São Paulo, quinta-feira, 04 de outubro de 2007

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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

A Europa e o FMI


Pelo menos no FMI, os europeus ocidentais são atualmente a principal fonte de resistência a mudanças

NO BRASIL, há um certo equívoco sobre os europeus ocidentais. O brasileiro pensa que europeu é mais flexível, socialista, esclarecido etc. Os Estados Unidos levam o grosso da má fama de imperialistas, prepotentes etc., principalmente durante o governo George W. Bush.
A Europa é boa de marketing. É a conclusão a que estou chegando depois de seis meses aqui em Washington. Pelo menos no FMI, os europeus ocidentais constituem atualmente a principal fonte de resistência a mudanças. São os defensores mais fervorosos do status quo.
A Europa Ocidental, liderada pela França, pela Alemanha, pela Itália e pela Inglaterra, detém uma posição superprivilegiada no FMI, que remonta à criação da instituição logo depois da Segunda Guerra Mundial.
Desde o início, em 1946, o cargo máximo da instituição, o de diretor-gerente, foi sempre ocupado por um europeu ocidental, em razão de um acordo tácito com os EUA, que ficaram com o direito de indicar o presidente do Banco Mundial. O Fundo teve nove diretores-gerentes europeus até agora. Dominique Strauss-Kahn, que acaba de ser eleito, será o décimo europeu ocidental e o quarto francês a ocupar o posto.
Além disso, a Europa Ocidental quase sempre ocupou a presidência do Comitê Monetário e Financeiro Internacional -o comitê de ministros e presidentes de bancos centrais que discute e define, entre outros aspectos, a agenda e as prioridades do FMI. Desde a sua criação em 1974, esse comitê foi presidido por 12 europeus ocidentais, às vezes por períodos longos. A única exceção à regra foi o Canadá, que presidiu o comitê em três ocasiões, por períodos curtos. A eleição do novo presidente desse comitê foi concluída ontem e o resultado será divulgado provavelmente amanhã.
Basta? Não, de modo algum. A União Européia (UE) comanda 7 das 24 cadeiras da diretoria-executiva do FMI. A Europa tem um total de oito, se contarmos a cadeira da Suíça, que não faz parte da UE. A Espanha reveza com a Venezuela e o México no comando de uma outra cadeira. Em determinadas épocas, portanto, a Europa Ocidental tem 9 das 24 cadeiras da diretoria!
Por último, mas não menos significativo: os 27 países da UE concentram nada menos que 32% dos votos totais do FMI -quase o dobro do percentual dos EUA, que é de 17%! Atualmente, as oito cadeiras comandadas por europeus ocidentais (UE + Suíça) controlam 36% dos votos totais.
O Brasil, em aliança com outros países, está lutando por vários caminhos para alterar esse quadro e aumentar os votos e a voz das nações menos desenvolvidas. Como o meu espaço está acabando, tenho que deixar para outra ocasião a explicação do que o Brasil está fazendo de concreto para tentar mudar o FMI.
Hoje, só acrescento o seguinte: as forças são muito desiguais. E os europeus, montados nos seus privilégios e na sua grande superioridade numérica, não parecem dispostos a fazer grandes concessões.
Como o rei da Pérsia Xerxes 1º, os europeus ocidentais poderiam exigir a nossa rendição pura e simples, ameaçando: "Somos tantos que as nossas setas cobrirão a luz do sol". E nós, como os 300 de Esparta, responderíamos: "Melhor, combateremos à sombra".
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR. , 52, escreve às quintas-feiras nesta coluna. Diretor-executivo no FMI, representa um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago).
pnbjr@attglobal.net


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