São Paulo, quarta-feira, 07 de maio de 2008

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análise

Finanças sólidas não bastam para o desenvolvimento

DO "FINANCIAL TIMES"

Para o Brasil, a classificação da dívida do país como grau de investimento, obtida na semana passada, foi, nas palavras do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, "um momento mágico". Os investidores parecem concordar. Os mercados brasileiros ganharam ainda mais força nos últimos dias. Mas, em meio à euforia, é necessário que todos mantenhamos a perspectiva.
Afinal, as agências de classificação de créditos como a Standard & Poor's simplesmente avaliam a capacidade de um devedor para pagar suas dívidas. E o grau de investimento torna os títulos de dívida de um país mais atraentes para os grandes fundos de pensão e as seguradoras. Não se trata de um distintivo de desenvolvimento.
Devemos admitir que a realização do Brasil impressiona. Seis anos atrás, o país era visto em quase todos os quadrantes como à beira da falência. A dívida interna, denominada em moeda local, continua alta. Mas a S&P acredita que isso seja mais do que compensado pela redução na dívida externa e pela firmeza da gestão econômica, sustentada pelo desenvolvimento de instituições mais confiáveis. Empresas privadas dinâmicas como o conglomerado de mineração Vale já estavam classificadas como papéis de investimento e ajudaram a transformar as perspectivas brasileiras. Em termos mais amplos, a promoção do Brasil marca uma tendência mais ampla entre os países de mercados emergentes que ainda são devedores.
Nos últimos 12 anos, a S&P elevou a classificação de 14 governos de países emergentes, da Polônia ao Cazaquistão, para o grau de investimento. O Brasil agora desfruta de status semelhante ao de Índia, Rússia e China, os três outros gigantes emergentes com os quais integra o chamado grupo dos Brics e cujo crescimento vem transformando a economia mundial.
Mas isso não justifica complacência no clube cada vez mais populoso dos países classificados com o grau de investimento. A classificação BBB- conferida ao Brasil (e à Índia) é a mais baixa entre os graus de investimento. Os critérios de classificação da agência sugerem que países devedores assim qualificados continuam vulneráveis a mudanças de curso causada por circunstâncias externas, como uma recessão mais profunda que a esperada nos Estados Unidos ou uma queda acentuada nos preços das commodities.
Além disso, classificações podem mudar. Diversos países -o mais recente dos quais foi o Uruguai, em 2002- conquistaram, o grau de investimento e depois o perderam. Acima de tudo, finanças sólidas são condição necessária mas não suficiente para um desenvolvimento econômico mais amplo. Países emergentes como China e Chile têm classificações bem mais altas que a brasileira e ainda assim não propiciam aos seus cidadãos padrão de vida semelhante ao que é visto como norma nas nações desenvolvidas.
O Brasil pode, como Lula disse na semana passada, alegar justificadamente que se tornou "um país sério". Mas isso não deveria ser visto como desculpa para complacência política. Como os demais Brics, o Brasil ainda tem muito trabalho difícil a executar antes de ingressar nas fileiras do Primeiro Mundo.


Tradução de PAULO MIGLIACCI


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