São Paulo, domingo, 05 de novembro de 2006

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YOSHIAKI NAKANO

Patologias da economia brasileira


O setor público é menos eficiente do que o privado e apropria muito mais da metade da riqueza do país


NOS ÚLTIMOS cinco anos, os países emergentes cresceram, em média, quase 7% ao ano, e o FMI (Fundo Monetário Internacional) projeta, para os próximos cinco anos, crescimento de 6,8% ao ano. Nesse mesmo período, o Brasil cresceu apenas 2,2% ao ano. O Brasil só não ficou na lanterninha porque o Haiti, em guerra civil, cresceu menos.
O que podemos projetar para o Brasil, uma vez definida a reeleição de Lula? Mantida a atual política, a única projeção segura é a de que repetiremos a performance dos últimos cinco anos. Mas, dado que a conjuntura internacional é ainda muito favorável, talvez possamos crescer, em média, 3% ao ano.
Quais as explicações para uma performance tão medíocre? Uma boa forma de iniciar uma reflexão a respeito é procurar listar, objetivamente, quais os parâmetros da nossa economia que são anormais, por que são disparatados quando comparados aos demais países e quais os componentes do sistema econômico-financeiro que são anomalias do ponto de vista funcional. É o que faço a seguir, sem procurar estabelecer qualquer causalidade ou hierarquia, repetindo o que todos sabem, mas poucos refletem.
Para um país grande, com população de 187 milhões de habitantes e PIB per capita de cerca de US$ 4.300, o tamanho do Estado é anormal e grande. O dispêndio público em 2005 atingiu quase 45% do PIB, sem incluir as empresas estatais. O setor público brasileiro é certamente muito menos eficiente do que o privado e apropria muito mais da metade de toda a riqueza produzida pelo país.
A desigualdade na distribuição de renda medida pelo índice de Gini classifica o Brasil entre os piores do mundo. O relatório "Human Development Indicators 2005", numa amostra de 177 países, aponta que ganhamos apenas de seis nações: República Centro-Africana, Serra Leoa, Botsuana, Guatemala, Lesoto e Suazilândia!
A taxa real de juros é a mais alta do mundo. Na última década, tem ficado acima de 10% ao ano, comparada à taxa real em geral de 1,5% a 3,5% ao ano nos demais países.
O Brasil é, provavelmente, o único país do mundo com inflação controlada que emite títulos da dívida pública (que deveriam ser absorvidos pelo mercado de capitais de longo prazo) remunerados pela taxa de juros diária que remunera sobras de caixa dos bancos (taxa Selic) e absorve cerca de dois terços do volume total de crédito ofertado pelo sistema bancário.
O brasileiro confia muito pouco nos demais. Num estudo comparativo de 50 países, o índice de confiança do Brasil foi o pior. O Brasil é o país da lei de Gérson. Toleramos o mensalão, os sanguessugas e compras de dossiês. Sem confiança, os princípios éticos não vingam, algumas leis pegam, outras não, e o mercado é desorganizado pela informalidade.
Não é preciso continuar com a lista, pois não somos masoquistas. Muitos estão satisfeitos com a situação. Afinal, por que não usufruir de forma esquizofrênica do nosso índice de Gini e viver como se estivéssemos no Primeiro Mundo? Somos masoquistas ou esquizofrênicos?


YOSHIAKI NAKANO , 62, diretor da Escola de Economia de São Paulo da FGV, foi secretário da Fazenda do Estado de São Paulo no governo Mario Covas (1995-2001).


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