número de ações em alta tenha caído para acentuadamente menos que 400.
"É típico do primeiro empuxo de uma alta cíclica de mercado", afirma Steven C. Leuthold, presidente da corretora Leuthold Weeden Capital Management, de Minneapolis. "No segundo ano, o ritmo de ascensão se reduz". Ele diz que o mercado provavelmente subirá 10% em 2004, atingindo um pico na metade do terceiro trimestre.
O desempenho em 2003 parece ter feito maravilhas pela confiança dos investidores. Enquanto escândalos abalavam o setor de fundos mútuos, bilhões de dólares foram investidos em fundos de ações. Os investidores que mantiveram as ações que se saíram melhor nos anos da bolha (em larga medida telecomunicações e tecnologia, mas também algumas "blue chips") não estão sequer perto de recuperar seus prejuízos. Mas os que montaram uma carteira mais diversificada naqueles anos podem agora estar mais ricos do que nunca.
Medido da maneira normal, o S&P 500 fechou 2003 com ganho de 26,4%, mas continua 27% abaixo de seu pico de 2000, como os investidores de longo prazo em fundos mútuos que acompanham o índice dolorosamente sabem. O desempenho, porém, reflete o fato de que o índice é ponderado por capitalização de mercado, ou seja, as empresas mais valiosas do índice dominam seu desempenho.
Essas empresas têm chance menor de recuperação plena do que as companhias menores. General Electric e Microsoft caíram mais de 40% desde que o índice atingiu seu pico. E elas, exercem impacto maior sobre o S&P 500 do que as 169 menores empresas do índice combinadas.


Tradução de Paulo Migliacci


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