São Paulo, sábado, 06 de julho de 2002

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OPINIÃO ECONÔMICA

Tempo de turismo

GESNER OLIVEIRA

Para quem não pode viajar neste julho de férias escolares, não custa sonhar com alguns paraísos na Terra. Como a pequena cidade de Piaçabuçu, entre Alagoas e Sergipe, perto da foz do rio São Francisco, da histórica Penedo, o montante do Velho Chico, e das praias de Coruripe e Feliz Deserto.
Poucos brasileiros e estrangeiros visitam Piaçabuçu ou qualquer um do sem-número de destinos com potencial turístico do país. Perde-se com isso uma chance de desenvolver novas regiões, gerar empregos e melhorar a situação das contas externas.
O Brasil é superavitário na balança comercial (US$ 2,6 bilhões no ano passado), mas ainda tem déficit na conta de serviços mesmo após a exclusão dos pagamentos de juros e lucros sobre o capital externo. Nessa conta, chamada de "serviços não-fatores", o déficit anual foi de US$ 7,8 bilhões em 2001 e poderá atingir, segundo projeção do Banco Central, US$ 6,7 bilhões em 2002.
O turismo é o mais promissor dos "serviços não-fatores". Em contraste com o aço e os aviões, não há restrições da OMC (Organização Mundial do Comércio) ao estímulo governamental de serviços como o turismo. Por definição, trata-se de segmento para o qual não há o problema de acesso aos mercados frequentemente protegidos de parceiros comerciais, mas a questão é atrair o turista para o próprio território nacional.
Houve um grande progresso no setor no período recente, porém ainda há muito a ser explorado. A conta "viagens internacionais" do balanço de pagamentos apresentou um déficit de US$ 4,15 bilhões em 1998. Esse saldo negativo caiu para US$ 1,47 bilhão em 2001, e a projeção do Banco Central para este ano aponta um déficit de US$ 1,13 bilhão.
Alerte-se que as estatísticas de turismo no balanço de pagamentos ainda são imprecisas no Brasil. A conta "viagens internacionais" apurada pelo Banco Central registra transações que não necessariamente têm natureza turística. Por exemplo, uma compra efetuada mediante cartão internacional pode representar mera aquisição de bem ou serviço e ser confundida com gastos com viagens. Do lado da receita, os dólares ou euros trazidos pelo turista e possivelmente descontados no mercado paralelo não são contabilizados.
Em contraste com o Brasil, alguns países sustentam o balanço de pagamentos graças ao turismo. Na Espanha, por exemplo, as receitas de viagens e turismo respondem por 27,9% dos ingressos com bens e serviços da conta corrente. O superávit nesta conta foi de 30 bilhões em 2001, quase cobrindo o déficit de 35 bilhões na balança comercial!
Se o Brasil tem tanto potencial turístico, por que não há mais investimento nesse segmento? A política pública é fundamental nessa área. Ninguém chega por acaso à orla brasileira. Parcela da historiografia sustenta que nem mesmo Pedro Álvares Cabral ancorou por acaso em Porto Seguro, no litoral da Bahia!
O mercado, por si só, não resolve o problema. Tampouco bastam praias bonitas. É preciso um pacote coordenado de inversões concentradas no tempo. A atração de turistas depende de fatores como a oferta de infra-estrutura, da segurança pública e do cuidado com o ambiente, além de ações específicas para o setor.
O saneamento é um dos pilares para o desenvolvimento da atividade turística. Programas federais voltados para o turismo têm papel relevante, como o Prodetur (Programa de Desenvolvimento do Turismo), que teve foco inicial no Nordeste com bons resultados e já começou a ser estendido a outras regiões.
As condições de segurança pública influenciam a demanda por turismo internacional com destino ao Brasil. Esse é um dentre vários exemplos nos quais a política de segurança repercute na economia. Por sua vez, a questão do ambiente também é crucial, considerando a vantagem comparativa que o Brasil tem no nicho promissor de ecoturismo.
Naturalmente, existem ações próprias do setor de turismo que são fundamentais para incrementar o fluxo de divisas. Destaque-se, por exemplo, a necessidade de incentivo aos vôos charter nas chegadas internacionais. O Brasil já avançou na regulamentação desse segmento, e qualquer estratégia de incremento do turismo estrangeiro requer sua expansão, pois o tempo, itinerário e orçamento do turista é completamente distinto do viajante das rotas regulares.
A promoção do Brasil no exterior também merece especial atenção. A seleção brasileira, que já fez tanto pelo país ao trazer o pentacampeonato, poderia fazer ainda mais nessa direção.
Mesmo fora das principais rotas do mundo, o turismo brasileiro tem tudo para crescer. As mudanças necessárias poderão tornar mais conhecidos locais como Penedo, Piaçabuçu, Feliz Deserto e Coruripe. E transformar em realidade o sonho vendido (ainda timidamente) de férias inesquecíveis nos mais diferentes lugares do Brasil.


Gesner Oliveira, 46, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), professor da FGV-SP, consultor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br


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