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INTEGRAÇÃO
Comissários do bloco dizem que darão prioridade a documento apresentado pela OMC para reunião em Cancún
UE põe texto agrícola do Brasil em 2º plano
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
A União Européia dará tratamento de segunda classe ao documento sobre liberalização agrícola apresentado pelo chamado
G20, o grupo de 20 países em desenvolvimento comandado por
Brasil e Índia.
Essa perspectiva ficou nítida
ontem, durante teleconferência
dos comissários (espécie de ministros) europeus para o Comércio, Pascal Lamy, e para Agricultura, Franz Fischler, com um grupo de jornalistas de 15 países.
Fischler afirmou que o documento apresentado pelo presidente do Conselho Geral da OMC
(Organização Mundial do Comércio), o uruguaio Carlos Pérez
del Castillo, tem precedência sobre o texto do G20, por ter sido já
debatido com todos os países-membros da OMC, diferentemente do texto do G20.
"Trata-se de uma base mais ampla", diz o comissário.
O Brasil acha justamente o
oposto: rejeitou, por "desequilibrado" em favor dos países ricos,
o texto de Pérez del Castillo. Não
gostaria, portanto, que servisse
como base principal para as negociações agrícolas que se darão a
partir do dia 10 em Cancún (México), durante a 5ª Conferência
Ministerial da OMC.
Fischler ressalvou, como é óbvio, que o texto do G20 também
será discutido. Mas, em negociações comerciais, o texto escolhido
como base acaba predominando
porque é difícil conciliar posições
de 146 países (número de membros da OMC) quando mais de
um papel está sobre a mesa.
Moldura geral
De todo modo, o comissário europeu já antecipou que, de Cancún, não sairão números concretos sobre a redução do protecionismo agrícola praticado por países ricos, em especial Estados
Unidos e União Européia.
No máximo, sairá uma moldura
geral. "Os números exatos [da
abertura agrícola] serão acrescentados depois", disse Fischler.
O governo brasileiro já está preparado para essa hipótese, mas,
não obstante, quer que a moldura
resultante do encontro no México
"tenha o potencial de ser preenchida com números favoráveis",
diz o chanceler Celso Amorim.
Sem simpatia
Essa hipótese benigna depende
de o texto do G20 ser aceito como
base da negociação, tese que não
tem a menor simpatia dos europeus.
Pascal Lamy chega até a colocar
em dúvida a consistência do G20,
ao dizer, com ironia, que é "interessante" que Brasil e Índia se ponham de acordo na área agrícola,
quando o Brasil é pela liberalização irrestrita do setor, e a Índia,
muito protecionista.
"Não vejo como a Índia possa se
alinhar com a posição brasileira
de liberalização agrícola total",
aposta Lamy.
O comissário europeu rejeita,
de plano, a hipótese de abertura
total. "Pode ser boa para a Argentina, o Brasil, a Austrália e a Nova
Zelândia, mas não seria boa para
Índia e África", diz Lamy.
Tática antecipada
A teleconferência acabou servindo para antecipar um pouco a
tática européia para Cancún,
composta pelos seguintes elementos centrais:
1) Cancún não é apenas uma negociação agrícola. Há "20 pratos
sendo cozinhados", lembra
Lamy, em alusão aos pontos que
compõem a agenda da (Organização Mundial do Comércio) e que,
a rigor, tratam de tudo o que o ser
humano produz e comercializa
entre fronteiras.
Portanto, para ceder eventualmente em agricultura, a União
Européia vai cobrar elevado preço
em outras áreas, como, por exemplo, bens industriais, item em que
a oferta liberalizante do Brasil, entre outros países em desenvolvimento, é assumidamente tímida;
2) Os europeus estão jogando a
isca para os países mais pobres, ao
propagandear, sempre, sua proposta de dar acesso livre aos produtos dos 54 países chamados
LDCs (Least Developed Countries, os pobres entre os pobres).
Além disso, Lamy e Fischler
uma e outra vez chamaram a
atenção para o fato de que 70%
das barreiras tarifárias são impostas por países em desenvolvimento para exportações de outros países em desenvolvimento.
Ou, posto de outra forma, seria
uma falsa questão retratar Cancún como uma batalha entre o
Norte rico e o Sul pobre.
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