São Paulo, sexta-feira, 07 de novembro de 2008

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Após crise, G20 quer mais poderes

Reunião que começa hoje em São Paulo prepara temas para cúpula em Washington, em uma semana

Ministros e chefes de BCs tentam acertar agenda para reformar finanças globais; emergentes querem papel maior depois da crise

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

Pelo menos do ponto de vista do Brasil, a reunião do G20 que vai de hoje a domingo em São Paulo é a primeira iniciativa para consolidar o grupo como parte importante da nova governança financeira global que se supõe que nascerá da crise econômica em andamento.
Não é uma pretensão vazia: o fato de o presidente americano, George Walker Bush, ter convocado a primeira cúpula global para discutir a crise (realiza-se dia 15 em Washington) no formato G20 é uma indicação importante, ainda mais que, até aqui, o grupo só reunia seus ministros de Finanças e presidentes dos bancos centrais. A sua primeira cúpula será a de Wa- shington. O Brasil é o atual presidente do grupo.
Além do mais, o G20 tem composição geográfica e representatividade suficientes para juntar-se às diferentes instâncias formais e informais que gerenciam as finanças do planeta.
Dele fazem parte (veja quadro ao lado) desde os países do G7, geralmente considerados a diretoria do mundo, aos grandes emergentes, como Brasil, China, Índia, África do Sul, México, e até países menores mas regionalmente influentes, como a Argentina.
Mas não se trata de o G20 substituir as instâncias multilaterais. "Há um conjunto de instituições que já têm seis décadas. Não faz sentido descartá-las. O que se pode é reformá-las", diz, solicitando o anonimato, um dos principais negociadores do encontro de São Paulo.
Refere-se, como é óbvio, ao Fundo Monetário Internacional e ao Banco Mundial, criados em 1944, justamente para a gerência financeira do planeta, mas que, na crise deste ano, não foram protagonistas principais.
Convém acrescentar a OMC (Organização Mundial do Comércio), criada, com esse nome, bem mais recentemente.
A questão seguinte é saber que reforma do FMI se pretende fazer. Do ponto de vista do Brasil e dos países emergentes, trata-se de mudar o peso de cada país no Fundo, hoje uma instituição claramente controlada pelos Estados Unidos.
Já houve, em abril, um pequeno passo, pelo qual se transferiram dos ricos para os emergentes algo em torno de 2,5 pontos percentuais do poder de voto no Fundo. Nada, no entanto, que altere substancialmente a correlação de forças.
O problema é que mudar o peso de cada país no Fundo não basta para mudar o peso do próprio FMI na gestão de crises.
Tanto é assim que o diretor-gerente do Fundo, o francês Dominique Strauss-Khan, já avisou que leva à reunião de Washington "um plano de nova governança global", que gira em torno de cinco eixos: criar uma nova linha de crédito que "permita aliviar os problemas de liquidez de curto prazo"; aumentar os recursos do FMI; "extrair lições das políticas econômicas que levaram a estas bolhas repetidas"; supervisionar a implantação das novas regulações financeiras que elaboraram o FMI e o Fórum de Estabilidade Financeira, que agrupa os grandes bancos centrais; "e ajudar a redefinir um sistema mundial mais coerente".
O governo holandês dá até nome a esse eventual sistema: tratar-se-ia de transformar o FMI em uma "Organização de Estabilidade Financeira Global", diz seu primeiro-ministro, Jan Peter Balkenede.
Essa é, a rigor, também a agenda da reunião de São Paulo, embora não se espere que ela produza uma posição conjunta para ser levada aos chefes de Estado que, uma semana depois, se encontram em Wa shington.
Nem seria razoável esperar porque, como diz um dos organizadores, "ministros de Finanças e presidentes de bancos centrais estiveram, até agora, mais ocupados em atuar como bombeiros do que em pensar o futuro".
De fato, a crise é muito recente e a convocação da cúpula de Washington, também -foi decidida há três semanas.
De todo modo, todos os participantes das duas reuniões deixam claro que se trata de reformar instituições do capitalismo, mas não de pôr algo novo em seu lugar.
Claro que se fala muito em reforçar o papel do Estado, mas não como empresário nem mesmo como gerente das finanças. O que se pretende é que seja um regulador -papel que lhe é clássico- mais eficiente.
Primeiro, porque há um certo consenso de que a auto-regulação dos mercados mostrou-se no mínimo insuficiente. Segundo, porque as regras que pareciam suficientes, contidas por exemplo, nos chamados acordos de Basiléia 2, que prevêem mecanismos cautelares para evitar riscos sistêmicos no mundo financeiro, foram contornadas, como a crise mostrou. Contornadas seja por produtos novos e de alta complexidade, seja pelo que se batizou de "shadow financial system", um sistema financeiro paralelo, por isso mesmo fora do alcance da regulação.
É essa sombra que a reunião de São Paulo e, depois, a de Washington pretendem eliminar -para salvar o capitalismo, não para substituí-lo.


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