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OPINIÃO ECONÔMICA
Carga tributária: 44% do PIB
MARCOS CINTRA
Entender a confusa legislação tributária no Brasil é tarefa difícil até para os mais experientes tributaristas. Para o contribuinte é um fator de risco considerável, já que qualquer falha de
interpretação pode significar indício de fraude para o fisco, expondo-o a severas punições.
A tragicomédia tributária no
Brasil teve mais um ato encenado
na última semana. Foi noticiado
que nem técnicos e fiscais da Secretaria da Receita Federal conseguem entender um tributo que
nos últimos anos se tornou emblemático da esculhambação tributária que reina no país. Trata-se
da Cofins, que virou uma colcha
de retalhos após as inúmeras alterações a que foi submetida. A confusão é tanta que a Receita resolveu organizar cursos de treinamento para informar seus quadros de fiscalização, já que não estão conseguindo destrinchar a
complexidade da legislação aplicável àquele tributo.
A burocracia tributária no Brasil é uma praga cada vez mais resistente. A produção de normas
não cessa e torna a vida do contribuinte um inferno. Isso fica evidente em um levantamento do
IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário) mostrando que desde a promulgação da
Constituição, em 1988, até 2004
foram editadas quase 220 mil normas tributárias no país. Isso equivale a 55 novas regras por dia útil.
É uma proliferação insana de leis,
decretos, medidas provisórias,
emendas, normas complementares, entre outros instrumentos jurídicos, que acabam impondo pesados custos aos contribuintes, sobretudo para as empresas. Se já
não bastasse a opressão fiscal que
extrai quase 40% da renda do setor produtivo, há ainda uma série
de gastos adicionais para atender
às imposições acessórias do fisco.
Há estimativas de que esses "custos de conformidade", como a literatura especializada vem chamando esses encargos impostos
aos contribuintes, possam chegar
a 0,75% do PIB (tomando por base pesquisas feitas com a média
das empresas abertas brasileiras).
Mas podem atingir o equivalente
a 5,82% do PIB, tomando por base o custo de conformidade das
companhias abertas com receita
bruta anual de até R$ 100 milhões, classe que inclui a ampla
maioria das empresas brasileiras.
A absurda complexidade e o alto custo dos impostos estão entre
os principais entraves ao desenvolvimento. Infelizmente, o tema
não é debatido, como deveria,
principalmente em ano eleitoral,
quando posições claras deveriam
ser assumidas pelos candidatos.
O governo detectou a inquietação do contribuinte e vem implementando medidas pontuais que
desoneram alguns setores produtivos e estratos de renda. Vale citar que as medidas são positivas
em termos do alívio que proporciona ao contribuinte, porém são
paliativas e não vão fundo na
busca de solução para problemas
tributários crônicos, tais como a
evasão, a sonegação, a economia
informal, a iniqüidade e a complexidade do sistema.
A estrutura tributária como um
todo é ruim, mas há tributos que
são símbolos do caos que prevalece no país. O PIS e a Cofins são
contribuições cuja proliferação de
normas e procedimentos regulatórios tem sido calamitosa desde
quando os críticos da cumulatividade impuseram a tese de que a
solução seria cobrá-las sobre o valor agregado. Com isso a alíquota
de ambas mais que dobrou, e o
peso das duas contribuições na
arrecadação tem sido maior.
A mudança na sistemática de
cobrança das duas contribuições
pode ser classificada como um
dos casos mais patéticos da história tributária do país. Setores que
reivindicavam a forma não-cumulativa mudaram de idéia poucos meses depois de sua implementação e pediram para voltar
ao sistema anterior, cumulativo,
sendo atendidos. Passou a vigorar
um sistema híbrido, como, aliás,
ocorre com outros tributos tidos
como não-cumulativos. Foi criado um monstro disforme, e o presidente Lula chegou a dizer que a
não-cumulatividade foi um erro.
Nem os profissionais da Receita
Federal entendem a Cofins. Desde
que foi alterada sua forma de cobrança por meio da lei 10.833/03,
o que se viu foi uma quantidade
absurda de alterações legislativas.
Em seu primeiro ano, o número
de leis, medidas provisórias, decretos, instruções normativas,
normas de execução, atos declaratórios e interpretativos e portarias tratando da Cofins chegaram
a quase 90. Durante 2005 e o início deste ano, foram mais 57 mudanças. Ou seja, em apenas dois
anos, foram quase 150 alterações.
A balbúrdia criada pelas mudanças no PIS/Cofins teve só um
ganhador: o governo federal, que
segue arrecadando como nunca.
Em 2002, quando ambos os tributos eram cumulativos, eles representaram 26,8% da arrecadação federal. Em 2003, primeiro
ano do PIS não-cumulativo, a
participação deles saltou para
28% e em 2005 ultrapassou 30%.
A CNI criticou recentemente as
freqüentes mudanças na legislação do PIS/Cofins e defende a revisão de suas alíquotas. E assim,
de regra em regra, geram-se mudanças pontuais que contribuem
para criar situações hilariantes,
como a dificuldade dos próprios
fiscais em entender a Cofins.
Nessa batida burocrática e de
opressão fiscal, o recolhimento de
impostos em 2005 bateu em 38%,
que, somado aos 5,82% exigidos
das empresas como desembolso
para que elas cumpram a lei, revela que, a rigor, a carga tributária brasileira é de 44%.
Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque, 59, doutor pela Universidade
Harvard, professor titular e vice-presidente da FGV, foi deputado federal
(1999-2003). Atualmente é secretário
das Finanças de São Bernardo do Campo. É autor de "A verdade sobre o Imposto Único" (LCTE, 2003). Escreve às segundas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.
Internet: www.marcoscintra.org
E-mail -
mcintra@marcoscintra.org
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