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"Populismo tem pernas curtas", afirma ministro
Mantega prevê crescimento anual de 5% nos próximos anos e diz que "será preciso muita incompetência para desarrumar a casa"
Ministro nega descontrole nas contas públicas e diz que não ficaria bem para Lula deixar funcionalismo com reajuste abaixo da inflação
DO COLUNISTA DA FOLHA
Guido Mantega (Fazenda)
pode até não continuar no cargo no próximo mandato do presidente Lula, caso seja reeleito,
mas ele é hoje certamente um
dos ministros mais otimistas
em relação às perspectivas para
os próximos quatro anos de governo. Já foi chamado até de
maior cabo eleitoral de Lula.
Nessa segunda parte da entrevista à Folha, Mantega desfia suas previsões para os próximos quatro anos: o Brasil
crescerá a taxas de no mínimo
5% ao ano, os juros reais cairão
para 5%, o investimento irá se
expandir de 20% do PIB para
24% do PIB e a inflação continuará na faixa de 4%.
Mantega nega que esteja em
campanha. "Baseio-me naquilo
que foi conquistado. Não é um
sonho distanciado da realidade." Ele insinua que até um
poste conseguiria atingir esses
resultados. "Tudo depende,
claro, do próximo mandatário,
mas será preciso muita incompetência para desarrumar a casa." Ele afasta qualquer possibilidade de uma guinada para o
populismo em um eventual segundo mandato de Lula.
(GUILHERME BARROS)
FOLHA - Quais são os desafios do
próximo governo?
GUIDO MANTEGA - O novo governo, seja ele qual for, encontrará
a possibilidade de potencializar
o crescimento. A economia
brasileira está consolidada e
reúne todas as condições para
dar um salto. A partir do ano
que vem, a economia já pode
caminhar para um crescimento
mais robusto, acima de 5% ao
ano. As condições estão dadas
para que isso aconteça. Se continuar o governo Lula, será um
crescimento vigoroso, nos mesmos moldes e padrões de agora.
FOLHA - O que é preciso para isso?
MANTEGA - Para isso se viabilizar, é preciso estimular o investimento. Nessa primeira fase
(os quatro anos do governo), o
investimento cresceu, mas ainda de forma moderada. O investimento está hoje na faixa 20%
do PIB e tem que chegar a 23%
ou 24% do PIB, e esse patamar
será atingido nos próximos
anos. A partir de agora, os empresários estarão mirando para
a expansão de suas plantas. Antes, eles investiram na modernização de suas máquinas. O
Brasil, nos próximos dez anos,
será um país que vai crescer a
taxas de 5% ao ano.
FOLHA - A queda de juros não é
fundamental para incentivar os investimentos?
MANTEGA - Apesar de toda essa
discussão sobre o "spread" bancário, a tendência continua
sendo a queda dos juros. Eu garanto que a perspectiva, nos
próximos quatro anos, é que a
taxa convirja para um juro real
de 5% ao ano ou até menos.
FOLHA - O sr. não está otimista demais? O sr. está em campanha?
MANTEGA - O que estou fazendo
é apenas uma projeção do que
pode acontecer no próximo governo com o que ocorre hoje na
economia. Não é um sonho distanciado da realidade. Baseio-me naquilo que foi conquistado. Tudo depende, claro, do
próximo mandatário, mas será
preciso muita incompetência
para desarrumar a casa.
FOLHA - Muitos economistas temem os excessos de gastos do governo neste ano.
MANTEGA - Em 2006, nós estaremos completando oito anos
consecutivos de superávit primário acima de 3%. Se depender de nós, serão mais quatro
anos de superávit primário.
Com os juros caindo, garanto
que, seja lá quem estiver ocupando minha cadeira, terá condições de entregar um superávit primário de 4,25% do PIB
nos próximos quatro anos. Se o
juro cair para uma taxa real de
5% ao ano, o custo financeiro
do governo cairá para uns 4%
do PIB, a metade do que é hoje.
Com isso, você pode ter o déficit nominal zero, além de uma
redução da relação dívida/PIB,
para algo como 44% do PIB.
