São Paulo, quinta-feira, 04 de maio de 2006

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TENSÃO ENTRE VIZINHOS

Empresa diz que, se país quiser impor reajuste, recorrerá em NY e que suspendeu proposta de ampliar gasoduto

Petrobras diz que não aceita aumento do gás

Sílvia Izquierdo/Associated Press
O presidente da Petrobras, José Gabrielle, no Rio; a empresa suspendeu investimentos na Bolívia


ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO

Em tom mais duro do que o do governo Lula, o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, anunciou ontem a suspensão de novos investimentos da empresa na Bolívia e afirmou que não aceitará aumento de preço do gás natural imposto pelo país.
"Estamos suspendendo qualquer possibilidade de investimento adicional na Bolívia", declarou. Segundo ele, a Petrobras recorreria da decisão em corte arbitral de Nova York, fórum escolhido pelas partes para resolver divergências do contrato, assinado em 2000.
Segundo Gabrielli, o contrato está amparado em tratados internacionais que impedem ações unilaterais referentes às exportações de gás para o Brasil. O contrato, segundo ele, define o volume de gás a ser entregue até 2019 (30 milhões de m3 por dia), a fórmula de preço e admite revisões de tarifas a cada cinco anos. Gabrielli lembrou que, em 2003, a Petrobras solicitou uma redução nos preços, porque estava pagando pelo recebimento de 24 milhões de m3 por dia e só consumia metade. A Bolívia recusou.
Em resposta à nacionalização da produção de gás decretada pela Bolívia, a Petrobras anunciou que está cancelando a proposta que tinha feito para a ampliação do Gasoduto Brasil-Bolívia.
"Estamos cancelando nossa entrada no concurso aberto do Gasbol para expansão de 15 milhões de metros cúbicos de gás vindos da Bolívia, a partir de 2008. Significa que temos de arranjar outras fontes alternativas", disse.
A nova lei boliviana determina aumento de 50% para 82% do imposto recolhido pela Petrobras no país. Segundo a empresa, o aumento não pode ser repassado ao Brasil e implica redução de margem para a Petrobras, que diz que continuará operando no país enquanto o custo for inferior ao preço de venda.
A direção da estatal repetiu o que vem sendo dito pelo governo: que não há ameaça de desabastecimento de gás no país. Segundo Gabrielli, a empresa cumprirá seus contratos de fornecimento de gás firmados com as empresas concessionárias estaduais, que têm o monopólio da distribuição.
Questionado sobre como pode garantir esse abastecimento, uma vez que metade do consumo nacional é coberto com o gás importado do país vizinho, Gabrielli disse que a garantia é o cumprimento do contrato. "A alternativa seria, talvez, pensar em armas de destruição em massa na Bolívia, ou pedir o apoio do Exército Brasileiro, o que seria totalmente irresponsável", gracejou na mesma linha de ironia usada por Lula ontem (lei texto na pág. B4).
Gabrielli disse que o gasoduto é a única saída que a Bolívia possui para seu gás natural e precisa garantir a venda. Segundo ele, as autoridades bolivianas deram declarações de que não cogitam reduzir a exportação o Brasil.
Gabrielli citou um terceiro argumento para sua convicção de que não há risco de ""apagão de gás" no Brasil: a produção de gasolina, de diesel e de gás GLP na Bolívia está intrinsecamente ligada à produção do gás natural. Logo, se o país interrompe a produção de gás natural, fica sem os demais combustíveis.
As projeções da Petrobras indicam que o mercado interno brasileiro consumirá cerca de 99 milhões de m3 de gás por dia em 2010. A direção da estatal afirmou que está fazendo os esforços possíveis para elevar a oferta, com investimento de US$ 17 bilhões para o aumento da produção de gás na bacia de Santos, no litoral de São Paulo. A principal aposta é o campo de Mexilhão, o maior do Brasil, com início de produção previsto para 2009. Segundo Gabrielli, não há como antecipar a produção.
Outras providências listadas pela direção da empresa são a interligação das redes de distribuição de gás do Nordeste e do Sudeste e a aposta em fontes alternativas, como a importação de gás natural liquefeito, o que exigiria a construção de unidades para transformar o líquido em gás no Brasil. Nenhuma dessas providências, segundo Gabrielli, produz resultado em curto prazo.
O outro ponto de preocupação da Petrobras são os ativos que possui na Bolívia. Eles estão registrados na contabilidade da estatal por US$ 1,3 bilhão, mas correspondem a um patrimônio líquido de US$ 365 milhões, porque existem dívidas.
A Petrobras mostrou-se preocupada em reconhecer o direito da Bolívia à soberania sobre suas reservas, mas lembrou que seus investimentos naquele país foram feitos por intermédio de sua subsidiária na Holanda, que tem um acordo de proteção dos investimentos com a Bolívia.


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