São Paulo, quinta-feira, 04 de setembro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

VINICIUS TORRES FREIRE

O sigilo achado na rua


Espionagem chegou ao cúmulo de atingir o topo da República, mas há grampismo em massa, de atacado e varejo

NO CENTRO de São Paulo ainda é possível comprar cadastros com informações fiscais de cidadãos. Os intermediários do negócio perambulam por calçadas, como camelôs. Fecham negócios em salinhas de prédios que parecem cortiços. Há até estudos econômicos e acadêmicos baseados nessas bases de dados "grampeadas".
Essa história já é velha. Depois que alguns de seus colegas de trabalho foram flagrados também por TVs, ano passado, os vendedores ficaram muito mais ariscos. Na verdade, os intermediadores ficaram mais ariscos. Mas, com jeitinho, não demora muito para se chegar a uma "banca" de CDs com dados sigilosos.
Não se trata bem de uma banca, como a de softwares ou CDs piratas. O varejista do sigilo quebrado some numa saleta e reaparece na escadinha escura com o CD. O negócio todo leva um dia, por aí. Pelo menos para o cliente inusual.
Pode-se comprar mais do que informações oficiais. Tem dados de clientes de cartão de crédito? A depender de qual e de quando, tem.
Tem venda de "mailings", as listas de endereços de clientes de empresas.
E listagem de ligações telefônicas, tem? Na rua, não. Tem "camarada" que faz, mas tem que procurar.
Tem lista com dados bancários?
Não. Mas há alguns anos reportagens da Folha mostraram que era relativamente fácil obter informações bancárias por meio de funcionários fraudulentos de empresas de prestação de serviços para bancos. Jornalistas que cobrem falcatruas vez e outra recebem ofertas de venda de grampos e similares.
Faz uns dois anos, a polícia fez uma limpa no centro de São Paulo e prendeu alguns desses "soldados" do varejo de informações resguardadas por sigilo. Alguns são presos, aparecem outros, assim como não se acaba com o comércio pirata prendendo camelôs nem se acaba com a venda de crack e de maconha batizada com crack pegando bagrinhos. Por falar nisso, na região da av. Paulista é mais fácil adquirir por R$ 30 softwares de matemática e estatística que custam R$ 1.000, R$ 2.000, do que comprar yakissoba de barraquinha de calçada (os camelôs da gororoba andam sendo perseguidos).
Pois bem, estamos falando do varejo, dos camelôs das diversas espécies de "grampo". Mas já foram presas quadrilhas que utilizavam dados do fisco, como cadastros de devedores, para diversos fins. Agora mesmo, em julho, a Polícia Federal prendeu quadrilha que interceptava grampos legais e vendia tal informação aos investigados, além de grampear e vazar informação bancária. Há o atacado do grampo.
O comércio de luxo do grampo.
Que instituições de governo sejam responsáveis por grampos e vazamentos é coisa muito pior, decerto (aliás, anda muito esquecida a quebra do sigilo do caseiro Francenildo). Mas o que dizer quando há vastas porções do Estado contaminadas pelo crime, a vazar e espionar dados sigilosos, negócio feito financiado por dinheiro grosso?
Isto é, o que dizer do vazamento crônico que não ocorre por iniciativa "institucional"? Sim, a coisa chegou ao cúmulo com a espionagem de chefes de Poderes. Mas debaixo do cume há montanhas de sujeira menosprezadas.

vinit@uol.com.br


Texto Anterior: Montadoras: Metalúrgicos fazem greve por reajuste
Próximo Texto: Bovespa perde 1,6%, no 4º pregão de baixa
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.