São Paulo, terça-feira, 04 de abril de 2006

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LUÍS NASSIF

Gato no setor elétrico

Não está clara essa operação de IPO das ações da Equatorial -antiga Cemar (Centrais Elétricas do Maranhão). Algumas semanas antes do IPO, 46% de seu controle foi repassado pela GP Investimentos para o Fundo Pactual por um valor várias vezes inferior ao que seria obtido. Qual a razão?
A Cemar havia sido privatizada no governo Fernando Henrique Cardoso, adquirida por um fundo norte-americano, o SVM. Com o "apagão" e a crise da Enron, os fundos americanos do setor elétrico resolveram desinvestir. Deixaram a empresa nas mãos da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), pelo valor simbólico de US$ 1.
Com o interventor, a empresa começou a ser recuperada. Os dados da época mostravam que, com pouco investimento, reduzindo as perdas de energia e a inadimplência, o valor da empresa subiria substancialmente. Mas decidiu-se pela venda antes da valorização, em uma autêntica queima de patrimônio público.
Em 2004, foi adquirida pela GP de forma inusitada, concorrendo contra um fundo norte-americano disposto a injetar capital. Para a Cemar ser viável, havia a necessidade de equacionar o endividamento que tinha com a Eletrobrás. A GP recebeu o mandato do equacionamento de mão beijada. Não houve nem disputa. Com o mandato, a GP tornou-se dona da companhia sem pagar um tostão por ela. Na época, o presidente da Eletrobrás, Luiz Pinguelli Rosa, divulgou carta defendendo a operação, com argumentos altissonantes e completamente vazios.
Com a operação que precedeu o IPO, o GP e o Fundo Pactual passaram a controlar a Equatorial Energia Holdings, LLC -montada no paraíso fiscal norte-americano de Delaware-, que, por sua vez, controla a Brasil Energia, maior acionista do Equatorial brasileira, holding que entra no final do processo, como controladora da Cemar, com 64,5% de suas ações. A Eletrobrás tem outros 34%. Não se sabe quem participa da holding norte-americana.
Um dos sócios da Brasil Energia é Firmino Ferreira Sampaio Neto, ex-presidente da Eletrobrás e ligado ao grupo do senador ACM. Mas a maior influência sobre a Cemar na época de sua doação para o GP era do grupo do ex-presidente José Sarney.
Só em 2005, por seus 35% na Cemar (pelo qual integralizou R$ 55 milhões em dívidas), a Eletrobrás recebeu dividendos da ordem de R$ 28 milhões. O que significa que, apenas um ano após a reprivatização, a GP recebeu R$ 54 milhões em dividendos.
No mercado, há muita especulação sobre o que teria levado o GP a vender para o Pactual ações por um valor várias vezes inferior ao que obteria aguardando o IPO. Pessoas ligadas à operação dizem que foi para evitar disputas. Na compra da Light, o Pactual -associado à Andrade Gutierrez- venceu a concorrência em cima da GP.
Mas há coisas que não fecham também na compra da Light. Empresas tradicionais do setor se recusaram a participar do leilão por considerar que nem de graça a empresa seria atrativa. Hoje em dia, a tarifa incorpora 25% de inadimplência e "gatos". Bastaria a Aneel fazer valer a lei e reduzir essa parcela para 16% (a média nacional) para a Light perder 25% de seu faturamento. É um risco que só pode correr quem tem a garantia da influência política sobre os reguladores.


E-mail - Luisnassif@uol.com.br

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