São Paulo, segunda-feira, 07 de julho de 2008

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Governo eleva renúncia fiscal em 44%

Benefícios concedidos para estimular a economia deverão passar de R$ 76 bi, quase o dobro dos investimentos públicos previstos

TCU aponta falta de controle dos recursos que deixam de entrar nos cofres da União; Planalto defende novas medidas de desoneração

MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Com um aumento de 44,21% em relação ao ano passado, o volume de impostos de que Receita Federal abrirá mão de arrecadar em 2008 deverá ultrapassar a marca de R$ 76 bilhões, quase o dobro dos investimentos públicos autorizados até dezembro. Segundo estimativa oficial, a cada R$ 100 cobrados pelo fisco neste ano, R$ 16,50 serão objeto de renúncia.
O dinheiro que deixa de entrar nos cofres públicos deveria, em grande parte, estimular o crescimento da economia e favorecer novos investimentos. Mas o TCU (Tribunal de Contas da União) insiste em que os benefícios fiscais, em alta acentuada desde o primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, são uma fonte de desperdício de dinheiro público porque falta controle sobre os seus resultados. Trata-se de um gasto público indireto, o chamado gasto tributário, cujos resultados são considerados nebulosos pelo tribunal.
O crescimento dos benefícios fiscais é defendido com ênfase pelo governo. Segundo o Ministério da Fazenda, novas medidas de desoneração tributária estão em estudo. As prioridades são a redução de encargos sobre o trabalho formal e a expansão da capacidade de produção das empresas.
A falta de controle, de que reclama o TCU, atinge até os benefícios fiscais concedidos com o selo do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). "Apesar de existirem 12 salas de situação [grupos de acompanhamento do programa], nenhuma delas fará monitoramento específico do impacto gerado pelas desonerações efetivadas em decorrência do PAC, em termos quantitativos, de benefícios sociais gerados, de avaliação de resultado ou mesmo em relação aos efeitos potenciais sobre o crescimento econômico", registrou o tribunal em auditoria recente.
De acordo com o relatório de contas da União de 2007, votado no final do mês passado, a renúncia fiscal do PAC no ano passado ultrapassou o volume de gastos orçamentários no programa. Foram cerca de R$ 6,4 bilhões de impostos que o governo deixou de arrecadar, contra R$ 4,9 bilhões de gastos em ações do programa com dinheiro dos tributos.
Ainda segundo o relatório aprovado pelo TCU, o volume de impostos de que o governo abriu mão de recolher cresceu ao menos 83,3% na década, alcançando em 2007 o equivalente a 2,3% do PIB. Isso sem considerar o novo salto previsto para este ano. No mesmo período (de 2000 a 2007), a carga tributária cresceu 25,1%.

Subestimado
O percentual de crescimento dos incentivos fiscais até 2007 ainda pode estar subestimado, alertou o TCU, que detectou erros nas estimativas de renúncia fiscal feitas nos três últimos anos, de 25%, em média.
Na contabilidade do tribunal, o universo das receitas de que o governo abre mão sem um controle eficaz dos resultados é bem maior. Em 2007, somando a renúncia de contribuições previdenciárias e os benefícios financeiros e creditícios, a renúncia de receitas federais alcançou R$ 92,3 bilhões. Isso representa mais de dez vezes os gastos do Bolsa Família.
Em decorrência de determinações do TCU de 2005, a Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda começou recentemente a aferir os resultados de parte dos gastos tributários. O primeiro relatório foi divulgado em fevereiro e trata dos benefícios concedidos pelos fundos constitucionais do Norte, do Nordeste e do Centro-Oeste nos três primeiros anos de governo Lula.
"Pode-se afirmar que nenhum dos fundos constitucionais de financiamento foi eficaz em aumentar a produtividade dos empreendimentos. Por sua vez, enquanto o FNO [Fundo Constitucional de Financiamento do Norte] e o FCO [para o Centro-Oeste] revelaram-se ineficazes em gerar empregos, o FNE [para o Nordeste, mais cidades de MG e ES] mostrou-se eficaz em aumentar o número de empregados das firmas tomadoras de empréstimos", concluiu a Fazenda.
A renúncia fiscal para o setor cultural é uma das que mais têm chamado a atenção de auditores do TCU, sobretudo pelo atraso na análise das prestações de contas. De acordo com o levantamento mais atualizado feito pelo tribunal, o Ministério da Cultura mantinha quase 4.000 processos pendentes de análise. Esses processos consumiram R$ 3,6 bilhões em benefícios fiscais.
A área cultural terá neste ano mais R$ 1 bilhão em incentivos, o que corresponde a pouco mais de 1% dos impostos de que a Receita deixará de recolher.
O setor mais beneficiado é o de micro e pequenas empresas, que consome quase metade do total das renúncias fiscais, ao lado dos incentivos concedidos na Zona Franca de Manaus e para entidades sem fins lucrativos. Entre as regiões do país, o Sudeste está na frente no volume de benefícios.


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