São Paulo, domingo, 04 de novembro de 2001

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O VAIVÉM DO DÓLAR

Empresas recorrem a debêntures para captar US$ 3,9 bi

Recessão global e Argentina restringem crédito externo

MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL

O crédito ficou mais caro para as empresas brasileiras. Sem acesso ao mercado internacional, precisaram recorrer às debêntures para levantar cerca de US$ 3,9 bilhões até setembro deste ano. Linhas de crédito no mercado externo, se não forem para cobrir operações de comércio exterior, estão praticamente fechadas.
O desaparecimento das fontes de financiamento externo ocorre por conta da recessão mundial e do agravamento das crises argentina e turca, que, desde o início do ano, assusta os investidores.
Com exceção de grandes empresas e bancos, que têm conseguido colocar papéis no mercado internacional a custos razoáveis, resta aos empresários brasileiros recorrer ao mercado interno ou adiar planos de investimento.
Parte da captação externa foi realocada para o mercado nacional. A emissão de debêntures -títulos com vencimento predeterminado- neste ano cresceu 51% até setembro em comparação com os primeiros nove meses de 2000. Em dólares, o crescimento foi de 21%, com as emissões chegando a US$ 3,9 bilhões.
O volume começou a crescer principalmente a partir de março, depois que as crises na Turquia e na Argentina assustaram os investidores internacionais que tradicionalmente compram papéis de países emergentes.
"Os negócios andam em velocidade mais lenta. Os custos subiram e há uma concentração nos melhores tomadores. Alguns dos bancos que tinham alta exposição em países emergentes decidiram realocar recursos", explica Lúcio Moura, diretor da divisão internacional do Lloyds TSB.
Com exceção das operações de financiamento de comércio exterior, que continuam estáveis, as demais linhas de crédito para empresas de países emergentes foram reduzidas e concentradas em poucas empresas. O HSBC prevê fechar, em 2002, o mesmo volume de operações de comércio exterior que terá neste ano.
O Sudameris, que financia cerca de 10% das exportações brasileiras, também prevê estabilidade para esse tipo de operação. "Houve uma pequena paralisação logo após os ataques terroristas nos EUA, mas a situação se normalizou", diz João Luiz Pasqual, diretor de finanças e da área internacional do banco.
"Essas operações, que geralmente têm prazo de um ano, devem se manter estáveis", diz Antonio Assis, diretor de negócios internacionais do HSBC. Os custos para fechá-las, no entanto, continuam mais altos do que os registrados antes do agravamento da crise argentina, explica Assis.
No início do ano, a taxa de juros cobrada nesses empréstimos estava 0,4 ponto percentual acima da libor -a taxa de juros praticada no mercado londrino. Hoje, em alguns casos, paga-se um adicional de dois pontos percentuais.
Para outras operações, o mercado fica virtualmente fechado. "Se não é uma Petrobras, fica muito caro para a empresa fazer um financiamento de médio prazo", diz o diretor do HSBC.
Nem a redução das taxas de juros internacionais ajuda a reduzir os custos de financiamento das empresas brasileiras, como aconteceu no início da década de 90.

Aversão ao risco
O último relatório sobre o mercado internacional de capitais do FMI mostra que, quando as taxas de juros nos EUA caíram 4,5 pontos percentuais, entre 1991 e 1993, os investidores saíram à procura de papéis com rendimentos mais altos que os títulos da dívida norte-americana. Os fluxos de capital destinados a papéis de países emergentes subiram 32%.
Neste ano, no entanto, os juros já caíram quatro pontos percentuais nos EUA, mas o volume de dinheiro para os países emergentes despencou 20% no primeiro semestre. Por que o comportamento é diferente? "A aversão ao risco hoje é muito maior do que naquela época", diz Paulo Vaz, diretor do banco Barclays e Galícia.
De fato, entre 1991 e 1993 o índice Embi do JP Morgan (um indicador da avaliação de risco de um conjunto de países emergentes) oscilou entre 600 e 650 pontos. De 1998 a 2000, saltou de 600 para 1.200 pontos.
Num mercado em que os investidores se mostram menos propensos a investir em papéis mais arriscados, o Brasil deve enfrentar ainda mais dificuldades. "A indefinição gerada pelas eleições complica ainda mais o cenário", afirma Vaz.
"Colocar papéis com vencimento até dezembro de 2002 é mais fácil. A partir daí a seletividade aumenta bastante", completa.

Volta dos investidores
O diretor da área de soluções estratégicas do Dresdner, Klaus Heritt, tem avaliação mais otimista. Ele lembra que os investidores que colocam seus recursos em países emergentes já estão, de certa forma, acostumados com esse tipo de investimento.
"É natural que eles corram para um lugar mais seguro por algum tempo. Mas cedo ou tarde eles começam a procurar por um retorno mais atrativo", diz Heritt, explicando por que avalia que a procura por papéis de empresas brasileiras deve voltar a crescer.
Para o diretor do Dresdner, o Brasil acabará se transformando na opção mais viável para quem investe na América Latina. "As opções são México, Chile, Argentina e Brasil. Mas México e Chile pagam taxas menores, e o risco da Argentina é muito alto", afirma.
Assim, explica o diretor do Dresdner, os papéis brasileiros serão a melhor alternativa para quem quiser um ganho maior com risco suportável.



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