São Paulo, domingo, 08 de março de 2009

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ALBERT FISHLOW

Pagando o preço


Será que a população americana está preparada para pagar o preço de permitir expansão global sustentável?


SEIS MESES atrás, quase todo mundo acreditava que a desaceleração nos EUA viesse a afetar só os países desenvolvidos, e ainda assim só de modo marginal. Os países conhecidos como Brics (Brasil, Rússia, Índia e China) não só escapariam ilesos mas sua expansão continuada garantiria que qualquer recessão mundial viesse a ser curta.
Uma vez mais, a opinião dominante estava errada. Os resultados que vêm se acumulando quanto ao desempenho econômico de todos os países no trimestre final de 2008 e no início de 2009 destruíram essa expectativa. O declínio que vivemos é quase universal, e há revisões para menos praticamente todas as semanas. Ainda na semana passada, a União Europeia se reuniu em sessão especial em resposta aos súbitos problemas dos países do leste da Europa, alguns dos quais já estão sendo auxiliados pelo FMI.
Agora nós compreendemos. A crise é necessariamente internacional, devido às suas raízes financeiras. As finanças são a essência da globalização, quer se trate de bancos, fundos de pensão, seguradoras ou Bolsas.
Os bancos são especiais, porque eles criam dinheiro. Com seus empréstimos subitamente valendo cada vez menos, eles estão perdendo seu capital e se veem forçados a reduzir o crédito por um fator múltiplo. Todos os novos arranjos dos últimos anos, como obrigações caucionadas de dívida, veículos estruturados de investimento, "credit default swaps" etc., com os quais os bancos "sofisticados" obtinham lucros e pagavam imensas bonificações, complicaram imensamente o problema. Eles representam exemplos cristalinos de obscurecimento, em lugar de transparência. Os custos cada vez mais altos do resgate precisam ser pagos, agora.
As imensas intervenções dos BCs de muitos países ajudaram, mas não muito. As exportações e importações -o lado real da globalização- também caíram abruptamente. Um motivo para isso é a falta de financiamento suficiente, porque os sistemas bancários se contraíram. Os recursos públicos terão de cobrir essa disparidade, ou a queda continuará para além das atuais projeções.
O primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, visitou os EUA em busca de apoio a um New Deal internacional, que ele espera venha a emergir na conferência do G20, em Londres, no mês que vem. Barack Obama, para surpresa de ninguém, tem o compromisso de reforçar a regulamentação do setor financeiro e de promover a coordenação internacional mais ampla que será necessária. Com sorte, isso funcionará em curto prazo e bastará para evitar que o declínio mundial continue.
As reformas potenciais são substanciais. Entre elas, será necessário um FMI maior, capaz de conceder empréstimos imediatos e sem precondições; uma câmara de compensação centralizada para todos os "credit default swaps" e outros derivativos; e um mecanismo para evitar as potenciais consequências adversas da expansão fiscal e da expansão da dívida soberana simultâneas em muitos países desenvolvidos.
Mas não existe solução mundial para promover um índice de poupança mais alto nos EUA, no futuro, o que representa um fator igualmente necessário para prevenir futuras recaídas. Essa necessidade surge ao mesmo tempo em que as projeções indicam a necessidade de aumento substancial na arrecadação tributária federal, a fim de cumprir obrigações de previdência e de serviços de saúde expandido em uma sociedade que está envelhecendo. Esses requisitos nacionais são parte igualmente importante de um New Deal internacional duradouro.
Será que a população americana está preparada para pagar o preço?


Tradução de PAULO MIGLIACCI


ALBERT FISHLOW , 73, é professor emérito da Universidade Columbia e da Universidade Berkeley. Escreve quinzenalmente, aos domingos, nesta coluna.


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