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Mundo ainda terá que injetar "dois Brasis"
Soma de US$ 2,5 tri equivale ao que se estima que ainda será preciso gastar para conter a crise; G20 afasta discutir "saídas"
Autoridades econômicas do G20 concordam em manter medidas de estímulo fiscal, mas não chegam a acordo sobre questão climática
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A LONDRES
O mundo ainda gastará o
equivalente a duas vezes o tamanho da economia brasileira
até 2010, para consolidar a incipiente recuperação econômica.
Esse cálculo surge inescapavelmente de dois fatos, ambos
ocorridos ontem na reunião de
ministros da Fazenda e presidentes de bancos centrais do
G20, o clube das 20 maiores
economias do mundo.
Primeiro, os ministros concordaram, como era esperado,
em "continuar a implementar
decididamente nossas necessárias medidas de suporte financeiro e as políticas expansionistas monetária e fiscal, consistentes com a estabilidade de
preços e a sustentabilidade fiscal de longo prazo, até que a recuperação esteja assegurada".
Segundo dado: o primeiro-ministro britânico Gordon
Brown, no discurso inaugural,
afirmou que "mais da metade
dos US$ 5 trilhões de expansão
fiscal comprometidos estão
ainda por gastar". Mais da metade de US$ 5 trilhões dá, grosso modo, duas vezes o PIB do
Brasil (Produto Interno Bruto,
medida de sua economia).
A reunião de Londres afastou
assim qualquer hipótese de se
começar a pensar no que o jargão batizou de "estratégias de
saída", ou seja, a desmontagem
dos pacotes de subsídios, corte
de impostos e redução de juros
que compõem os US$ 5 trilhões
que o mundo se comprometeu
a investir para tentar evitar o
colapso que se desenhava no
fim do ano passado.
O último prego no caixão das
"estratégias de saída" foi cravado pelo responsável pelo Tesouro britânico, Alistair Darling, que lembrou a seus pares
que, na grande crise de 1929, os
incentivos foram prematuramente retirados, do que resultou uma nova crise, poucos
anos depois (mais exatamente
em 1937).
"Não vamos repetir o erro de
aplicar os freios cedo demais",
reforçou, na entrevista coletiva
de encerramento, o secretário
do Tesouro norte-americano,
Timothy Geithner.
Retirada do cenário a ideia
das "estratégias de saída", o documento ficou bem parecido
com os dois que foram emitidos
nas duas reuniões anteriores
em Londres, a de ministros da
Fazenda, em março, e a de chefes de governo, em abril.
Significa que foi uma reunião
inócua? Não, respondeu à Folha o presidente do Banco Central Europeu, Jean-Claude Trichet: "O importante é que se
manteve o consenso entre as
grandes economias. E o consenso foi fundamental para a
recuperação que se está começando a ver".
Geithner foi um pouco nessa
linha, ao dizer que "o G20 desempenha papel central no
processo de cooperação internacional. O mundo não veria
respostas tão efetivas se não se
unissem os líderes mundiais".
Divergências
O consenso não foi nem poderia ser completo. Houve divergências por exemplo na
alentada discussão sobre o
combate à mudança climática,
um tema que os Estados Unidos querem colocar no topo da
agenda. Geithner começou até
a falar em recursos, a massa de
dinheiro necessária para ajudar os países a se adaptarem às
mudanças inevitáveis decorrentes de uma economia que
gere menos gases poluentes.
Os chineses cortaram a discussão, com dois argumentos:
primeiro, o de que o assunto
deveria ser tratado pelos ministros de Meio Ambiente, e não
pelos de Finanças. Segundo, o
de que o comunicado já falava
em "crescimento sustentável",
o que pressuporia combate à
mudança climática -o que está
longe de ser aceito pelos Estados Unidos e pelo Reino Unido,
entre outros.
Resultado: o comunicado dedicou pouco mais de uma linha
ao tema, para afirmar que "a
necessidade de combater a mudança climática é urgente, e nós
trabalharemos para um bom
resultado em Copenhague"
(alusão à cúpula ambiental que
ocorrerá em dezembro na capital dinamarquesa).
Geithner deixou claro, na entrevista coletiva, que os Estados Unidos recolocarão o tema
em pauta para a reunião de chefes de governo marcada para os
próximos dias 24 e 25, em Pittsburgh. Como os anfitriões acabam sendo determinantes para
a agenda desse tipo de encontro, Pittsburgh pode ser uma
espécie de "trailer" para Copenhague.
Divergências também apareceram quando se discutiu a regulação do sistema financeiro.
Outras eventuais discordâncias foram eliminadas graças à
menções apenas superficiais a
temas como a reforma do Fundo Monetário Internacional e
do Banco Mundial e à Rodada
Doha (de liberalização comercial). Em ambos, retomou-se a
linha de defender a reforma
com mais voz e voto para os
países emergentes, mas sem
descer a números, e a torcer para "alcançar uma ambiciosa e
equilibrada conclusão da Rodada Doha".
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