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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Lula e os dois Brasis
Precisamos de medidas para beneficiar com a economia todos os brasileiros, de todas as regiões e faixas de renda
ÀS VÉSPERAS da realização do
segundo turno das eleições
presidenciais, vivemos uma
oportunidade riquíssima de passar o
Brasil a limpo. A disputa entre apenas dois candidatos permite que o
debate se concentre em algumas
questões fundamentais para o futuro de nossa sociedade.
O presidente atual, candidato à
reeleição, apresenta-se ao eleitor como o responsável por um dos momentos mais brilhantes de nossa
história econômica. Na opinião dele,
é claro. Aliás, o sentimento de bem-estar econômico em algumas faixas
de renda e regiões do país é considerado pelos analistas a força que contrabalança os escândalos que marcaram esses últimos quatro anos.
Portanto, Lula defende a manutenção dos marcos da política econômica atual e propõe apenas pequenos
ajustes para seu segundo mandato.
Não está preocupado em saber por
que o Brasil cresce pouco.
Geraldo Alckmin, candidato da
oposição, apresenta-se à opinião pública como crítico dos anos Lula e
faz do crescimento mais vigoroso o
objetivo central de seu governo. Sua
mensagem é a de que perdemos um
dos momentos de maior crescimento da economia mundial e estamos
hoje na rabeira das nações emergentes. Além disso, diz que a política
econômica de Lula está provocando
um processo perigoso de destruição
de nossa indústria manufatureira,
incapaz de concorrer com novas nações industriais, como a China, em
razão de problemas que se acumulam em vários setores e regiões.
Esses problemas já influenciaram
de forma decisiva o primeiro turno
das eleições, dividindo o país em
duas regiões distintas em termos
eleitorais. De um lado, o Sul, a maioria dos Estados do Sudeste e o Centro-Oeste votaram maciçamente em
Alckmin; de outro lado, o Nordeste e
o Norte deram a Lula mais de 60%
dos votos totais. Interessante nesse
quadro é a posição de Minas Gerais
que, em termos dos resultados do
primeiro turno, virou um Estado do
Norte/Nordeste. Como seu perfil
econômico é outro, alguma coisa
aconteceu na terra das alterosas que
explica essa distorção.
Os dados da produção industrial
até agosto, divulgados ontem, são
auto-explicativos: a produção da indústria de metal caiu 2,5%, a de calçados 3,6%, a da indústria de vestuário 6,1% e a de madeira em 8,4%. Se
considerarmos a indústria manufatureira como um todo, o crescimento nos últimos 12 meses é de apenas
1,8%. Em termos regionais, até julho
deste ano, a indústria no Rio Grande
do Sul reduziu sua produção em
3,7%, o Paraná em 3,3% e Santa Catarina em 0,4%.
A realidade é que há grandes diferenças entre o pedaço do Brasil que
se sente bem com a política econômica atual e um outro que está sofrendo as conseqüências dos equívocos do governo. Essas diferenças
estão marcando o comportamento
do eleitor e criando um Brasil vermelho e um Brasil azul, as cores do
PT e do PSDB. Podemos definir esses dois Brasis de várias formas: o
Brasil que depende de salários e
transferências do Estado e o Brasil
onde vigora a economia de mercado.
Ou, como foi descrito por outros
analistas, o Brasil que paga impostos
e o Brasil que vive de impostos.
No Brasil que vive um ambiente
favorável por conta de ações do governo, as vendas ao varejo estão
crescendo muito: 11% no Norte, 10%
no Nordeste. No Brasil que votou
em Alckmin, a realidade é menos
brilhante: o comércio está estagnado na região Sul, cresce apenas 4,7%
no Centro-Oeste e 6% no Sudeste.
A questão relevante diante desse
quadro é a impossibilidade de o governo continuar como o responsável pela sustentação da renda e do
consumo dos brasileiros. E digo isso
por duas razões principais: primeiro, porque não existem recursos fiscais suficientes para manter esse
quadro artificial por mais tempo; em
segundo lugar porque, ao retirar recursos dos setores que produzem e
investem, por meio de impostos e
juros, o governo destrói nossa capacidade produtiva e dirige parte crescente da demanda artificialmente
criada para a produção em outros
países.
No primeiro semestre de 2006,
pela primeira vez em muitos anos, o
consumo interno superou em quase
1% o total de bens e serviços produzidos no país. Esse número é ainda
mais dramático se considerarmos
apenas nossa indústria, que tem
perdido espaço aceleradamente. Esse vazamento de nosso crescimento
para o exterior vai crescer ainda
mais nos próximos trimestres. Precisamos tomar as medidas necessárias para fazer com que nossa economia se torne rapidamente mais
competitiva e traga benefícios para
todos os brasileiros, independentemente de região ou faixa de renda.
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 63, engenheiro e
economista, é economista-chefe da Quest Investimentos.
Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações
(governo FHC).
lcmb2@terra.com.br
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