São Paulo, quinta-feira, 06 de junho de 2002

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FINANÇAS

BC faz grande troca de títulos para tentar segurar a turbulência que arrasta fundos e pressiona dólar e risco-país

Para conter a crise, BC cede ao mercado

LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL

O Banco Central demonstrou ontem que não quer mais enfrentar o mercado para forçar as instituições financeiras a comprar títulos públicos. De um lado, o BC desistiu de remunerar o capital excedente dos bancos a taxas punitivas. De outro, reduziu em até três anos o prazo dos papéis da dívida do governo, para facilitar a aceitação dos títulos pelo mercado.
O recuo do BC veio logo após uma série de eventos negativos para a economia, acompanhados de fortes críticas à atuação da instituição. Ao tentar, sem sucesso, introduzir novo instrumento (o "swap" cambial) de refinanciamento da dívida interna em dólar, o BC contribuiu para provocar elevadas depreciações nos preços dos papéis do governo federal.
Como consequência da queda dos títulos, os fundos de investimento tiveram grandes perdas (até agora estimadas em mais de R$ 4 bilhões), e as instituições financeiras passaram a evitar comprar papéis públicos.
A autoridade monetária (o BC), então, tentou forçar os bancos a voltar a investir nesses títulos (fundamentais para a rolagem da dívida interna, atualmente em mais de R$ 630 bilhões). Além de o BC não obter o efeito desejado, as instituições financeiras partiram para a compra de dólares, o que explica em grande a parte a recente valorização da moeda americana, que ontem fechou cotada a R$ 2,609 -alta de 0,46% em relação ao dia anterior.

Risco Brasil
O nervosismo do mercado refletiu-se também no risco Brasil -medida de desconfiança dos investidores em relação à capacidade do país de pagar suas dívidas-, que ontem chegou a 1.127 pontos (o equivalente a 11,27 pontos percentuais de juros acima do que pagam os títulos do Tesouro dos EUA).
Na segunda e na terça-feira, o BC ofereceu apenas 10% ao ano de remuneração sobre o dinheiro dos bancos recolhido diariamente à autoridade monetária em empréstimos de um dia para o outro ("overnight"). Em períodos de normalidade no mercado, o BC remunera esse dinheiro a taxas bem próximas da meta dos juros básicos da economia (a taxa Selic, atualmente em 18,5%).
A lógica da operação era influenciar os bancos com excesso de dinheiro a comprar títulos, que costumam render juros mais altos do que a meta da Selic. Ao perceber que sua tática não funcionava, o BC resolveu aumentar ontem a remuneração do dinheiro excedente dos bancos para 15%.
Outra preocupação dos bancos era com o prazo dos papéis. O BC queria alongar o perfil da dívida (ou não encurtá-lo), vendendo títulos que venciam além de 2004.
Para acalmar os ânimos do mercado ontem, o BC fez uma troca maciça de títulos públicos que vencem de 2004 a 2006 por papéis com resgate no início de 2003, como queriam as instituições financeiras.
O volume total movimentado somente pelos leilões de troca de LFTs-títulos corrigidos pelos juros pós-fixados-foi de R$ 10,9 bilhões. O número surpreendeu o mercado, que esperava um volume de, no máximo, R$ 6 bilhões.
A atitude do BC foi interpretada como uma decisão de ceder, em parte, às pressões do mercado e de tentar acalmar os investidores, evitando sangria maior de recursos nos fundos. Entre quarta-feira da semana passada e a última terça-feira, os saques em fundos DI (pós-fixados) e de renda fixa já superam os depósitos em, aproximadamente, R$ 4,3 bilhões.



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