São Paulo, terça-feira, 06 de janeiro de 2009

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BENJAMIN STEINBRUCH

Incentivo escondido, não!


O incentivo a investimentos em energia não pode estar escondido no preço da gasolina, pro exemplo

UM DOS retratos mais impressionantes da atual crise econômica mundial é o gráfico que mostra a queda do preço do petróleo. Oito anos atrás, um barril custava cerca de US$ 31. Em fins de 2001, esse preço caiu para perto de US$ 15 e a partir daí entrou em alta quase contínua até chegar ao pico de US$ 147, em julho do ano passado.
O preço da mais importante commodity do mundo moderno levou, portanto, oito anos para sair de US$ 31 o barril e atingir US$ 147. Esse longo caminho de alta foi quase todo feito de volta em menos de seis meses, quando o petróleo caiu para US$ 35 em dezembro passado. Na última sexta-feira, por conta do conflito na Faixa de Gaza, a cotação subiu para US$ 46, nível ainda 69% abaixo do pico.
Muitos consumidores, naturalmente, ficaram felizes com a baixa do petróleo. Nos EUA, por exemplo, o preço do galão (3,78 litros) de gasolina, que havia chegado a US$ 4,11 em julho, caiu para US$ 1,66 no fim do ano passado, o equivalente a pouco mais de R$ 1 o litro. No Brasil, a Petrobras pratica uma política de estabilização que impede tanto altas quanto baixas significativas de preços de combustíveis. É difícil entender como a gasolina pode custar o mesmo preço com o petróleo a US$ 147 ou a US$ 35.
Discutir o preço da gasolina, porém, não é o objetivo deste artigo. A ideia é alertar para o forte desestímulo que essa baixa vai trazer, se persistir, aos investimentos na produção de energia. Segundo o "Financial Times", as únicas produções de petróleo que continuavam economicamente viáveis em dezembro eram as do Oriente Médio e as da Venezuela, cujos custos situam-se abaixo de US$ 30 o barril.
No Brasil, o petróleo barato levanta dúvidas sobre a viabilidade de investimentos no setor petrolífero e também no de energias renováveis, como os biocombustíveis -as fontes hidrelétricas, dependendo do projeto, continuam viáveis. Pelos dados do "Financial Times", a exploração das reservas brasileiras de petróleo em águas profundas, na área do pré-sal, só se torna viável com o petróleo acima de US$ 60. O álcool brasileiro, feito a partir da cana-de-açúcar, perde a viabilidade quando o petróleo fica abaixo de US$ 45.
Outras fontes alternativas de energia são ainda muito menos competitivas. O álcool americano, à base de milho, viabiliza-se apenas com o petróleo a US$ 65, e o biodiesel europeu, a US$ 82. Fontes de energia elétrica renováveis como as eólicas têm custo de produção, em barris-equivalentes, a US$ 75 (em terra) ou US$ 145 (no mar).
A crise econômica, portanto, pode ser uma ducha de água fria na nova indústria de energia alternativa, como a de biocombustíveis brasileiros, que ganhou impulso durante os tempos de petróleo caro.
Com a possível recessão mundial, durante algum tempo não se ouvirá falar em falta de energia. Mas é preciso pensar nos possíveis problemas no médio e no longo prazo. Quando começar a retomada do crescimento, haverá a necessidade de mais petróleo, mais energia elétrica e mais biocombustíveis.
Enquanto o preço do petróleo permanecer no nível atual, investimentos na indústria da energia só poderão continuar mediante incentivos governamentais. Nada contra, por se tratar de área estratégica, mas desde que os benefícios sejam explicitados, para que a sociedade saiba o que e quanto está pagando. O incentivo não pode estar escondido no preço da gasolina, por exemplo.

BENJAMIN STEINBRUCH, 55, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br



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