São Paulo, quarta-feira, 06 de agosto de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

VINICIUS TORRES FREIRE

Política econômica em pane


Mundo rico relega alta de juros para as calendas e parece admitir que não sabe como lidar com a crise e a inflação

DISCRETA, A China revê aos poucos medidas que tomara no ano passado a fim de conter o superaquecimento da economia e a inflação. O Fed ontem não apenas deixou os juros onde estavam como colocou no saco a viola da inflação, que tocava estridente faz apenas dois meses.
Também faz dois meses, o BC da Europa dizia que a inflação estava quente e que os juros viriam fervendo. Mas, na bica de mais uma decisão do BCE sobre política monetária, sabe-se que o consumidor europeu abriu o bico e que, em breve, a Alemanha deve anunciar que sua economia entrou no vermelho. A economia européia estava por um fio -e esse fio era a Alemanha.
No geral, nos lugares do mundo que importam (e mesmo nos desimportantes), a inflação não refrescou em nada nesses últimos dois meses.
O que há então para que autoridades econômicas assoviem, olhem para o céu e empurrem para debaixo do tapete o problema dos preços?
"A crise financeira piorou de novo"? Como assim, "de novo"? Apenas propagandistas vulgares do mercado financeiro, ignorantes e inimputáveis queriam acreditar ou fazer crer que "o pior já passara" nas finanças. Muitos dos mesmos que ainda usam o eufemismo palerma ou celerado de "crise do subprime" para se referir a uma crise bancária e de crédito que de resto faz muito transbordou para o mundo "real" do emprego e da produção.
Decerto dois meses são uma eternidade nos mercados financeiros.
Mas não houve fato relevante e inesperado nesse outro bimestre de dissolução em câmara lenta dos ativos e de parte do sistema financeiro americano e europeu. Não era imprevista a alta lenta, gradual e segura do desemprego nos Estados Unidos.
Nem o efeito recessivo do aumento do preço do petróleo, dos custos de transporte, da desaceleração do comércio mundial. Etc. O caso apenas não é catastrófico porque as autoridades dos Estados Unidos realizam a segunda maior operação de resgate financeiro da história americana.
Por ora a segunda maior.
Os responsáveis pela política econômica nos Estados Unidos, na Europa ou na China obviamente sabem de tudo isso muito melhor que nós e sabem de muito mais. O que repõe a pergunta sobre o motivo da política monetária na base do "grito" de dois meses atrás, dos alertas sobre a inflação e dos prolegômenos sobre a iminente virada da política monetária. Era essa a atitude das autoridades monetárias européias e americanas.
Entre a cruz dos preços e a caldeirinha da recessão, tais autoridades pareciam dizer que optariam por jogar o crescimento econômico no fogo. Agora, reconhecem na prática que seus instrumentos econômicos entraram em pane. Mas é bom ressaltar que, no caso de China e cia., na Ásia, as motivações para ir devagar com o andor da contenção do crescimento são mesmo políticas.
"Parece que vamos entrar em um período de séria estagflação, de aumento agudo da inflação combinado a grandes riscos de queda no crescimento e no emprego", dizia faz cerca de três meses Malcolm Knight, gerente-geral do BIS, o Bank for International Settlements, o consórcio dos bancos centrais do planeta.
Acertou na mosca?

vinit@uol.com.br


Texto Anterior: Alexandre Schwartsman: Palpite infeliz
Próximo Texto: BC dos EUA mantém juros e reduz temor com inflação
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.