São Paulo, quinta-feira, 04 de maio de 2006

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TENSÃO ENTRE VIZINHOS

Presidente diz que não vai "brigar" com Bolívia e ironiza Bush

Lula apóia Morales e vê erro estratégico em dependência

PEDRO DIAS LEITE
EDUARDO SCOLESE

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva apoiou ontem a decisão do boliviano Evo Morales de nacionalizar as reservas de gás de seu país e disse que não existe nenhuma crise entre os dois países. Lula afirmou que os preços não vão subir, chegou a fazer uma brincadeira dizendo que não iria "descobrir uma arma" na Bolívia para brigar com o vizinho e classificou de "erro estratégico o Brasil ficar dependente de uma única fonte de energia que não é nossa".
A construção do gasoduto foi acertada em agosto de 1992, ainda no governo de Fernando Collor de Mello, e o contrato para a construção foi assinado em setembro de 1996, na gestão de Fernando Henrique Cardoso, segundo informações da Petrobras.
"Nós estamos vendo a imprensa brasileira falar da crise Brasil-Bolívia, não tem crise Brasil-Bolívia. E não existe a crise. Existirá um ajuste necessário de um povo sofrido e que tem o direito de reivindicar ter maior poder sobre a maior riqueza que tem", disse Lula, muito aplaudido pelas cerca de 300 pessoas, de 35 países, na abertura da 16ª Reunião Regional das Américas da OIT (Organização Internacional do Trabalho).
À tarde, Lula disse que "a coisa é mais tranqüila do que se possa imaginar". A avaliação foi feita a donos de jornais, depois da assinatura de uma declaração de apoio à liberdade de imprensa. Em seguida, em entrevista, afirmou que "não vai aumentar o preço do gás". "Não tenho essa preocupação", afirmou.
A decisão de Morales obriga a Petrobras, que já investiu US$ 1,5 bilhão no país, a vender o controle acionário de suas refinarias ao governo boliviano e eleva os impostos de 50% para 82%. Se não aceitar, será forçada a deixar o país em um prazo de 180 dias. A estatal brasileira já decidiu recorrer à Justiça dos EUA.
Mas Lula evitou qualquer atrito com Morales e até ironizou a situação. "Não vamos descobrir uma arma qualquer na Bolívia para justificar uma briga com a Bolívia não", disse, no evento pela manhã, para risos da platéia.
Foi uma menção à invasão do Iraque pelos EUA. O governo George W. Bush usou como justificativa para a guerra a existência de armas de destruição em massa no Iraque, mas depois ficou provado que não existiam.
Minutos depois da crítica a Bush, Lula lembrou que mantém "ótimo" relacionamento com o atual presidente dos EUA.
Lula afirmou ainda que vai decidir o impasse com os bolivianos por meio de negociação, sem confronto. "Eu faço política, eu aprendi a negociar muito antes de ser político, e as divergências nossas serão tiradas em torno de uma mesa, conversando", disse.
Hoje, Lula tem uma reunião em Puerto Iguazu (Argentina) com Morales e os presidentes da Venezuela, Hugo Chávez, e da Argentina, Néstor Kirchner.
"O fato de os bolivianos terem direitos não significa negar os direitos do Brasil. O que não pode é uma nação tentar impor sua soberania sobre as outras, sem levar em conta que o resultado final da democracia é o equilíbrio entre as partes", disse Lula.
No dia anterior, em nota, o governo brasileiro já tinha dito que reconhece a nacionalização como "ato inerente à soberania" da Bolívia e lembrava que o Brasil, "como manda sua Constituição, exerce pleno controle sobre as riquezas do seu próprio subsolo".


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