FOLHA - Os aumentos de salários
não podem atrapalhar esses planos?
MANTEGA - Se você olhar a folha
de pagamentos em relação ao
PIB nos últimos quatro anos, o
que se vê é que está estacionada. Em 2003 e 2004, chegou até
a cair, depois voltou a subir.
Não houve descontrole. É um
equívoco achar que há um descontrole na política de salários.
Tem ano em que você pode dar
aumento, tem ano em que não,
mas isso está dentro de uma
trajetória sempre segura.
FOLHA - Ano de eleições é ano de
aumento de salários.
MANTEGA - Ano de eleição é ano
em que se procura fazer mais
investimento, mais ações sociais, e de fazer os reajustes que
não tinham sido dados. Não ficaria bem para o governo Lula
deixar algumas categorias com
reajuste abaixo da inflação no
período, mesmo porque a receita cresceu de forma robusta
e se está exigindo mais do funcionalismo. Não há descontrole
das contas públicas. As contas
públicas estão equilibradas.
FOLHA - O sr. aposta num crescimento de 5% para os próximos quatro anos, mas não há gargalos em
infra-estrutura, como em energia,
que podem impedir esses planos?
MANTEGA - Energia não é um
gargalo, absolutamente. Eu tenho ouvido um candidato a vice-presidente, o José Jorge [na
chapa de Geraldo Alckmin],
que é um especialista em apagão, dizer que, em 2009 e 2010,
haverá falta de energia. Isso
não tem procedência, não passa de especulação. Há investimentos no setor, a capacidade
está aumentando. O governo
não está preocupado. Infra-estrutura não é problema.
FOLHA - Há possibilidades de o governo dar uma guinada para o populismo, caso Lula seja reeleito?
MANTEGA - Qual seria a lógica
de uma guinada numa política
que está dando certo? O populismo tem vida curta, tem pernas curtas. Seria negar tudo o
que foi feito no Brasil durante
esse período. Não faz sentido.
Se o presidente pode ser acusado de algo, é de justamente não
praticar o populismo.
FOLHA - Como o senhor define populismo?
MANTEGA - Seria, por exemplo,
num ano eleitoral, mandar bala
nas contas públicas, fazer gastos indiscriminados, baixar os
juros violentamente, fazer um
monte de bondades que não estão sendo feitas. Se você examinar a trajetória da política econômica nos últimos anos, vai
ver que ela é coerente. Não mudou nada num ano de eleições.
FOLHA - Não há risco de, por exemplo, uma chavinização [copiar Hugo
Chávez, da Venezuela] do governo?
MANTEGA - Não faz sentido essa
acusação. O presidente Lula já
demonstrou qual é a sua orientação econômica, política, ideológica, e não é de fazer populismo. Poderia fazer o populismo
em desespero de causa, se tudo
estivesse dando errado, se tudo
o que fez não estivesse dando
certo e estivesse apanhando.
E aí reduzisse os juros à metade de forma abrupta, mas isso
teria um efeito contrário. É um
absurdo pensar numa guinada
para o populismo. Se o governo
pode ser acusado de algo, é de
excesso de responsabilidade,
não de falta dela.
FOLHA - Mas isso não distancia cada vez mais o presidente do PT?
MANTEGA - Não. Qual é o grande objetivo do PT? Melhorar o
padrão de vida da população,
dar condições melhores de trabalho, aumentar o nível de emprego, diminuir as distâncias
sociais, dar acesso às camadas
mais pobres da população brasileira a um padrão mínimo de
consumo, de alimentação, dar
oportunidade para o cidadão
ter sua casa própria, e tudo isso
está sendo feito. Todas as aspirações do Partido dos Trabalhadores estão sendo cumpridas. Missão cumprida.
FOLHA - Mas houve tentações do
governo de baixar as taxas de juros
mais rápido?
MANTEGA - As tentações existem, mas, enquanto são mantidas apenas no nível do desejo,
do inconsciente, não causam
problema. O segredo é ter uma
ação racional e coerente.
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