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Ex-juiz é acusado de criar suposto esquema da Cisco
Executivo movimentou US$ 500 milhões em um ano nos EUA, diz acusação
Advogado diz que provará
inocência do cliente, que era
diretor da Mude, a maior
distribuidora da Cisco, e foi
preso em 16 de outubro
MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL
Após ser preso pela Operação
Persona, que acusa a empresa
de tecnologia americana Cisco
de fraudar importações, o advogado e executivo José Roberto Pernomian Rodrigues disse
aos policiais federais que sabia
da investigação, mas não tinha
como suprimir os rastros do
que fizera. Afinal, havia movimentado US$ 500 milhões
(cerca de R$ 900 milhões) nos
Estados Unidos em um ano, de
acordo com o relato.
Não foi a única surpresa da
Polícia Federal no caso de Rodrigues: o seu currículo também é invulgar para quem está
preso desde o dia 16 de outubro.
Em 2002, o advogado foi juiz do
Tribunal de Impostos e Taxas
da Secretaria da Fazenda de
São Paulo, no qual são julgadas
causas de ICMS que envolvem
milhões, e fez doutorado na Faculdade de Direito da USP.
Rodrigues tentou ser professor da USP, mas foi reprovado,
e aparece no quadro de professores e conferencistas da Escola Paulista de Direito, um dos
mais prestigiados cursos privados de pós-graduação do país.
Antes de assumir a diretoria da
Mude -a principal distribuidora da Cisco no Brasil, acusada
de comandar as fraudes junto
com a empresa americana-,
Rodrigues era advogado tributarista da importadora.
Parte do tribunal da secretaria paulista é composta de advogados indicados por contribuintes em lista tríplice e escolhido pelo governador -no caso, Geraldo Alckmin.
O "advogado brilhante", como é classificado por amigos,
tinha uma vida dupla, de acordo com a PF. Rodrigues é acusado de ter sido um dos mentores do esquema que a Cisco teria usado para importar equipamentos de informática dos
EUA. A fraude teria resultado
em perdas de R$ 1,5 bilhão para
a Receita em três anos, segundo
estimativa do próprio órgão.
Rodrigues é diretor de operações e de finanças da Mude. Foi
nesse cargo, de acordo com a
PF, que criou um esquema inédito de sonegação de impostos.
O plano de Rodrigues tinha a
sofisticação de quem conhece a
área tributária no Brasil e no
exterior. A Mude, segundo a
PF, usava empresas em nome
de laranjas no Brasil e nos EUA
para evitar que as autoridades
descobrissem que ela era a real
importadora. O advogado era
quem controlava o esquema
nos dois países. Nos EUA, era
diretor da Mude USA e criou a
Mude Investments, segundo a
investigação.
Era ele também quem abria
as "offshores" (empresas no exterior) em paraísos fiscais, diz a
PF. Um dos relatórios da inteligência da PF diz que "José Roberto controla o grupo [Mude]
no Brasil e nos EUA; por isso,
mantém a rotina de permanecer 15 dias em cada país".
As "offshores" tinham um
papel duplo no esquema, segundo os policiais: elas serviam
para esconder os reais importadores e eram usadas para fazer
remessas ilegais de recursos
para fora do Brasil. O executivo
abria "offshores" por meio de
um escritório de advocacia do
Panamá, o Alcogal (Aleman,
Cordero, Galindo e Lee), que
trabalha para corporações do
porte da Philip Morris, do Citibank, da Siemens e da Cisco
Systems.
Sempre segundo a investigação, a sonegação era feita por
meio da redução nos EUA do
preço real do produto importado. Num exemplo hipotético, a
Cisco vendia um equipamento
de US$ 100 mil para uma empresa controlada pela Mude.
Ela revendia o mesmo produto
para outra empresa do esquema por valores que eram subfaturados em até 70% -ou seja, o
produto de US$ 100 mil passa a
custar US$ 30 mil, e o imposto
caía na mesma proporção. O
valor menor aparecia nos documentos fiscais americanos em
forma de desconto.
O toque de mestre do esquema, na avaliação de auditores
da Receita, é que ele preserva a
Cisco, já que as supostas irregularidades eram cometidas pelas
empresas para as quais ele vendia. O envolvimento da Cisco,
de acordo com a PF, ficou evidente com as interceptações telefônicas feitas com ordem judicial. Nelas, executivos da empresa mostram que sabiam e
usufruíam das irregularidades,
segundo os policiais.
A Cisco atribui todas as irregularidades à Mude.
Pagamentos no exterior
A escuta dos telefonemas de
Rodrigues aponta que ele cuidava dos pagamentos no exterior -o que desmonta a tese
dos advogados da Mude de que
a empresa não fazia importações, só distribuía os produtos.
A gravação das conversas sobre os pagamentos no exterior
apontam que a Mude enviava
dinheiro ao exterior para saldar
dívidas de uma rede de empresas de laranjas no Brasil e nos
Estados Unidos.
Os telefonemas interceptados revelam que o advogado
cuidava da blindagem patrimonial dos diretores da Mude. Os
ganhos ficavam em nome de
"offshores", o que dificulta que
esse dinheiro seja recuperado
pelo governo brasileiro em caso
de eventual condenação.
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