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VINICIUS TORRES FREIRE
O lucro de um Bradesco vira pó nos EUA
Bancos admitem fantasia na contabilidade; Citi reconhece perdas de até US$ 11 bilhões. O fundo do poço não é o limite
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POR QUE É tão difícil saber o tamanho do prejuízo que os
bancos americanos e europeus tiveram com derivativos de
crédito ligados a prestações imobiliárias? Os derivativos de crédito ligados a hipotecas e, por tabela, as ações de bancos e, em decorrência,
as ações americanas em geral estão
balançando. Obscuros compradores
americanos de casas de US$ 700 mil
que ganhavam US$ 15 mil por ano
passaram a ter interesse para o investidor que joga no curto prazo na
Bovespa -e talvez até no médio e no
longo prazos, a depender do tamanho do rolo em Wall Street.
Os empréstimos para compradores de casas com crédito ruim e baixa renda foram repassados adiante
como títulos lastreados no rendimento dessas prestações imobiliárias. Tais títulos foram a seguir juntados, fatiados e revendidos como
CDOs, ("collateralized debt obligations"). A idéia por trás dessa série
de ajuntamentos e reembalagens de
dívidas era diluir o risco e atrair financiamento até para as hipotecas
mais arriscadas a um custo menor.
Era um meio de canalizar dinheiro
"sobrante" no mundo para negócios
que rendessem mais.
Mas quanto vale um CDO que ficou num "fundo" gerido por um
banco, ou a ele ligado, ou pedaços
desses títulos que ainda estavam
sendo reembalados para a venda (isto é, para ser repassado a um investidor)? Sabia-se, claro, que, se houvesse calote em hipotecas, tais títulos
perderiam valor. Mas quanto?
No estouro da bolha, no início do
ano, dizia-se que o impacto seria pequeno -os calotes atingiam apenas
fatia inexpressiva das hipotecas.
Mas a fatia nem era tão inexpressiva, era crescente, a crise se realimentou devido à alta de juros e provocou pânico não só em relação a papéis lastreados em hipotecas.
Para papéis incrivelmente complicados como os derivativos de crédito, não há mercado organizado,
nem profundo, nem meio de cotar
os títulos que sejam transparentes e
compartilhados. A cotação era baseada em índices precários, pressupostos fantasistas e matemática
obscura, baseada na classificação
que as agências de cotação de risco
davam a tais papéis (isso é, sua nota
de probabilidade de calote). A fim de
valorar esses CDOs, sem mercado,
os bancos se baseavam no preço de
títulos de empresas com classificação de risco, prazo etc. semelhantes
aos das notas de risco dos CDOs.
Mas não colou. Colou ainda menos quando as agências de risco reduziram as notas de classificação
desses papéis. Instituições financeiras imensas, como Merrill Lynch e
Citigroup, não apenas foram obrigadas a rever o valor de seus títulos nos
balanços do terceiro trimestre mas
em questão de semanas tiveram de
reavaliar novamente suas perdas
em bilhões de dólares adicionais-
pelo menos uma dezena deles, no
caso do Citigroup. É quase o dobro
do lucro do Bradesco no ano.
Mais capital empatado em títulos
podres reduz o volume de negócios
dos bancos e a perspectiva de lucro.
O papelório podre causou aperto no
crédito, não só o imobiliário, mas
mesmo entre bancos. Não houve colapso, dada a ajuda dos BCs, mas os
juros agora voltaram a subir na praça euroamericana. Até que os bancos expliquem o tamanho do rombo,
haverá corcoveio no mercado.
vinit@uol.com.br
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