São Paulo, quarta-feira, 07 de maio de 2008

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Fundo soberano começa com até US$ 20 bi

Parte da verba será destinada ao BNDES para que o banco financie as operações de empresas brasileiras no exterior

Mantega diz que recursos virão em boa parte de "poupança fiscal" e fundo terá caráter "anticíclico" de contração do gasto público


VALDO CRUZ
SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

GUILHERME BARROS
COLUNISTA DA FOLHA

O fundo soberano brasileiro que deve ser lançado no final de junho pode contar com até US$ 20 bilhões em caixa e ter como uma das fontes de financiamento parte da arrecadação de tributos, "um fundo de poupança fiscal", disse à Folha o ministro da Fazenda, Guido Mantega.
Segundo ele, a prioridade do fundo soberano será apoiar vendas e investimentos de empresas brasileiras no exterior e, em segundo lugar, "ajudar a enxugar o excesso de dólar no mercado". Nos dois casos, o objetivo é conter a deterioração das contas externas, a maior preocupação do Ministério da Fazenda no momento.
Com lançamento previsto para o final do próximo mês, Mantega disse que o fundo será a princípio formado por algo equivalente a entre 5% e 10% das reservas internacionais. "Mas não virá das reservas atuais do Banco Central [US$ 196 bilhões], é além, e pode chegar a US$ 20 bilhões", disse o ministro.
Inicialmente, boa parte dos recursos será destinada a comprar debêntures do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social), para que a instituição tenha recursos destinados a financiar empresas brasileiras no exterior. "Seria um funding externo para o BNDES financiar operações brasileiras lá fora", afirmou Mantega.
O objetivo de transferir esses recursos para o BNDES, segundo Mantega, é aumentar as linhas de financiamento à exportação do banco. Atualmente, o BNDES financia cerca de US$ 4,5 bilhões a US$ 5 bilhões por ano para exportação. Com o fundo, esse montante vai se ampliar significativamente.

Eximbank nacional
Mantega afirmou que o BNDES teria um papel semelhante ao do Eximbank nos EUA, cuja principal missão é financiar os exportadores americanos. "O financiamento à exportação é fundamental e o BNDES pode fazer esse papel de Eximbank", disse Mantega.
Outra vantagem, segundo Mantega, é o fato de as aplicações em debêntures do BNDES renderem mais do que as feitas com o dinheiro da reserva cambial. O debênture do BNDES pode render 11% ao ano ou IPCA mais 6,2%, dependendo do tipo de aplicação escolhida. As aplicações da reserva rendem no máximo 4,5% ao ano.
Mantega disse que o "objetivo do fundo é utilizar melhor essa abundância de recursos externos e apoiar ações do país no exterior". Desde a obtenção do selo de "investment grade", o governo tem debatido o que fazer para evitar que o aumento da entrada de recursos estrangeiros no país valorize ainda mais o real e provoque déficit nas contas externas brasileiras.
Mantega disse que, ao ter como fonte de financiamento parcela da arrecadação de impostos, o fundo terá um "caráter anticíclico" -promove uma contração do gasto público em um momento de expansão.
Segundo ele, será uma "reserva de poupança fiscal, o fundo recebe parte de um tributo, não gasta e cria uma reserva" a ser aplicada em operações no exterior.
O ministro explicou ainda que o governo criará regras seguras para aplicação dos recursos do fundo soberano. "Vai ter um parâmetro de solidez, ou seja, ele não pode comprar títulos que não tenha avaliação elevada. Vamos estabelecer um padrão de qualidade. No caso do BNDES, é totalmente seguro, é o próprio governo que garante", afirmou.
Segundo o ministro, o fundo não poderá ser usado para bancar gastos correntes, mas apenas operações no exterior.
Não está nos planos do governo Lula, disse Mantega, usar o mecanismo para comprar empresas no exterior como estão fazendo outros países, como China. "Nosso governo não iria comprar empresas, mas poderemos comprar ativos no exterior."
O governo ainda não definiu se criará o fundo por meio de medida provisória ou um projeto de lei -nesse caso, seria por regime de urgência, para que seja aprovado no início do segundo semestre. A intenção de Mantega, no entanto, é encaminhar um projeto de lei para o Congresso. "O fundo será criado com a maior transparência possível", afirmou.
A idéia do fundo soberano foi muito criticada por economistas de diversas tendências. Mantega considera essas críticas injustas. "O fundo soberano é um desdobramento natural dos países que acumulam muita reserva", diz. Ele lembra, por exemplo, que países como China, Arábia Saudita, Rússia e Índia possuem um fundo soberano e ninguém os critica por causa disso. "Não vejo nenhum problema em o Brasil também criar o seu fundo soberano."


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