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Jornal passa por transformação "histórica"
Ritmo de implementação de mudança aumentou, afirma estudo "O Estado da Mídia", divulgado nos Estados Unidos
Para um dos autores da pesquisa, "é como se a empresa de comunicação fosse um shopping, e o jornal, sua loja-âncora"
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
Em sua edição de 24 de agosto, a revista "The Economist"
se perguntava quem matou o
jornal. No livro "The Vanishing
Newspaper - Saving Journalism in The Information Age"
(O Jornal Evanescente - Salvando o Jornalismo na Era da
Informação, 2006), Philip Meyer chega a dar o ano do óbito: o
último exemplar em papel do
último jornal norte-americano
seria lido em algum momento
do primeiro trimestre de 2043.
A notícia da morte do jornal é
um exagero, para parafrasear o
que escreveu com humor Mark
Twain, pseudônimo de Samuel
Langhorne Clemens (1835-1910), depois de saber que um
repórter havia saído a campo
para descobrir se o autor tinha
morrido. Ao menos é o que se
conclui da leitura de três levantamentos recentes, o mais importante deles "O Estado da
Mídia" ("State of the News Media 2007"), recém-divulgado.
O relatório afirma que o modelo no qual as empresas de comunicação se firmaram nas últimas décadas nos EUA está
sendo revisto -e que o ritmo da
mudança se acelerou no ano
passado: "A transformação pela
qual o jornalismo passa é histórica, tão importante quanto a
invenção da televisão ou do telégrafo, talvez tanto quanto a
invenção do processo de impressão em si", afirma o estudo,
o mais amplo do tipo, feito
anualmente por entidade ligada à Universidade Columbia,
em Nova York.
Diz ainda que os jornais começam a se mexer mais rapidamente, embora não saibam ainda exatamente o caminho a seguir. Nesse sentido, ganham
importância iniciativas como a
integração de Redações das
versões em papel e on-line do
mesmo veículo, o uso maior dos
recursos multimídia, a disseminação dos blogs e até a utilização do chamado "jornalismo cidadão", em que o leitor contribui com notícias ou imagens.
Na área de conteúdo, são citados o que o texto chama de
"hiper-localismo" -cobertura
exaustiva da comunidade local-; a "valorização de marcas", ou seja, maior exposição
das "grifes" jornalísticas; e a
existência de público e lugar
tanto para artigos que aprofundem e organizem assuntos do
dia anterior como para textos
superficiais, curtos ou sobre celebridades. "É como se a empresa de comunicação fosse um
shopping center, e o jornal, sua
loja-âncora", escreve Tom Rosenstiel, um dos autores.
A amparar a tese da precocidade da morte anunciada, estão
os números. O estudo lista diversos índices negativos da indústria local -queda na circulação média de 2,8% de segunda a sábado nos seis meses terminados em setembro passado,
em comparação com mesmo
período de 2005; faturamento
sem crescimento num ano sem
recessão- e outros tantos positivos, para concluir: "Neste momento, achamos muito cedo
para concordar seja com os otimistas, seja com os alarmistas".
De qualquer maneira, o "Estado da Mídia" calcula que, por
dia, "cerca de 51 milhões de
pessoas ainda comprem" um
exemplar "e no total 124 milhões leiam um jornal", recorde
histórico. Esse número representa 41% da população norte-americana. Para efeito de comparação, há 110,4 milhões de lares com TV nos EUA, segundo o
instituto Nielsen, e 205 milhões de usuários da internet,
segundo o "World Factbook"
da CIA.
Circulação e publicidade
Os dados batem com levantamento mais amplo feito anualmente pela indústria mundial,
patrocinado pela World Association of Newspapers (WAN).
Segundo o estudo, a circulação
paga mundial dos jornais cresceu 6% nos últimos cinco anos,
e a publicidade, 11,7%. O aumento foi alavancado pela
América do Sul e pela Ásia,
principalmente Índia e China
-sete dos dez jornais pagos
mais lidos do mundo hoje estão
naquele continente (veja quadro nessa página).
Paradoxalmente, as notícias
sobre a imprensa publicadas
pela imprensa são mais negativas do que o próprio estado de
ânimo dos que as editam. É o
que concluiu o primeiro "Barômetro da Redação", realizado
pelo instituto de pesquisas
Zogby a pedido da agência de
notícias Reuters e do World
Editors Forum, ligado à WAN,
divulgado na última semana.
Dos 435 editores ouvidos no
mundo, 85% vêem com otimismo o futuro do jornalismo.
Previsões prematuras
Para John Zogby, embora a
circulação de 62% dos veículos
em que os pesquisados trabalham tenha estacionado ou caído nos últimos cinco anos,
"previsões da morte dos jornais
são tão prematuras quanto a
noção de que a televisão mataria o rádio". O motivo, disse ele
ao "Financial Times", é que
"editores de jornais vêem a internet e seus novos componentes jornalísticos como a próxima onda dos próprios negócios
e estão se preparando para ela,
em vez de lutar contra".
No Fórum Econômico de Davos, na Suíça, Arthur Sulzberger Jr. declarou que "não sabia"
se o "New York Times" ainda
terá uma versão impressa daqui a cinco anos. "Quer saber?",
completou o empresário norte-americano, "não importa." No
mesmo evento, Sergey Brin, bilionário fundador do Google,
diria que vê "bom futuro" para
os jornais: "Recebo o "NYT" aos
domingos e é legal".
Qualidade
Ambos elaborariam suas respostas. Para o editor do "Times", não importa o meio em
que as notícias produzidas por
sua equipe serão entregues,
desde que o jornal continue líder e zelando pela qualidade do
que faz. Já para o jovem do Vale
do Silício, para ser mais do que
"legais" os jornais devem se
concentrar em criar um conteúdo verdadeiramente único.
De alguma maneira, o momento atual de transformação
da indústria citado pelo relatório passa pela justaposição das
duas frases -e a interdependência de seus autores. Um dos
sites noticiosos mais freqüentados na internet nos EUA é
justamente o Google News, um
agregador de notícias que traz,
entre outros, o conteúdo do
"NYT". O primeiro não existiria sem o segundo, e o segundo
aproveita o primeiro para alavancar a sua audiência.
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