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Crise deve elevar inadimplência em 2009
Para especialistas, oferta recorde de crédito antes da turbulência pode se converter em calotes se a taxa de desemprego subir
Dados mais recentes do Banco Central, de junho, mostram 16,76 milhões
de brasileiros com dívida
bancária superior a R$ 5.000
JULIANA ROCHA
NEY HAYASHI DA CRUZ
JULIANNA SOFIA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Depois de oferecerem crédito facilitado e com prazos longos, os bancos devem amargar
maior inadimplência neste
ano. Especialistas alertam de
que o aumento do desemprego
no país pode levar a uma onda
de calotes nas dívidas feitas antes da crise econômica mundial. Os últimos dados oficiais
apontam para crescimento de
19,3% no endividamento do
brasileiro. Em novembro, a inadimplência ficou em 7,8% do
total que deveria ser pago no
mês -a maior do ano. Em novembro de 2007, era de 7,1%.
O Sistema de Informações de
Crédito do Banco Central, ao
qual a Folha teve acesso, mostra que 16,76 milhões de pessoas têm dívidas bancárias acima de R$ 5.000. O dado é de junho -o último disponível, anterior ao agravamento da crise.
Em junho de 2007, o número
de pessoas com dívidas altas
era de 13,52 milhões, ou seja, o
endividamento considerado
elevado cresceu 19,3% em um
ano. Na comparação em 18 meses, o aumento foi de 25%.
Após a piora da crise, houve
desaceleração da oferta de crédito, mas o volume emprestado
pelos bancos não caiu. Ao contrário, os novos clientes que tomaram financiamento pagaram taxas de juros mais altas,
usando parcela maior da renda.
"O brasileiro entra em 2009
muito endividado. Se o desemprego crescer no primeiro trimestre, veremos um efeito no
aumento da inadimplência.
Acredito que isso já possa ocorrer no primeiro bimestre,
quando as pessoas têm de pagar despesas extras de escola,
IPVA, IPTU", afirmou Luiz Miguel Santacreu, analista de instituições financeiras da consultoria Austin Rating.
O desemprego no Brasil fez
suas primeiras vítimas nos dois
últimos meses de 2008. Demitido em 3 de dezembro de uma
unidade da Vale em Itabira
(MG), Joaquim Gomes Neto,
49, enfrenta dificuldades para
pagar empréstimo feito há três
anos, de R$ 35 mil, com prazo
de sete anos. Na época, o salário de R$ 2.143 bastava para as
parcelas mensais de R$ 600.
Com a demissão, ele ainda
terá quatro anos para quitar os
R$ 25 mil restantes. Como contribuía com a Valia (fundo de
pensão da Vale), tem direito a
R$ 740 mensais, dos quais sobram apenas R$ 140 para as
despesas após pagar a dívida.
"Recebi meu FGTS. Estou
conseguindo viver. Até porque
não tem jeito. A gente aperta e
o dinheiro tem de dar."
Carro e cartão de crédito
Os dados do BC mostram que
as operações de crédito que
mais cresceram em um ano foram as de leasing (arrendamento mercantil), usadas, na
maioria das vezes, para a compra de automóveis (aumento de
146,4%) e o uso do crédito rotativo do cartão (47,7% de alta).
Este último conta com a taxa de
juros mais alta do mercado.
"O uso do crédito rotativo do
cartão e do cheque especial é sinal de descontrole do orçamento familiar. Isso já acontecia antes da piora da crise. Mas, com o
desemprego, vira uma bola-de-neve e um inferno a essas pessoas", diz Gilberto Braga, professor de finanças do Ibmec.
Embora os bancos estimulem o uso do crédito rotativo do
cartão e do cheque especial, por
terem juros mais altos, Braga
recomenda que os clientes evitem essas dívidas. Ele diz que,
em momento de incerteza, a
melhor decisão é cortar gastos
que não cabem no orçamento.
O economista Marcel Domingos Solimeo, da Associação
Comercial de São Paulo, alerta
de que outro fator que pode elevar a inadimplência em 2009 é
a menor disposição dos bancos
em renegociar dívidas com
seus clientes. Isso porque as
instituições financeiras também têm sentido os efeitos da
crise e enfrentam dificuldades
para colocar dinheiro em caixa.
Apesar dos riscos, o governo
diz que ainda há espaço para a
expansão do crédito em 2009.
O chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Altamir Lopes, ressalta que o grau
de endividamento observado
no Brasil ainda é baixo quando
comparado com outros países.
Ele cita, por exemplo, o baixo
volume de financiamentos habitacionais existentes no país.
Hoje, os empréstimos para a
compra de carros superam, em
valor, os destinados para a
aquisição de imóveis.
"Isso acontece porque os
bancos não têm muitas opções
para captar recursos que possam ser usados em financiamentos de longo prazo, como
os habitacionais", diz Lopes.
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