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Mundo paga por ajuste do déficit dos EUA
Desvalorização do dólar dificulta as exportações de produtos industriais e diminui o valor das reservas internacionais
Europeus se queixam da alta de sua moeda em relação à norte-americana;
fatia dos EUA na exportação brasileira cai para 15,8%
CLÁUDIA TREVISAN
DA REPORTAGEM LOCAL
O mundo está pagando o custo do ajuste da economia dos
Estados Unidos por meio da
queda do dólar, que dificulta as
exportações industriais dos demais países e corrói o valor de
seus ativos denominados na
moeda norte-americana, como
as reservas internacionais.
No caso do Brasil, o recuo do
dólar é acentuado pela enxurrada de capital externo que entra no país na forma de superávit comercial, investimento estrangeiro direto e recursos financeiros em busca da polpuda
remuneração proporcionada
pela taxa de juros interna.
Natan Blanche, da consultoria Tendências, calcula que
2007 fechará com um fluxo de
US$ 84,6 bilhões, quase três vezes acima dos US$ 30,6 bilhões
registrados no ano passado.
Nos últimos seis meses, o dólar perdeu 10,85% de seu valor
em relação ao real. Se forem
considerados os últimos dois
anos, o percentual é de 23,1%.
Em três anos, sobe para 53,7%.
O efeito mais nocivo desse
movimento é o encarecimento
dos produtos brasileiros quando convertidos em dólar, o que
dificulta as exportações. Um
carro de R$ 30 mil que seria exportado a US$ 15 mil com um
dólar a R$ 2 sai por US$ 16,66
mil se a cotação cai a R$ 1,80.
Não por acaso, o percentual
das vendas aos EUA no total
das exportações brasileiras ficou em 15,8% nos primeiros oito meses do ano, comparado a
18% em igual período de 2006.
"Eu não me lembro de ter
visto um percentual tão baixo.
Historicamente, as exportações do Brasil para os Estados
Unidos representavam entre
19% e 24% do total", observa o
embaixador Rubens Ricupero,
ex-ministro da Fazenda e ex-secretário-geral da Unctad
(Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento). Os EUA são o
principal e o mais "nobre" mercado para as exportações brasileiras, com alta participação de
produtos manufaturados, como aviões, autopeças e aço.
A aceleração da queda do dólar nas últimas semanas também passou a preocupar os europeus, que temem o efeito do
movimento sobre suas exportações e, em conseqüência, seu
ritmo de crescimento. No dia
20 de setembro, o euro superou
a cotação de US$ 1,40 pela primeira vez desde seu lançamento, em 1999. Na sexta-feira, a
moeda fechou em US$ 1,414.
O assunto estará no centro da
reunião que ministros europeus realizam amanhã em preparação ao encontro das sete
nações mais industrializadas
do mundo, o G7, na próxima semana, em Washington.
A perda de valor do dólar é o
reflexo dos desequilíbrios da
economia dos Estados Unidos,
que registra um déficit recorde
de 8% do PIB em suas transações com o restante do mundo.
Isso significa que os norte-americanos precisam emprestar ou atrair quase US$ 1 trilhão
dos demais países para fechar
suas contas ao fim de um ano.
O caminho mais óbvio para
corrigir o desequilíbrio é a desvalorização da moeda, que torna os produtos de exportação
americanos mais baratos, e as
importações, mais caras. A lógica é que o movimento leve à redução do déficit comercial e
ajude a equilibrar as contas
com o restante do mundo.
A desvalorização do dólar foi
acentuada em setembro pela
decisão do Federal Reserve, o
Banco Central americano, de
cortar a taxa de juros em 0,5
ponto percentual, para 4,75%.
"Um dos atrativos para os investidores aplicarem em uma
moeda é a taxa de juros", ressaltou Paulo Gala, professor de
macroeconomia da FGV (Fundação Getulio Vargas).
Com o corte de setembro, a
taxa de juros nos Estados Unidos ficou apenas 0,75 ponto
percentual acima dos 4% da zona do euro. Em artigo publicado no "Financial Times" de
quinta-feira, David Woo, do
Barclays Capital, afirmou que
as transações dos últimos anos
indicam que os juros norte-americanos têm de estar no mínimo entre 1 e 1,5 ponto percentual acima da taxa européia
para que os investidores mantenham posições em dólares.
Diante das perspectivas negativas para a economia americana, Gala avalia que os juros
não subirão ou poderão até cair
mais, o que sustentaria a tendência de baixa do dólar.
Ricupero acredita que os
EUA manterão os juros baixos
para evitar uma recessão, o que
trará conseqüências negativas
aos demais países, com a queda
do dólar e a ameaça de inflação.
"Os americanos têm uma capacidade extraordinária de saírem de crises e fazer com que os
outros paguem por elas."
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