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ANÁLISE
É melhor negociar que retaliar
RUBENS RICUPERO
COLUNISTA DA FOLHA
Fez bem o governo norte-americano em apresentar proposta séria para resolver o contencioso do algodão e fez melhor o Brasil em aceitar adiar a
retaliação. O ocorrido confirma
o acerto da posição brasileira:
preparar-se para ir às últimas
consequências com esperança
de que bastaria a ameaça para
romper a paralisia.
A oferta dos EUA é interessante porque dois de seus elementos -o fundo para ajudar a
competitividade do algodão
brasileiro e a limitação da mais
danosa modalidade de subsídios, as garantias dos créditos
de exportação- se referem diretamente à questão central
em disputa. No primeiro caso,
recompensam a Abrapa (Associação Brasileira dos Produtores de Algodão), que arcou com
os gastos do processo ganho pelo Brasil na OMC (Organização
Mundial do Comércio).
O terceiro componente é a
promessa de reconhecer Santa
Catarina como livre de aftosa
sem vacinação, o que possibilitaria a exportação de carne suína aos EUA. É uma primeira
brecha na muralha que até hoje
impede o Brasil de vender carnes ao mercado americano. Se
fizermos nossa parte na melhora sanitária dos rebanhos, pode
representar ampliação do acesso a outros países, sobretudo
asiáticos, sensíveis ao valor da
chancela americana.
A solução final pode demorar, pois a abolição total dos
subsídios ao algodão depende
da mudança da lei agrícola que
vigorará depois de 2012. Trata-se, porém, de indício animador
de que o governo Obama está
disposto a usar contra o protecionismo do Congresso o capital de influência que acaba de
ganhar com a aprovação da reforma da saúde. De qualquer
forma, é difícil imaginar que os
americanos voltem atrás nos
três elementos já prometidos.
Se o avanço se confirmar no
Congresso, todos sairão ganhando. Os EUA, em credibilidade para exigir dos parceiros
as concessões de que precisam
para dobrar as exportações em
cinco anos. O Brasil, por ver recompensada com ganhos concretos sua luta solitária para
pôr os subsídios agrícolas fora
da lei. Aliás, luta limpa, já que
jamais usamos retaliação ilegal
e unilateral como os americanos fizeram conosco em 1988/
89. A OMC, atolada no pântano
da Rodada Doha, cobrará ânimo novo devido à valorização
do seu sistema de solução de litígios.
Iniciado no governo anterior,
esse é um processo que demonstra a vantagem de uma diplomacia de continuidade, objetiva e pragmática, voltada à
solução séria de problemas
concretos, em contraste com
tantas iniciativas de fogo de artifício ideológico e protagonismo propagandístico que não levam a nada.
RUBENS RICUPERO , 73, diretor da Faculdade de
Economia da Faap e do Instituto Fernand Braudel de São Paulo, foi secretário-geral da Unctad
(Conferência das Nações Unidas sobre Comércio
e Desenvolvimento) e ministro da Fazenda (governo Itamar Franco).
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