São Paulo, domingo, 07 de janeiro de 2007

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Google aumenta exigências para contratar pessoal

Além de desempenho acadêmico, empresa passa a valorizar detalhes da biografia dos candidatos, como participar de ONG

Companhia criou método, com o uso de fórmulas matemáticas, que promete ser capaz de encontrar os melhores candidatos

Ng Han Guan/Associated Press
Escritório do Google na China; empresa passa a fazer novas exigências para selecionar pessoal


SAUL HANSELL
DO "NEW YORK TIMES",EM MOUNTAIN VIEW

Você já ganhou algum dinheiro trabalhando como garçom ou levando cachorros alheios para passear? Prefere trabalhar sozinho ou em grupo? Já estabeleceu um recorde mundial em qualquer coisa? As respostas certas podem lhe valer um emprego no Google.
A empresa sempre quis contratar pessoas com as notas mais elevadas e com resultados impecáveis nos testes acadêmicos. Agora, como as universidades de elite americanas, o Google está começando a procurar por pessoas com interesses mais amplos, que tenham publicado livros ou criado clubes.
Desesperado por contratar mais engenheiros e vendedores a fim de manter o crescimento veloz de seus serviços de busca e de publicidade na internet, o Google -à sua maneira tipicamente excêntrica- criou um método automatizado de procurar talento entre os mais de 100 mil pedidos de emprego que recebe a cada mês.
A empresa começou a solicitar aos interessados que preencham uma complexa pesquisa on-line que estuda suas atitudes, comportamento, personalidade e detalhes biográficos.
As perguntas não só tentam determinar com que idade o candidato começou a se entusiasmar pelos computadores mas também se recebeu aulas particulares ou fundou uma organização sem fins lucrativos.
As respostas são filtradas segundo uma série de fórmulas criadas pelos matemáticos do Google e dão uma nota, que aponta como uma pessoa poderia se enquadrar em sua cultura caótica e competitiva.
"À medida que nos desenvolvemos, encontramos mais e mais dificuldade para contratar número suficiente de trabalhadores", disse Laszlo Bock, vice-presidente de operações de pessoal da empresa. "Com os métodos tradicionais de contratação, nossa preocupação é que venhamos a ignorar alguns dos melhores candidatos."
O Google não é a única empresa a usar métodos quantitativos para localizar bons funcionários. Porém ferramentas como essas geralmente eram usadas por grandes empresas interessadas em recrutar exércitos de funcionários com perfis semelhantes, como operadores de serviços telefônicos.
No Vale do Silício (Estado da Califórnia), métodos desse tipo eram raros, já que o setor de tecnologia americano foi construído com base na crença em talentos idiossincráticos.
"O Yahoo! não usa testes, quebra-cabeças ou truques ao entrevistar candidatos", disse Jessie Wixon, porta-voz da empresa. O Google é conhecido por apresentar enigmas insolúveis aos candidatos a empregos em seu processo seletivo.

Processo rigoroso
Bock, que trocou a General Electric pelo Google no ano passado, vem tentando aumentar a eficiência do rigoroso processo de seleção do grupo.
De acordo com especialistas em recursos humanos, o Google freqüentemente rejeitava engenheiros com média inferior a 3,7 (no sistema universitário dos EUA a nota máxima é 4), e os candidatos a trabalhar no setor de publicidade precisavam de nota média 3.
Além disso, a empresa ocasionalmente demorava até dois meses para avaliar um candidato, submetendo-o a pelo menos meia dúzia de entrevistas.
Mas a maior parte das pesquisas acadêmicas mostra que os fatores a que o Google atribuía mais peso (notas e entrevistas) não são muito confiáveis para a contratação de bons profissionais. "Entrevistas não funcionam muito bem para prever desempenho", diz Bock.
Assim, a empresa decidiu verificar se havia certas experiências de vida ou traços de personalidade que pudesse usar para localizar futuros astros.

Questionário
No terceiro trimestre de 2006, o Google solicitou a cada um de seus funcionários que tivesse pelo menos cinco meses de experiência na companhia que respondesse a um questionário com 300 perguntas.
Algumas das perguntas eram factuais -que linguagens de programação a pessoa conhecia ou de que listas de discussão ela participava na internet. Outras verificavam comportamento: seu espaço pessoal de trabalho é ordenado ou uma bagunça?
E outras tratavam de aspectos de personalidade -a pessoa era extrovertida ou introvertida? Além disso, havia algumas perguntas tradicionais no mundo dos recursos humanos, como que revista assinava e se tinha animais de estimação.
"Queríamos estender a rede mais ampla possível", disse Bock. "Não é raro encontrarmos cachorros quando caminhamos pelos corredores da empresa. Talvez as pessoas que têm cachorros apresentem algum traço de personalidade que nos seja útil."
Os dados obtidos nessa pesquisa foram comparados a 25 indicadores diferentes do desempenho de cada funcionário. Uma vez mais, havia indicadores tradicionais, como avaliações de colegas e superiores, e também alguns itens exóticos.
Um dos indicadores tratava daquilo que a empresa designa como "cidadania organizacional", disse Todd Carlisle, especialista em psicologia organizacional que preparou o questionário. Ou seja, "coisas que tecnicamente não são parte do trabalho, mas que fazem do Google um lugar mais agradável de trabalhar".
Entre os primeiros resultados, surgiu uma confirmação de que a obsessão do Google pelo desempenho acadêmico nem sempre tinha relação com o sucesso no trabalho.
"Às vezes, excesso de estudo pode ser prejudicial no emprego", afirma Carlisle. Segundo ele, nem todos os mais de 600 funcionários do Google que têm doutorado ocupam um posto teoricamente compatível com suas formações.
De fato, não havia um fator único que pareça ser capaz de localizar os melhores trabalhadores -e ser dono de animais de estimação parece não servir para prever coisa nenhuma.
A abordagem do Google é confirmada por pesquisas acadêmicas. Segundo elas, as informação quantitativas sobre os antecedentes de uma pessoa, chamadas de "biodados", são uma maneira válida de achar bons trabalhadores.
No Google, ainda é muito cedo para afirmar se o sistema está funcionando. As pesquisas começaram há alguns meses.
De fato, até mesmo no Google existe certa resistência à idéia de que uma máquina seja mais capaz de reconhecer talentos do que um ser humano.
"É como dizer a alguém que você dispõe de dados perfeitos sobre os motivos pelos quais aquela pessoa deveria se casar", diz Carlisle.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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