São Paulo, domingo, 06 de junho de 2004

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TRIBUTOS

Na maioria dos casos, entidade não repassou à Previdência descontos feitos dos funcionários; valores somam R$ 65,1 milhões

Mais de 300 sindicatos têm dívida com o INSS

CLAUDIA ROLLI
FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL

Trezentos e quatro sindicatos devem à Previdência Social R$ 65,1 milhões, segundo lista de devedores do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) atualizada até setembro do ano passado.
As dívidas dos dez primeiros sindicatos do ranking somam R$ 33,8 milhões -o que representa 52% do total. O débito, na maior parte dos casos, refere-se à contribuição do empregador -nesse caso, os sindicatos- não repassada à Previdência Social. A dívida que o INSS tinha a receber de todos os seus devedores era de R$ 55,1 bilhões em setembro de 2003.
O desconto referente à contribuição foi feito no contracheque dos funcionários dos sindicatos. A Folha apurou que, em alguns casos, esse desconto foi repassado ao INSS. Em outros casos, não.
Por lei, a contribuição dos empregadores é de 20%. A contribuição do trabalhador varia de 7,65% a 11%, conforme a faixa salarial.
Dos 304 sindicatos devedores, 79% representam trabalhadores e profissionais liberais. Entre os 57 sindicatos patronais, 85% representam produtores rurais. A lista de sindicatos devedores consta no site do INSS (www.previdencia.gov.br/devedores/).
A Previdência confirmou à Folha que os dez maiores devedores que constam na lista atualizada até setembro de 2003 também estarão na próxima listagem, que deverá ser divulgada em 30 dias.
Os sindicatos que ocupam as cinco primeiras posições no ranking de devedores são: o de vigias portuários do Rio, o de eletricitários do Rio, o de arrumadores de Porto Alegre, o de operários dos serviços portuários de Manaus e o de trabalhadores da movimentação de mercadorias de Ribeirão Preto.
Entre os dez maiores sindicatos devedores, a maior parte é de pequeno e médio portes. Juntos, têm aproximadamente 40 mil trabalhadores associados.
Levantamento do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostra que, em 2001, existiam 15,96 mil sindicatos de empregadores e de empregados no país -71% de trabalhadores.
Embora o número de sindicatos devedores pareça pequeno ao ser comparado ao total de entidades sindicais existentes no país, vale ressaltar que essa lista com 304 devedores se refere aos processos já encaminhados pelo INSS.
"Depois de todas as etapas nas quais cabem recursos, o processo vai à Procuradoria do INSS para ser inscrito em dívida ativa. A inscrição em dívida ativa é necessária para que o INSS possa fazer um ajuizamento do título [cobrar a dívida], que é encaminhado para a execução fiscal", segundo informou a assessoria de imprensa do Ministério da Previdência.
Ao não pagar a Previdência, os sindicatos -criados para defender os interesses de trabalhadores ou de grupos econômicos- são acusados de agir como aqueles que criticam: os patrões. "Com que moral um sindicato pode exigir de um empregador o cumprimento dos direitos trabalhistas se não cumpre os seus? O sindicato existe para defender o trabalhador, mas age como o pior dos empregadores", afirma Luis Carlos Moro, presidente da Associação Latino-Americana de Advogados Trabalhistas (Alal).
A Folha apurou que uma das práticas usadas por alguns sindicatos para escapar dos débitos é a criação de novos sindicatos, que surgem sem dívidas e podem cobrar taxas daqueles que representam. O desmembramento ocorre por categoria ou por região.
O "Sindicato dos Empregados em Escritórios de Empresas de Transporte Rodoviário e Cargas Secas e Molhadas, Cargas Pesadas e Logística em Transporte de São Paulo e Itapecerica da Serra" é um exemplo de sindicato novo que surgiu a partir do "Sindicato dos Empregados em Escritórios de Empresas de Transporte Rodoviário Terrestre de São Paulo e Itapecerica da Serra".
Moacyr Firmino dos Santos, presidente do novo sindicato, diz que o desmembramento ocorreu por decisão da própria categoria. "Desmembramos a categoria entre o pessoal de escritório urbano e o de carga pesada. Já temos nossa carta sindical", afirma.
"Trabalhar no escritório de uma empresa de carga seca ou molhada é a mesma coisa. E mais: transporte rodoviário só pode ser terrestre. O que me parece nesse caso é que as duas categorias são idênticas. O que houve foi um jogo de palavras", diz Otavio Brito Lopes, vice-procurador-geral do Ministério Público do Trabalho. "O culpado por essa orgia sindical é o imposto compulsório, que reforça o caixa dessas entidades."
O Ministério do Trabalho reconhece a prática de desmembramento, mas informa que não pode fiscalizar nem interferir nos sindicatos desde a Constituição de 1988. O pedido de registro de um sindicato só pode ser negado se já existir outra entidade daquela categoria na região. Quando o pedido é negado pelo governo, o sindicato recorre à Justiça.
Em relação ao ranking de devedores, Osvaldo Bargas, secretário de Relações de Trabalho, afirma que o ministério não tem poder para fiscalizar se os sindicatos estão ou não pagando o INSS e o FGTS. "Uma vez que os sindicatos existem para defender o trabalhador, deveriam dar o exemplo e ser os primeiros a cumprir a lei", diz.


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