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São Paulo, sábado, 05 de julho de 2003

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OPINIÃO ECONÔMICA

Sem dinheiro para turismo

GESNER OLIVEIRA

Com a queda na renda do brasileiro nestas férias -14% de declínio em abril, segundo o IBGE-, não está dando para fazer turismo. Tampouco o governo parece disposto a investir nessa atividade e trazer turistas estrangeiros para o Brasil. E com isso perdem-se mais renda e empregos.
A decisão do governo anunciada nesta semana de fechar o escritório modelo do Brasil montado em Londres em abril de 2002 com consultores especializados em marketing e mídia vai na contramão daquilo que deveria ser uma política agressiva de promoção do turismo no país.
Todo mundo sabe que o dinheiro está curto. O jeito é apertar os cintos em vários ministérios porque não há espaço nas contas públicas. Não dá mais para aumentar uma carga tributária que anda beirando os 37% do PIB sem asfixiar de vez a atividade produtiva. O Estado precisa urgentemente gastar com critério e sabedoria nos segmentos que apresentam alto retorno.
Cortes indiscriminados nessas circunstâncias costumam gerar mais prejuízo porque a diminuição de certas despesas termina por reduzir mais que proporcionalmente a receita. Quando uma empresa está no vermelho, mas sua operação ainda cobre o custo variável, a decisão correta é manter certas despesas produtivas para minimizar o prejuízo.
Analogamente, o investimento em promoção do turismo deve ser mantido, mesmo em tempos difíceis. Estima-se, por exemplo, que com o orçamento de US$ 200 mil ao ano do escritório que foi fechado seja possível gerar uma cobertura na mídia britânica de valor equivalente a US$ 30 milhões.
A promoção do turismo constitui forma eficiente de estimular o emprego, entre outras vantagens, como geração de divisas e desenvolvimento regional. Um turista norte-americano gasta em média US$ 126 por dia que passa no Brasil (a média de sua estadia é de duas semanas). Com US$ 7.000 gerados na economia do turismo, um emprego se mantém ou é gerado. Assim, ao conquistar quatro novos turistas dos EUA, evita-se mais drama de desemprego.
O europeu é mais moderado em seus gastos diários (US$ 85), mas em compensação tem uma estada média maior (20 dias), deixando cerca de US$ 1.700 no país. Portanto um grupo de quatro turistas europeus também pode representar um emprego a mais no Brasil.
Na campanha presidencial do ano passado, o PT não fez economia com o turismo. Segundo seu programa, "nosso governo vai impulsionar o turismo como uma indústria avançada [...] e é mais do que justificável estimular e atrair investimentos de peso para o turismo receptivo". Não é o que está ocorrendo.
Uma estratégia bem elaborada de desenvolvimento do turismo permitiria expandir o número de turistas estrangeiros dos atuais 4,5 milhões para 9 milhões em 2006, o que permitiria a criação de mais de 600 mil empregos.
Mas o problema não se restringe naturalmente a gastos em promoção. A violência urbana constitui obstáculo evidente para a expansão que se deseja. O governo federal faria um grande serviço para a economia do país ao atacar de forma séria e sistemática o problema. Foram criados inúmeros ministérios, mas não o da Segurança. A impressão é que a determinação de enfrentar o desafio, se é que houve, esmoreceu.
Quem tiver dúvidas sobre o que é determinação aproveite as férias e assista ao cativante "Procurando Nemo". O pai de Nemo, Marlín, um pacato peixinho-palhaço, nada dois oceanos e enfrenta baleias e tubarões para resgatar seu filho sequestrado por um dentista australiano.
A prioridade da segurança surge em época de eleição ou imediatamente após um sequestro ou qualquer outro crime espetacular que choque a opinião pública. Depois disso, volta a rotina da criminalidade. Aliás, o tratamento VIP que o MST recebeu do Palácio do Planalto nesta semana não poderia dar sinal mais negativo de falta de rigor por parte da autoridade estabelecida.
A falta de dinheiro é um fato. Existe em turismo, segurança e em todas as áreas. Mesmo assim, é possível obter resultados expressivos, estabelecendo metas realistas e maximizando os recursos disponíveis. Mas não há filme ou política pública que sobreviva à ausência de um bom roteiro.


Gesner Oliveira, 46, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), professor da FGV-EAESP, sócio-diretor da Tendências e ex-presidente do Cade.

Internet: www.gesneroliveira.com.br

E-mail - gesner@fgvsp.br


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