São Paulo, domingo, 05 de outubro de 2008

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"Investimentos rentáveis atrairão capital"

Para presidente do BNDES, com queda dos juros nos países ricos, capital buscará alternativas rentáveis no Brasil

Luciano Coutinho diz que fontes de capital no mundo ainda são abundantes apesar da secura atual na concessão de crédito

SÉRGIO MALBERGIER
EDITOR DE DINHEIRO

VALDO CRUZ
EM SÃO PAULO

Encarregado pelo presidente Lula de manter o ritmo de investimentos no país em tempos de secura no crédito externo, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, diz que o banco de fomento pode precisar de R$ 40 bilhões adicionais em 2009 para atender aos pedidos extras de empresas brasileiras diante do bloqueio nas fontes de financiamentos por causa da crise financeira global. Segundo ele, o BNDES já tem garantidos R$ 70 bilhões. Com os recursos extras, teria até R$ 110 bilhões disponíveis em 2009. Para este ano, o banco prevê desembolsos de até R$ 90 bilhões. Coutinho espera captar os recursos de organismos multilaterais e do Tesouro. O aporte seria um "colchão" a ser usado caso o mercado não se recupere rapidamente. "Obviamente espero que não seja necessário tudo isso, seria um colchão, e também parte disso pode ficar para 2010", disse Coutinho em entrevista à Folha, na qual afirmou estar "rezando" para que os bancos voltem a abrir linhas de crédito e que o BNDES avança no setor por uma questão conjuntural. "Não há um desejo de aumentar o tamanho do BNDES." Interlocutor freqüente de Lula em assuntos econômicos, Coutinho não acredita que o dólar se sustente no atual patamar e diz que o cenário agora é "diametralmente oposto" ao do início do ano, que levou o Banco Central a elevar os juros. "As preocupações com a inflação devem ser relativizadas nesses momentos [de esfriamento da economia global]", afirmou, acrescentando que esse cenário deve ser "levado em conta" por todos, inclusive pelo BC. O presidente do BNDES rebate as críticas de que o governo estaria pisando no acelerador num momento em que deveria ser mais prudente. "Ninguém está pensando em pisar no acelerador", diz, mas também "não é porque o mundo pisou no freio que temos de fazê-lo também." Ele defende crescimento com "sensatez e prudência", que mantenha a liderança dos investimentos e modere a expansão do consumo e dos gastos do governo. Disse ainda que o Brasil é um dos melhores países para investir neste momento de crise nas economias centrais e que fundos soberanos asiáticos já estão visitando o país em busca de oportunidades. A seguir, trechos da entrevista concedida na sexta no escritório do banco de fomento no Itaim, na zona sul de São Paulo.

 

FOLHA - Como essa crise vai, de fato, afetar o Brasil?
LUCIANO COUTINHO - O Brasil tem condições excepcionais de atravessar essa crise com efeitos muito moderados sobre o crescimento da sua economia. Nossos fundamentos macroeconômicos são firmes, temos um mercado doméstico com potencial de crescimento, um sistema bancário extremamente saudável, capitalizado, que pode expandir o crédito. Existe ainda uma avenida para a expansão do crédito no Brasil, que tem sido feita com velocidade, sem deterioração de qualidade, considerando que a relação crédito/PIB no Brasil ainda é baixa. Além disso, o país tem uma fronteira de investimentos em infra-estrutura de alto retorno e baixo risco inegáveis, haja vista que, nesta semana [passada], na crise, foram realizados com sucesso leilões de energia.

FOLHA - Mas vamos sofrer impactos dessa crise no crescimento.
COUTINHO - Temos de discutir, por exemplo, até que ponto os efeitos da crise se farão sentir sobre as commodities. O desempenho delas dependerá do que acontecerá na Ásia e na China, que na nossa expectativa ainda manterão um crescimento elevado, embora inferior ao observado nos últimos três anos, mas suficiente para estabelecer um piso para os preços das commodities. Certamente será bem inferior ao observado no primeiro semestre deste ano, mas superior ao da média de 2006. Existe uma situação estrutural de estoques baixos de commodities na grande maioria dos casos, que precisam ser recuperados.

FOLHA - Mas essa secura aguda no crédito não pode atrapalhar os planos de investimentos no país, principalmente na infra-estrutura?
COUTINHO - Primeiro, a secura do crédito tem afetado o Brasil nas operações de comércio exterior e de alguma maneira no interbancário em relação aos bancos pequenos. O BC está se movendo para aliviar esses focos de secura, providenciando de uma maneira cautelosa, mas eficaz, condições para que esse processo não se transmita para a economia brasileira. Segundo, a questão dos investimentos é de outra natureza, depende de linhas de crédito de longo prazo e da disposição em investir. Não antevejo um cenário em que o capital fique escasso. O crédito, sim, pode estar escasso, mas as fontes de capital no mundo são e continuarão abundantes. Com a provável queda das taxas de juros no mundo inteiro, especialmente nas economias desenvolvidas, os capitais buscarão alternativas rentáveis de investimento, e o Brasil oferece exatamente uma das grandes fronteiras de investimento com taxas de retornos atrativas e com risco relativamente baixo.

FOLHA - O cronograma do BNDES de obras do PAC não será afetado?
COUTINHO - Até o momento, o ritmo de crescimento das consultas e dos enquadramentos no BNDES se mantém firme, incluindo até setembro. As consultas têm crescido 40% ao ano, com muita coisa em infra-estrutura. O BNDES dispõe de um estoque de projetos enquadrados que ascende a R$ 150 bilhões, temos estoques de projetos aprovados de R$ 112 bilhões. Se acontecer uma moderação, o que é possível, não me parece que será significativa.


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