São Paulo, domingo, 05 de novembro de 2006

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Governo estuda aposentadoria com idade mínima

Especialista sugere 60 anos (homem) e 55 (mulher) para benefício por tempo de contribuição; ministro quer debate

Em 2030, país deverá ter o dobro dos idosos de hoje, segundo o Ipea, fato que deverá pressionar ainda mais as despesas do INSS

ELLEN NOGUEIRA
DO "AGORA", ENVIADA ESPECIAL A BRASÍLIA

As contas não fecham. A Previdência Social deve terminar o ano com rombo de R$ 41 bilhões. Segundo especialistas, é preciso adotar mudanças urgentes para que os empregados que entram hoje no mercado de trabalho possam ter, no futuro, a garantia de uma aposentadoria digna.
E a principal mudança (a idade mínima para se aposentar) começará a ser discutida em 2007 e tem o aval do governo, segundo o ministro da Previdência, Nelson Machado.
"Imagino que a discussão vá se aprofundar em 2007 e acho que teremos de discutir uma coisa ou outra: se for para eliminar o fator previdenciário, é preciso impor a idade mínima [para as aposentadorias por tempo de contribuição]."
O fator previdenciário, muito criticado e alvo de modificações em projetos no Congresso, começou a ser aplicado em dezembro de 1999. Ele funciona como um redutor (0,5% ao mês), com base na expectativa de vida do trabalhador. Ele foi aplicado por cinco anos, de forma que, em novembro de 2004, seus efeitos se tornaram plenos, reduzindo os benefícios em pelo menos 30%.
Quanto mais cedo se aposenta, menor é o benefício do trabalhador. Só que, mesmo assim, segundo o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), o brasileiro ainda se aposenta cedo: média de 52 anos no caso das mulheres e de 57 anos para os homens.
"Como estamos vivendo mais, até acho natural que se discuta qual é a idade em que se possa efetivamente entrar em gozo da aposentadoria", afirma Machado.
Para Fábio Giambiagi, economista do Ipea e autor do livro "Reforma da Previdência" (Editora Campus/Elsevier), a idade mínima para se aposentar por tempo de contribuição deve ser de 55 anos para as mulheres e 60 para os homens. "Há países europeus que adotaram 65 anos para ambos."
Com a evolução da expectativa de vida do trabalhador brasileiro, a idade mínima aumentaria. Hoje, para se aposentar por idade, é preciso ter 65 anos (homens) e 60 anos (mulheres).
Mas o que preocupa é que, segundo o Ipea, a população com mais de 60 anos em 2030 deve ser o dobro da atual. Significa dizer que, dentro de 24 anos, 17% da população brasileira será de idosos (hoje, está em 8,9%). Ou seja, além da maior expectativa de vida de seus segurados, o INSS terá de pagar benefícios para mais aposentados e por mais tempo.
"As coisas mais importantes neste momento são a ampliação da gestão, a inclusão previdenciária e o crescimento econômico. Tem também, em algum momento, a discussão da idade. Para mim não é tabu. O tema precisa ser bem discutido", diz o ministro.

Como é hoje
Para se aposentar por tempo de contribuição, basta contribuir para o INSS por 35 anos (homens) e por 30 anos (mulheres). Os professores contribuem por 30 anos; as professoras, por 25 anos. Hoje, não há idade mínima.
Como o brasileiro começa a trabalhar cedo, ele também se aposenta cedo. O problema é o tempo de pagamento do benefício. A mulher que se aposenta com 52 anos de idade tem expectativa de vida de mais 28,6 anos, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Já o homem que se aposenta com 57 anos deve viver mais 21,2 anos. É por todo esse tempo que o INSS deve pagar benefícios, e o sistema não está preparado para isso.

Idades iguais
Outra mudança na aposentadoria que deveria ser adotada, segundo especialistas, é o fim da diferença de idade entre homens e mulheres.
"Aos poucos, essa diferença de cinco anos adotada hoje deve ir diminuindo", afirma o advogado Wladimir Novaes Martinez, especialista em legislação previdenciária.
A diferença se explica porque a mulher, além do trabalho, teria os afazeres domésticos. Mas, com a vida moderna e a melhor divisão de tarefas da casa entre mulher e homem, as coisas mudaram um pouco. "Por isso, é preciso diminuir essa diferença de idade aos poucos." Martinez diz que um período de 15 anos, por exemplo, seria razoável -a cada três a diferença cairia um ano.
Outra sugestão de Martinez é criar um seguro-desemprego mais longo para os trabalhadores com mais de 45 anos. "É muito difícil voltar ao mercado com essa idade. Muitos optam pela aposentadoria para ter renda fixa. Se houvesse um seguro-desemprego mais longo, o trabalhador teria mais tranqüilidade para procurar emprego."
O especialista em finanças públicas Raul Velloso diz que a idade mínima deve ser uma medida urgente. Para ele, outro item que deveria ser revisto é a fórmula para calcular a aposentadoria. "O benefício hoje é alto em relação à contribuição, pois é preciso considerar também as pensões e os auxílios."
Adriano Biava, professor do Departamento de Economia da FEA/USP, diz que tudo deve ser bem discutido. "O governo deve ouvir trabalhadores, patrões e especialistas antes de adotar qualquer medida."

Mínimo influencia
O déficit da Previdência é muito influenciado pelo valor do salário mínimo, já que, dos 24,3 milhões de benefícios pagos no país, 16,4 milhões (67,4%) valem até R$ 350.
Economistas são unânimes em dizer que as aposentadorias não deveriam ser indexadas ao mínimo. Segundo Velloso, se fosse apenas aplicada a inflação para o reajuste dos benefícios, de 1999 até 2006 a economia seria de R$ 17 bilhões.


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