São Paulo, segunda-feira, 07 de julho de 2008

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Cresce o risco de novas panes na internet, afirma especialista

Rede de transmissão da web no país é uma caixa-preta, diz ex-superintendente da Anatel, que sugere aumento nos investimentos em infra-estrutura de transmissão

ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO

A capacidade da rede de transmissão de dados do Brasil, por onde trafegam a internet e a telefonia, é uma caixa-preta, e há riscos de novos blecautes no país, como o ocorrido, na semana passada, em São Paulo, afirma o ex-superintendente de Serviços Públicos e de Universalização da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), Edmundo Matarazzo, 53. O consultor diz que as empresas mantêm ""a sete chaves" os dados sobre a capacidade e o nível de utilização das redes. Para ele, o investimento na infra-estrutura de transmissão não acompanhou a demanda. De 1995 para cá, o número de telefones fixos passou de 13 milhões para 40 milhões; e o de celulares, de 1,4 milhão para 130 milhões. Já são 40 milhões os usuários de internet.

 

FOLHA - Por que o sr. defende a separação da infra-estrutura de transmissão da exploração dos serviços?
EDMUNDO MATARAZZO
- Por ser um insumo comum para telefonia fixa, celular e internet. Quando um meio de transmissão é atingido, o estrago na prestação de serviços é muito grande.

FOLHA - O senhor tem informação sobre os investimentos feitos pelas empresas na transmissão? Elas têm metas a cumprir nesta área?
MATARAZZO
- Têm a obrigação de manter a infra-estrutura para o serviço funcionar adequadamente, mas não há metas obrigatórias de investimento. Em caso de interrupção, a Anatel apura e, se houve negligência, a empresa será multada.

FOLHA - A capacidade de transmissão acompanhou a explosão dos serviços?
MATARAZZO
- Com certeza, não. Quando o modelo atual foi construído, o serviço telefônico fixo era a base de tudo. Fax e internet eram unicamente por acesso discado. A internet evoluiu, cresceu, mas o sistema de transmissão é o mesmo, embora o acesso em banda larga não passe pela central telefônica. Os contratos feitos na privatização da Telebrás [1998] obrigaram as concessionárias a implantarem sistemas digitais de transmissão nas capitais até 2005. Não foram criadas novas metas na renovação dos acordos de concessão. A autoridade deve se preocupar mais em regular os meios de transmissão, até porque os serviços mudam, mas a capacidade de transmissão é sempre essencial.

FOLHA - O apagão em São Paulo deve ser o início de uma discussão sobre a infra-estrutura de internet?
MATARAZZO
- É o momento para isso, porque o setor está envolvido na discussão do novo Plano Geral de Outorgas (PGO) e do Plano Geral de Atualização da Regulamentação das Telecomunicações no Brasil . O foco da discussão, porém, está na fusão de empresas [compra da BrT pela Oi], na entrada da terceira geração do celular e na banda larga nas escolas. Se fosse uma discussão sobre energia elétrica, com metas para aumento de consumo, alguém perguntaria sobre a fonte de energia e a linha de transmissão. Em telecomunicações, como não há fonte de energia, parece que a infra-estrutura virá do céu. Mas não é assim. O que vai difundir a internet não é a banda larga, mas a existência de meios de transmissão pelo Brasil afora. O desafio do país não é colocar um telefone público em lugarejos de até cem habitantes, mas levar o meio de transmissão até lá.

FOLHA - A infra-estrutura de transmissão é a soma das redes de várias empresas. Como o governo poderia, então, coordenar os investimentos?
MATARAZZO
- No modelo atual, não tem como. Quem faz telefonia fixa vai providenciar estrutura para o negócio dele, e o mesmo acontece na móvel. Para ter coordenação seria preciso integrar os competidores. Está claro para mim que a infra-estrutura de transmissão deveria ser explorada separadamente da prestação de serviços. Não se trata de separar toda a rede, só a que é usada por todos. A construção da infra-estrutura exige investimento antecipado, de amortização demorada, diferentemente do serviço, que é faturado no dia seguinte. Para haver confiabilidade na rede de transmissão, é preciso existir capacidade ociosa, o que conflita com o interesse de competição na prestação de serviços ao usuários. A linha de transmissão é o calcanhar-de-aquiles das comunicações e a capacidade de suportar falhas é muito baixa. A possibilidade de haver blecautes é crescente, pela velocidade de expansão da demanda.

FOLHA - O que o senhor sugere para evitar os blecautes?
MATARAZZO
- O meio tem de ser compartilhado. Não é possível construir redes de transmissão individuais para telefone fixo, celular e internet. Por isso, são necessários modelos de negócios diferentes para a exploração de serviços e para a infra-estrutura. O prestador de serviços tem de ter a garantia de que não lhe faltará infra-estrutura.

FOLHA - O senhor diria que os dados sobre a rede de transmissão são uma caixa-preta?
MATARAZZO
- Muito preta. Como consultor, tentei identificar e quantificar a rede de transmissão (capacidade instalada das fibras ópticas, nível de utilização, projeção de vida útil etc.) e não consegui. Os dados são trancados a sete chaves.

FOLHA - A Anatel tem acesso?
MATARAZZO
- Suponho que sim. Mas, na discussão do PGO, a Anatel não mexe no modelo de infra-estrutura de transmissão, o que seria prioritário.


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