São Paulo, segunda-feira, 07 de janeiro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ENTREVISTA DA 2ª/JÚLIO SÉRGIO GOMES DE ALMEIDA

Mudanças tributárias vão elevar a competitividade de setores produtivos, diz ex-secretário da Fazenda que hoje trabalha no Iedi

"Pacote fiscal é produtivo e tem que ser festejado"

GUILHERME BARROS
COLUNISTA DA FOLHA

Os empresários reagiram mal ao pacote anunciado pelo governo. A crítica se concentrou no fato de o aumento de impostos atuar principalmente sobre o crédito, que tem sido uma das molas propulsoras do crescimento da economia. Na contramão das críticas, o economista Júlio Sérgio Gomes de Almeida, 52, que foi secretário de Política Econômica da Fazenda de 2005 a 2007 e é consultor do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial), acha que o setor produtivo saiu ganhando com o pacote, principalmente aqueles de maior valor agregado.
O pacote, segundo ele, proporcionará maior competitividade às empresas. "Para muitos setores, o pacote do governo é para ser comemorado." A seguir, a entrevista:  

FOLHA -

O que o senhor achou do pacote?
JÚLIO SÉRGIO GOMES DE ALMEIDA
- O pacote já era esperado. Todo mundo sabia que o governo tinha que fazer alguma coisa na parte de impostos para recuperar os R$ 40 bilhões da CPMF.
O aumento de impostos corresponde a 25% dessa perda e o imposto escolhido foi o mais próximo da CPMF, que foi o IOF, que incide sobre as operações financeiras e o crédito. O governo foi muito coerente nessa mexida. O governo também complementou o pacote com o aumento da cobrança da CSLL sobre as instituições financeiras, que também foi outra medida coerente para substituir o imposto que acabou.

FOLHA - O setor produtivo será afetado pelas medidas do pacote?
GOMES DE ALMEIDA
- Na prática, o que o governo fez foi reintroduzir a CPMF sobre o crédito, o que não deixou de ser uma frustração para quem acreditou que o crédito iria ficar mais barato. Mas é bom separar o joio do trigo. Essa frustração não envolveu toda a incidência da CPMF sobre o setor produtivo.
No balanço geral de ganhos e perdas com o fim da CPMF, o pacote foi altamente produtivo para as empresas e também para as pessoas físicas.

FOLHA - Por que o pacote foi produtivo para as empresas?
GOMES DE ALMEIDA
- Porque vai proporcionar aumento de competitividade. Não vamos esquecer que a CPMF era um imposto cumulativo, o último dos impostos cumulativos que tínhamos. Trata-se de um imposto que incide em cascata. Ele se renova nas operações em cadeia, o que significa que nas cadeias produtivas mais amplas, como os setores automotivo, petroquímico e de bens de capital, o 0,38% da CPMF acabava se transformando em 2% a 3% sobre o preço final do produto.
Com o fim da CPMF, muitos setores industriais tendem a se beneficiar com reduções importantes de custos. Para muitos setores produtivos, especialmente as indústrias de maior valor agregado, o pacote é para ser comemorado.

FOLHA - E para as pessoas físicas?
GOMES DE ALMEIDA
- Para as pessoas físicas, os cálculos são que o fim da CPMF irá gerar cerca de R$ 10 bilhões de renda real disponível adicional. É dinheiro disponível em conta para as pessoas. Uma boa parte disso o governo vai captar com o aumento do IOF sobre o crédito, mas será uma parcela pequena.
Outro detalhe importante é que a CPMF era um imposto regressivo, que incidia mais sobre as pessoas de renda mais baixa. O fim da CPMF vai beneficiar as pessoas de renda mais baixa. Em outras palavras, vai beneficiar o consumo do país, mesmo com o aumento do IOF. O balanço também é positivo.

FOLHA - Quais as críticas que o sr. faria ao pacote?
GOMES DE ALMEIDA
- Todo mundo concorda que o Brasil precisa muito de investimentos em 2008, inclusive para afastar esse fantasma da inflação de demanda. Por isso, não faz sentido o governo taxar os empréstimos para investimentos do BNDES. O governo não pode tratar o problema só do ponto de vista tributário. O IOF que incide sobre o crédito para investimento do BNDES teria que ser retirado do processo, assim como o governo não introduziu o IOF sobre as operações de financiamento do crédito imobiliário, que é uma prioridade do governo.
Outro ponto importante foi que o governo não taxou a importação, mas taxou a exportação com o IOF. Não faz sentido punir a exportação e não punir a importação, principalmente porque o exportador já vem sofrendo há muito tempo o problema da valorização do real. Eu não defendo a taxação da importação, mas, sim, condições iguais para a exportação.
Um terceiro ponto, que seria mais ousado, é que o governo deveria ter aproveitado essa situação para tentar minimizar um pouco o problema da excessiva valorização do real, que chegou a quase 20% no ano passado, se tivesse criado um IOF maior sobre a entrada de recursos estrangeiros no país, incluindo o adiantamento de contrato de câmbio, os ACCs. Essas operações foram responsáveis pelo excesso de dólares no ano passado, num montante de US$ 87 bilhões.
Outra medida que também poderia ter sido adotada era eliminar a isenção do IR (Imposto de Renda) para as aplicações do exterior em títulos públicos, que também teria um efeito cambial importante, além de aumentar a arrecadação.


Texto Anterior: Frase
Próximo Texto: Frase
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.