|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Disparada no preço dos alimentos corrói a renda
Custo da cesta básica tem forte salto por causa da alta de produtos como carne
Ganho do salário mínimo em relação à cesta básica, trunfo eleitoral de Lula, recua em 16 capitais do país, aponta pesquisa do Dieese
TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL
O forte aumento no preço
dos alimentos, que já configura
um "choque de oferta" para
produtos como leite, carne e
trigo e seus derivados, leva a
uma corrosão no poder de compra dos trabalhadores, sobretudo os de menor renda.
Pesquisa do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos) mostra alta de 3,24% no
preço da cesta básica de julho
para agosto em São Paulo. Não
há uma cesta nacional. O maior
aumento aconteceu em Natal,
cidade em que subiu 9,62% no
período. Em Belo Horizonte, o
aumento foi de 8,14%, em Salvador, de 6,56%. Já o IPCA (índice de inflação oficial) em julho ficou em 0,24%.
Neste ano, a elevação nos
preços dos alimentos acontece
por conta de uma conjuntura
de fatores negativos de abrangência internacional: quebra na
produção de trigo na Argentina
e no Canadá, redução nas exportações de leite e laticínios
na Oceania, além de uma seca
maior do que a esperada que reduziu áreas de pastagem no
Nordeste. E ainda um aumento
no consumo de alimentos no
Brasil e outros emergentes, como a China, que sustenta o
mais recente ciclo de alta das
commodities em geral.
No Brasil, as conseqüências
foram os aumentos de 56,54%
no leite longa vida e de 32,42%
nos laticínios em geral neste
ano, segundo a FGV (Fundação
Getulio Vargas). No mesmo levantamento, a carne bovina teve elevação de 3,76% -sendo
2,93% só em agosto devido a
adiantamento do impacto da
entressafra bovina, que só deveria pesar no fim de setembro.
No caso dos alimentos, os aumentos ocorrem em efeito cascata. Quando a carne bovina sobe, puxa os preços avícolas, que
são proteínas de substituição
das carnes. Neste ano, os ovos
subiram 20,07%, e o frango inteiro, 6,4%, segundo a FGV.
Para o professor da FEA-USP
Heron do Carmo, especialista
em inflação, o país assiste a
uma recuperação dos preços
dos alimentos, que até o ano
passado seguraram a inflação.
Ele lembra que o preço baixo
do leite e da carne até 2006 levou os pecuaristas a se desfazerem das chamadas matrizes,
que hoje produzem menor
quantidade de leite e carne e
sustentam a alta nos preços.
Pelo mesmo motivo, Carmo
prevê uma inversão no preço
dos alimentos por conta de um
provável aumento na produção
em 2008. "Os preços altos levarão a uma maior produção no
próximo ano, que deve derrubar os preços dos atuais patamares. O mercado sozinho se
equilibra", disse Carmo.
Devido à inflação dos alimentos, o Dieese afirma que o salário mínimo deveria ser de R$
1.733,88 -2,69% maior do que
em julho- para cobrir o que
considera "determinação constitucional" de que o mínimo deveria ser suficiente para alimentação, moradia, saúde,
educação, vestuário, transporte, lazer e previdência.
Salário
Pela primeira vez no ano, o
preço da cesta básica em 16 capitais brasileiras subiu em ritmo anual maior do que o último aumento do salário mínimo, de 8,57%, ocorrido em
abril. Em 12 meses, a cesta básica do Dieese acumula uma alta
de 23,85% em Natal; de 20,19%
em Porto Alegre; de 17,34% no
Rio; e de 13,81% em São Paulo,
entre outras capitais.
Vale lembrar que, no ano
passado, o mínimo teve um aumento nominal de 16,6%.
Para economistas e sindicalistas, a corrosão do poder de
compra de alimentos e de itens
básicos levará os trabalhadores
a pedirem aumentos salariais
acima da inflação. Coloca ainda
em xeque a nova política de
reajuste do salário mínimo, que
além da inflação leva em conta
o crescimento do PIB.
"[O aumento da cesta básica]
é uma notícia ruim para os trabalhadores, principalmente os
mais pobres e os menos organizados. Nas reivindicações, esse
dado terá que ser levado em
conta. Além de repor o poder de
compra, vamos pedir diminuição de impostos para os itens
da cesta básica", disse João
Carlos Gonçalves, conhecido
como Juruna, secretário-geral
da Força Sindical.
"Vamos cobrar aumento real
acima da inflação pelo IPCA
[índice utilizado no reajuste]
para cobrir a alta da cesta básica e dos alimentos", disse Rafael Marques, secretário-geral
do Sindicato dos Metalúrgicos
do ABC (filiado à CUT).
O poder de compra crescente
do salário mínimo em relação a
cesta básica desde 2003 é visto
como trunfo político do governo Lula.
Copom
No mercado financeiro, o recente aumento no preço dos
alimentos também preocupa,
apesar de não ser visto com potencial para estourar a meta de
inflação, hoje em 4,5%. No ano,
o IPCA soma inflação de 3,69%
e, em 12 meses, de 3,74%.
"É preocupante o aumento
da cesta básica, que afeta as
pessoas de menor faixa de renda, que estão na base de apoio
do presidente Lula. Nos anos
anteriores, foi sempre o contrário: o mínimo subia acima da
inflação", disse Elson Teles,
economista-chefe da corretora
Concórdia.
Por conta do que chama de
"choque de oferta" dos alimentos, o economista prevê hoje
uma redução no ritmo de corte
dos juros básicos brasileiros, de
0,5 ponto para 0,25 ponto percentual, para 11,25% ao ano, segundo espera a maioria dos
economistas do mercado financeiro brasileiro.
Texto Anterior: Mercado Aberto Próximo Texto: Para Mantega, alta é apenas "sinal amarelo" para inflação Índice
|