São Paulo, quarta-feira, 07 de janeiro de 2004

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LUÍS NASSIF

China e o êxodo rural

A China é uma máquina de propulsão que tanto poderá entrar para o firmamento das grandes potências mundiais como explodir em menos de uma década. É fantástico como a percepção de lucro imediato embota a razão do mais frio empresário.
Não se percebe, nas multinacionais que operam na China, nenhuma dúvida quanto às intenções do PCC de construir uma economia capitalista de mercado. A questão é a enorme minimização dos riscos da operação.
A agricultura é um desafio monumental. A China tem um consumo de 500 milhões de toneladas/ano de grãos e importa 30 milhões. Tende a ser grande importadora de carne, açúcar, trigo e álcool.
Por outro lado, terá que enfrentar dois desafios no campo. O primeiro, o da redução de sua fronteira agrícola, em razão de fortes problemas ambientais que provocaram assoreamento dos rios, comprometendo a produção de energia. A área agricultável na China não chega ao equivalente ao Estado do Pará, informa Renato Amorim, do Departamento de Economia da Embaixada em Pequim. Além de exígua, a área agricultável abriga uma população de 900 milhões de pessoas, a maioria das quais vivendo de agricultura de subsistência.
Em 1978, no início da liberalização, permitiu-se que agricultores gradativamente pudessem vender seus excedentes. Esse movimento acabou criando uma grande estratificação do uso da terra.
Confira-se a produção de algodão. No Brasil, são 700 mil hectares de plantação distribuídos entre 800 produtores, com escala para uma agricultura competitiva. Na China, são 7,5 milhões de hectares entre 40 milhões de chineses.
Esse movimento exigirá a mecanização do campo, o que significará ter que enfrentar o êxodo rural. E aí se criará o desafio fundamental, que poderá significar o grande salto final da China, ou o desastre.
O movimento de êxodo rural oferece uma oportunidade histórica e um risco expressivo. Se bem conduzido, com a criação de empregos urbanos para absorver a mão-de-obra rural, cria um choque de demanda capaz de mudar um país. Se mal conduzido, gera problemas sociais e uma multidão de miseráveis com aumento da tensão social. Um dos erros fundamentais do Brasil dos militares foi não ter aproveitado o crescimento pujante da economia para um processo controlado de absorção da mão-de-obra rural. Em vez de consumidores, o erro criou enormes favelas.
A estratégia da China consistirá em estimular o crescimento de cidades rurais, lugarejos com 10 mil, 20 mil habitantes que se pretende transformar em cidades de 200 mil habitantes. Ao mesmo tempo, o país deu início a um furioso programa de construção de grandes obras públicas para absorver essa mão-de-obra.
É tarefa ciclópica, levando-se em conta o vastíssimo contingente de mão-de-obra que será liberada pela modernização do campo para um país em que, mesmo com as elevadíssimas taxas de crescimento, existe uma taxa de desemprego encoberto estimada em 20% da população.

E-mail - Luisnassif@uol.com.br


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