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Política econômica, o verdadeiro escândalo
ALOYSIO BIONDI
Houve muito foguetório
pró-Real, no ano passado,
quando o mundo se curvou
mais uma vez diante do governo FHC, e a Bolsa de Mercadorias & Futuros de São Paulo,
negociando dezenas de bilhões
de reais, colocou-se entre as três
maiores do mundo. Chegou até
a ser a segunda do mundo, em
determinados tipos de negócios,
logo depois da Bolsa de Chicago.
Japão, Londres, Nova York?
Tudo isso é fichinha, diante do
Brasil do Real, entoavam alegremente os "moderninhos".
Entusiasmo leviano. Manda a
experiência -e manda a honestidade intelectual- que
qualquer analista desconfie,
sempre, do crescimento "explosivo", dos recordes, em qualquer setor da economia -ou
mesmo de qualquer grupo empresarial. Crescimento explosivo nem sempre, ou quase nunca, é produto de "eficiência".
Mas de "outras coisas".
Na época, esta coluna fez o
alerta: a expansão vertiginosa
da BM&F se explica pela excessiva facilidade (falta de exigências de garantias) para os especuladores realizarem suas jogadas. Situação que, sempre, desemboca em quebradeiras e crises, cujo preço é pago pelos contribuintes (porque o governo
acaba "socorrendo" os especuladores/bancos). Distorção que,
como sempre, ainda existe por
causa da conivência do Ministério da Fazenda e do Banco
Central com as estrepolias de
certos segmentos do mercado financeiro.
Agora, meses depois, com o
escândalo dos "precatórios",
fica-se sabendo que a BM&F
era usada para operações "falsas", de centenas de milhões de
reais, para "lavar dinheiro" e
sonegar impostos, além de desviar milhões de reais de Estados
e prefeituras.
Nessas operações falsas, de
centenas de milhões de reais cada uma, repita-se, uma empresa ou instituição comprava um
lote de títulos governamentais
por, digamos, R$ 100, e vendia
no final do dia por R$ 80, para
"inventar" um prejuízo de R$
20. Qual a vantagem da operação? Na verdade, a empresa
"compradora" era apenas um
"laranja", ou "testa de ferro", que mais tarde entregava
o dinheiro resultante do lucro
(de R$ 20, ou 20%) por baixo do
pano, de volta à "vendedora"
ou mesmo a seus administradores.
Essas operações vieram à tona
com o "caso dos precatórios".
Para a opinião pública, uma
novidade. Mas, na verdade, elas
são uma rotina. Têm até nome
(em inglês, óbvio): "day trade". A equipe FHC, tão enfronhada nos meandros do mercado financeiro, obviamente sabia da sua existência. Ministério da Fazenda e Banco Central
nada fizeram para coibi-las.
Nenhuma surpresa, também. A
conivência dos governantes
brasileiros com as aberrações de
setores do mercado financeiro é
a rotina. Não há "escândalos"
de tempos em tempos. A política
econômica tem sido um escândalo.
Banqueiros
Os banqueiros sérios deste
país não apenas têm sua imagem enxovalhada, como frequentemente têm seus negócios
afetados por concorrentes que
crescem graças a práticas vergonhosas. Chegará um dia em
que eles, banqueiros sérios, se
convencerão de que têm o direito de romper o silêncio, e
exigir que o Banco Central e o
Ministério da Fazenda impeçam patifarias. Que o governo
deixe de ser conivente com
fraudes e seus autores.
Pobrezinhos
O presidente FHC prometeu,
de novo, apoio aos pequenos e
médios agricultores. Na reunião de janeiro, o Conselho
Monetário Nacional (hoje formado apenas pelo trio Malan,
Loyola e Kandir) desmentiu, de
novo, essa intenção. Até então,
os bancos podiam emprestar,
no máximo R$ 150 mil, por
produtor, para ele guardar sua
colheita (empréstimo para disciplinar a comercialização).
Objetivo do limite: distribuir o
crédito, pulverizá-lo, entre o
maior número de agricultores
possível (um pouco para cada).
O CMN eliminou o limite. Obviamente, os bancos vão fazer
grandes empréstimos aos grandes produtores. Para os pequenos, nada.
Renda
A melhora na distribuição da
renda trazida pelo Real se deveu à queda de inflação. Fenômeno totalmente passageiro. A
política econômica de favorecimento aos grandes grupos, inclusive na agricultura, continua a ser a verdadeira causa
da vergonhosa persistência da
miséria no Brasil e surgimento
de cidadãos brasileiros na lista
dos maiores "bilionários" do
mundo.
Aloysio Biondi, 60, é jornalista econômico.
Foi editor de Economia da Folha e diretor de
Redação da revista ``Visão''. Escreve às quintas-feiras no caderno Dinheiro.
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