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Americanos ficam US$ 16,5 tri mais pobres
Montante corresponde a 13 PIBs do Brasil e foi perdido principalmente com a queda das Bolsas e do valor dos imóveis
Com patrimônio reduzido, americanos compram cada vez menos e tentam poupar, alimentando círculo vicioso que derruba a economia
FERNANDO CANZIAN
DE NOVA YORK
Os norte-americanos estão
enfrentando um súbito processo de empobrecimento que já
destruiu cerca de US$ 16,5 trilhões da riqueza disponível entre as famílias nos últimos 15
meses. O valor equivale a mais
do que tudo o que os EUA produzem em um ano e a quase 13
PIBs do Brasil. Só de setembro
para cá, as famílias ficaram US$
9,5 trilhões mais pobres.
Os números são do IIF (Instituto de Finanças Internacionais), que reúne 380 grandes
bancos, e foram divulgados em
antecipação a dados semelhantes a serem publicados pelo Fed
(o banco central dos EUA) nos
próximos dias.
São duas, basicamente, as
principais fontes de poupança
dos norte-americanos: seus
imóveis e as aplicações que detêm, geralmente na Bolsa de
Valores. Mesmo o dinheiro para a educação dos filhos são
normalmente investidos em
fundos de ações, que concentram mais da metade da riqueza das famílias, estimada hoje
em US$ 61,4 trilhões.
Há ainda uma parcela menor
de aplicações em contas correntes remuneradas e em outros tipos de investimentos.
Embora os preços dos imóveis continuem a cair sem parar nos EUA há quase três anos,
a velocidade da queda diminuiu
nos últimos meses. O impacto
maior e direto da "destruição
da riqueza" das famílias está
concentrado na Bolsa, onde fica a poupança líquida que pode
ser sacada a qualquer hora.
De setembro de 2008 para cá,
houve uma perda líquida entre
as famílias de US$ 7,8 trilhões
nesses investimentos na Bolsa
(de US$ 33,6 trilhões para 25,8
trilhões). Como comparação, a
perda com imóveis é estimada
em US$ 1,8 trilhão no período.
Obviamente, a queda dos índices no mercado de ações é o
termômetro dessa perda. No
ano, o índice Dow Jones da Bolsa de Nova York despencou
cerca de 25%. Isso não significa
que não possa haver uma reação, e as famílias voltarem a ficar um pouco mais ricas.
O problema, porém, é que ao
terem sua poupança dizimada,
as famílias estão comprando
cada vez menos e tentando
poupar (o nível de poupança
em janeiro atingiu o maior patamar em 14 anos).
Essa combinação de fatores
só reforça mais o já vicioso círculo em que a economia norte-americana está metida: o crédito secou, os consumidores
compram menos, as empresas
demitem e cada vez mais as famílias evitam gastar.
Na sexta-feira, o Departamento do Trabalho dos EUA divulgou que mais 651 mil empregos foram cortados em fevereiro nos EUA, o que só reforça
o ciclo descrito acima.
"Não há nenhum sinal de fim
desse processo no horizonte.
Em março ainda teremos o
mesmo e não vejo nenhuma
melhora para abril", afirma Tig
Gilliam, executivo da Adecco,
empresa de recrutamento de
mão-de-obra para grandes
companhias, como o Wal-Mart.
O fenômeno de "destruição
da riqueza" não é só americano
(o índice FTSEurofirst 300, referência para as principais
ações na Europa, está no seu nível mais baixo em 12 anos), mas
em nenhum outro país há tanto
dinheiro de pessoas físicas investido em ações.
Além da perda nos valores
das ações, os dividendos pagos
pelos papéis aos investidores
está hoje no nível mais baixo
desde 1938, segundo cálculos
da agência Standard & Poor's.
Tamanha é a queda no mercado desde outubro de 2007
que cresceu dez vezes o número de ações negociadas abaixo
de US$ 1, levando a Bolsa de
Nova York a rever sua política
de retirar de negociações papéis abaixo desse valor.
Fantasma da Depressão
O empobrecimento das famílias, seu endividamento recorde e a necessidade de poupança
são tão grandes que redes de
varejo gigantes nos EUA, como
Kmart e Sears, já ressuscitam
modalidades de vendas que ficaram populares na Grande
Depressão dos anos 1930.
A principal é conhecida como
"layaway", uma espécie de consórcio que ajuda consumidores
indisciplinados a poupar antes
de adquirir o produto. O cliente
paga aos poucos pelo artigo e só
o leva para casa quando tiver
pago 100% do valor.
Já o Wal-Mart, maior rede de
varejo do mundo, iniciou estratégia agressiva para distribuir
cartões de débito entre os estimados 35 milhões de americanos sem contas bancárias.
Os cartões podem ser "carregados" com dinheiro nas lojas,
mas a empresa informa que
muitos consumidores que costumavam gastar cerca de US$
1.500 ao mês cortaram suas
despesas para US$ 800, valor
médio do seguro-desemprego
nos EUA.
Mesmo assim, o resultado do
varejo em fevereiro nos EUA só
não foi negativo porque a venda
cresceu 5,1% no Wal-Mart.
"Pouquíssimas redes têm
boas estratégias de vendas voltadas exclusivamente para as
classes mais pobres, mas quem
as serve direito é rei em um momento como o atual", diz Bernard Sosnick, analista da Gilford Securities.
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