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LUÍS NASSIF
A EBX é coisa nossa
O episódio Evo Morales está
servindo para abrir os olhos
do país para o que está ocorrendo
no campo ambiental na fronteira
Brasil-Bolívia. A EBX, de Eike Batista, foi acusada de desrespeitar
a legislação ambiental da Bolívia.
Articulou com o Estado de Santa
Cruz, com o município de Puerto
Quijarro e, quando lhe foi negada
a licença ambiental pelo governo
federal, houve uma quase rebelião na cidade, uma crise federativa grave. Por aqui, não foram
poucos os porta-vozes de um certo
nacionalismo apressado que pretenderam colocar a honra nacional em jogo nesse episódio.
Bom, agora Eike atravessou a
fronteira. Sua EBX está em Corumbá pleiteando uma licença
ambiental para se instalar no lado brasileiro. Ou seja, virou uma
questão interna do Brasil. E o que
está ocorrendo por lá exige no mínimo um holofote amplo da mídia.
Assim como na Bolívia, a empresa pretende utilizar carvão vegetal, madeira. O Estudo de Impacto Ambiental - Relatório de
Impacto Ambiental (EIA-Rima)
fala em consumo de 225 mil toneladas/ano de carvão vegetal. Mas
nem sequer menciona a origem
do carvão, se de florestas trabalhadas, se de madeira nativa. Não
apenas isso. Planeja-se um pólo
siderúrgico na região com mais
três empresas, a Vetorial Siderurgia (consumo previsto de 39.600
toneladas/ano de carvão vegetal),
a Sideruna (261.800 toneladas/ano) e uma terceira em Aquidauana.
A Promotoria Pública Estadual
convocou especialistas da Universidade Federal do Mato Grosso do
Sul e da Embrapa Pantanal para
opinar sobre o EIA-Rima da EBX.
Na quinta-feira passada, deveria
ocorrer uma audiência pública
em Corumbá. O que se viu foi um
amplo processo de intimidação
dos pesquisadores, uma arruaça
insuflada por políticos locais, semelhante à que ocorreu em Puerto Quijarro. Carros de som passaram a percorrer a cidade com slogans ameaçadores, desde "fora
ambientalistas!" até um "vamos
expulsá-los à bala!". E tinham o
logotipo da prefeitura.
Em seu parecer, a professora Sonia Hess havia chamado a atenção das autoridades ambientais:
"Se não houver exigências por
parte dos órgãos ambientais, para
que os empreendedores documentem claramente quais os fornecedores que serão contratados
para o fornecimento do carvão
vegetal e de onde os mesmos obterão a madeira necessária, a implantação dos empreendimentos
siderúrgicos previstos deverá colocar em risco os remanescentes
de vegetação nativa de MS, que,
literalmente, vão virar carvão e
cinzas".
A bióloga Débora Calheiros,
que trabalha há 15 anos em pesquisas no Pantanal, denunciou
em um artigo a campanha de intimidação contra os laudos. "Senti vergonha de, como cientista, estar passando por um processo de
verdadeira inquisição em conjunto com outros colegas, por simplesmente estar cumprindo com o
nosso papel na sociedade, que é
informá-la sobre o que estudamos, sobre a área da qual somos
especialistas: ambiente (...). Sinto
vergonha ao saber que um reitor
de universidade impede a livre
manifestação de seus professores,
a livre manifestação do saber
científico, que é a base filosófica e
ética de uma universidade. A que
ponto chegamos?!"
Seus amigos e colegas de profissão a aconselharam a não comparecer à audiência pública, ante
a possibilidade de sofrer agressões
físicas e morais. "Infelizmente,
devo admitir, estou com medo.
Não quero acabar como Chico
Mendes ou irmã Dorothy, nem
mesmo como Francelmo. O Brasil
e o Pantanal já tiveram seus mártires da causa ambiental e social e
eu não sou mártir, sou cientista."
Ambas se recusam a ser tratadas como "ambientalistas", no
sentido militante do termo. São
cientistas incumbidas de pareceres científicos. Denunciam não
apenas as pressões do reitor da
UFMS como a posição do senador
Delcídio Amaral e do governador
Zeca do PT.
Seja lá o que se pretenda, ambiente é questão nacional, seja na
Bolívia ou no Brasil. Os exageros
dos ambientalistas devem ser coibidos, mas há indícios mais que
suficientes de que o projeto EBX é
uma ameaça concreta ao Pantanal e ao ambiente. De questão diplomática entre Brasil-Bolívia,
tornou-se uma questão exclusivamente brasileira.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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