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Brasil teme que conferência em
Cancún venha a ser um fracasso
DO COLUNISTA DA FOLHA
Para o governo brasileiro, a
"doença" da OMC é mais grave
do que dão a entender os técnicos
da organização e os funcionários
de outros países. "Agricultura é
central para essa rodada", afirma
o chanceler Celso Amorim, ao esboçar seu teorema sobre o impasse na negociação agrícola.
"A rodada foi inventada para
dar moldura para um avanço
mais ambicioso na área agrícola.
Sem ele, o nível de ambição cai
dramaticamente", diz o ministro.
Nota oficial do Itamaraty a respeito do prazo perdido na negociação agrícola é uma oitava acima do tom habitualmente suave
empregado pelos diplomatas brasileiros em negociações comerciais. Diz: "Uma vez que a negociação agrícola representa o elemento fundamental da rodada de
Doha, o não-cumprimento dos
prazos terá consequências negativas nas demais frentes negociadoras, o que coloca em dúvida as
próprias perspectivas de chegar-se a um acordo sobre o conjunto
de temas da rodada que faça sentido para os países em desenvolvimento".
Parece uma insinuação de que a
Conferência Ministerial de Cancún, marcada para setembro, caminha para um fracasso igual ao
ocorrido em 1999 em Seattle,
quando desacordos entre países-membros impediram o lançamento do que então se chamava
Rodada do Milênio (ficou para
Doha, dois anos depois e já não se
chamou "Milênio").
Amorim não acredita em nova
Seattle. "Seattle ocorreu em um
momento em que se tentava dar à
OMC o caráter de grande organismo da globalização. Cancún é só
uma negociação comercial nem
sequer conclusiva", diz.
É uma avaliação idêntica à que a
Folha obteve no gabinete de Panitchpakdi: "O desfecho em Cancún não é binário. Não estaremos
lançando ou concluindo uma rodada".
De todo modo, as expectativas
para Cancún se reduziram tanto
que o ministro brasileiro da Agricultura, Roberto Rodrigues, define a conferência marcada para o
balneário mexicano como "a crônica do empate anunciado".
"Vamos chegar a Cancún com o
marcador em 0 a 0 e sair de lá em 0
a 0", diz Rodrigues.
Previsão referendada por Gary
Hufbauer, o especialista do IIE
(Instituto para a Economia Internacional), em brincadeira com o
repórter da Folha: "Traga a animação do Carnaval brasileiro para Cancún. Será necessária".
A delegação norte-americana
leva outro tipo de animação se
não para Cancún para o conjunto
das negociações comerciais em
andamento.
A Folha perguntou, no gabinete
de Robert Zoellick, se havia um
"plano B" ante a estagnação das
negociações no âmbito da Organização Mundial do Comércio.
Resposta: "Esta administração
deixou claro, desde o início, que
defende a liberalização do comércio globalmente, regionalmente e
bilateralmente".
Permite a seguinte leitura: se a
reunião de Cancún não desbloquear as negociações na OMC (as
globais), os Estados Unidos poderão pôr mais ênfase na regional,
representada pela Alca (Área de
Livre Comércio das Américas),
que, no fundo, é uma negociação
entre os EUA e o Mercosul.
Se essa leitura é ou não correta,
só o tempo dirá. Mas o funcionário consultado pela Folha fez
questão de lembrar que "Miami é
logo depois de Cancún".
Miami será a sede em novembro da Conferência Ministerial da
Alca, instância máxima da negociação.
(CLÓVIS ROSSI)
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