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ARTIGO
Os horrores da "estagdeflação"
NOURIEL ROUBINI
ESPECIAL PARA O "FINANCIAL TIMES"
A
ECONOMIA dos EUA e
mundial corre o risco
de uma severa "estagdeflação", uma combinação
mortífera de estagnação/recessão econômica e deflação.
Uma recessão mundial severa resultará em pressões deflacionárias. A queda na demanda
resultará em inflação mais baixa, à medida que as empresas
cortem preços para reduzir
seus estoques excedentes. A
folga nos mercados de trabalho
gerada pelo desemprego ajudará a controlar os custos de mão-de-obra e os salários. A folga
nos mercados de commodities
devido à queda de preços também conduzirá a uma queda
acentuada na inflação. Assim, o
nível de inflação nas economias
avançadas deve rumar ao patamar de 1%, que costuma despertar temores de deflação.
A deflação é perigosa porque
resulta em armadilhas de liquidez, de deflação e de deflação
de dívidas: as taxas de juros nominais não podem cair abaixo
de zero, e com isso a política
monetária perde a efetividade.
Já estamos vivendo numa armadilha de liquidez, porque a
taxa de fundos federais do Federal Reserve (o BC dos EUA)
ainda é de 1%, mas a taxa efetiva
está perto de zero, porque a instituição inundou o sistema financeiro com liquidez. Além
disso, nas deflações a queda nos
preços significa que o custo real
do capital é elevado a despeito
de taxas de juros próximas de
zero, e isso resulta em novas
quedas no consumo e no investimento.
A queda na demanda e nos
preços gera um círculo vicioso:
a renda e o número de empregos caem, e isso gera novas quedas de demanda e preços (uma
armadilha de deflação); e o valor real das dívidas nominais
sobe (uma armadilha de deflação de dívida), o que torna os
problemas dos devedores mais
severos e leva a um risco crescente de inadimplência domiciliar e empresarial, o que exacerba os prejuízos das instituições financeiras com o crédito.
Como a política monetária
tradicional está perdendo a efetividade, outras medidas não
ortodoxas vêm sendo usadas:
oferta maciça de liquidez aos
bancos (para superar a perda
de liquidez e reduzir o "spread"
entre as taxas de juros de curto
prazo no mercado e as taxas de
juros oficiais) e políticas quase
fiscais de resgate a investidores, devedores e credores.
E ações políticas "malucas",
ainda menos ortodoxas, tornam-se necessárias para reduzir o crescente "spread" entre
as taxas de juros de longo prazo
sobre os títulos do governo e as
taxas de juros determinadas
pela política monetária, bem
como o alto "spread" entre as
taxas de curto e de longo prazo
e os títulos de curto e de longo
prazo do governo.
Os bancos centrais são tradicionalmente o emprestador de
último recurso, mas agora estão se tornando o primeiro e
único recurso, porque os bancos comerciais não estão emprestando. Com o colapso no
consumo domiciliar e nos gastos empresariais, os governos
em breve se tornarão o último
recurso também na ponta dos
gastos, e os déficits fiscais dispararão.
A crise financeira já ganhou
alcance mundial, porque os
elos dos mercados financeiros
transmitiram a todo o mundo o
choque dos Estados Unidos.
As perdas gerais de crédito
provavelmente estão próximas
de atordoantes US$ 2 trilhões.
Assim, a menos que as instituições financeiras sejam rapidamente recapitalizadas pelos governos, a compressão de crédito se tornará ainda mais severa,
caso os prejuízos cresçam mais
rápido do que a recapitalização.
Mas, com os governos e bancos centrais incorporando aos
seus balanços as perdas do setor privado, o déficit fiscal dos
Estados Unidos superará o US$
1 trilhão nos dois próximos
anos.
O Fed e o Tesouro estão assumindo imensos riscos de crédito, o que coloca em risco a solvência do governo dos Estados
Unidos no longo prazo.
Nos próximos meses, o fluxo
de notícias sobre resultados
empresariais e sobre a macroeconomia será muito pior que o
esperado.
A compressão de crédito vai
se agravar, e a desalavancagem
continuará à medida que fundos de "hedge" e outras instituições se virem forçados a
vender ativos em mercados
desprovidos de liquidez e ainda
abalados. Isso gerará uma nova
queda em cascata dos preços, a
quebra de novas instituições financeiras insolventes e crises
financeiras abertas em algumas
das economias de mercado
emergente.
Ainda não superamos o pior
período. 2009 será um ano doloroso de recessão mundial, deflação e falências.
Apenas ações políticas muito
agressivas e bem coordenadas
poderão garantir que a economia mundial se recupere em
2010, em lugar de enfrentar estagnação e deflação prolongadas.
NOURIEL ROUBINI é professor de Economia na
Escola Stern de Administração de Empresas, na
Universidade de Nova York, e presidente da RGE
Monitor, uma consultoria econômica.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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